Vamos continuar a leitura de Além do Bem e do Mal (Nietzsche) e Arte de Lidar com As Mulheres (Schopenhauer).
Além do bem e do mal, ou prelúdio de uma filosofia do futuro.
Embora Nietzsche fale mal da religião a cada duas ou três páginas deste livro, ele admite que a religião tem poder formativo quando utilizada pelas pessoas certas. A religião tem caráter pedagógico. Um bom filósofo que usa a religião como ferramenta libertadora tá sendo um cara muito esperto. Na verdade, eu penso que seja essa a razão de marxismo ter sido tão pouco aceito no Ocidente. É que o marxismo se colocou contra a religião. Marx não fazia ideia de como um monte de coisa que ele diz em sua obra já fora dito na Bíblia Sagrada? O caso mais emblemático está nos Atos dos Apóstolos, onde a estrutura econômica da igreja de Jerusalém é exposta: todo o mundo vendia o que tinha, dava o dinheiro aos apóstolos, eles compravam os bens de que a comunidade precisava e administravam diretamente os bens segundo a necessidade de cada um, de forma que todos tinham tudo em comum e ninguém passava necessidade (Atos 2:44-45; Atos 4:34-35). Havia uma administração direta dos bens.
Embora tal administração fosse feita pelos apóstolos, eles próprios não se consideravam mais que meros homens. Isso coloca em questão até mesmo o quão nítida realmente era a divisão de classes na igreja primitiva. Se Marx tivesse usado o cristianismo inteligentemente, talvez o neoliberalismo nem existisse hoje. Os filósofos deveriam usar a religião pra enriquecer seu discurso, assim como usam suas condições históricas, econômicas e sociais. Especialmente no Brasil. Aqui, se você se põe contra a religião, você já perdeu. Assim, vemos que Nietzsche, por condenar a religião com argumentos do tipo “a religião não enobrece o homem”, pode tolerar a religião se ela não atrapalhar tal enobrecimento ou favorecê-lo.
Não é tanto a religião em si, mas o uso que se faz dela. Nietzsche cai mais encima do crisitianismo porque é a religião que é mais facilmente usada contra o enobrecimento do homem (por seu culto à humildade, por exemplo). Ele não fala muito de outras religiões, justamente porque elas têm tal característica em menor grau. Mas Nietzsche afirma que o que há de mais elevado no cristianismo, essa religião que ele odeia, é sua capacidade de ensinar o homem a tolerar o sofrimento inerente à vida. Isso é positivo. Bom, Nietzsche é justo, afinal. Ao menos ele reconhece que o cristianismo tem algo de positivo, quando usado da forma correta.
O problema que Nietzsche tem com o cristianismo é que este ensina a se acostumar com o sofrimento e vê-lo como uma condição superior de vida. Uma coisa é tolerar o sofrimento, outra coisa é você abrir mão de se superar. O cristianismo faz isso tornando os pobres e oprimidos em modelos de comportamento e demonizando todos os que têm vida melhor. Isso pode causar até mesmo um tipo de orgulho hipócrita, quando o cristão sente orgulho de sua miséria e passa a medir a própria miséria com a de um outro, como se fosse um tipo de competição. Mas orgulho também não é pecado? Se orgulhar da miséria a desqualifica como miséria. Você não pode dizer “olha como desprezo a mim mesmo” se você faz isso pra se mostrar, porque aí não é mais autodesprezo.
Se o cristianismo não fizesse isso, se ele ensinasse que o homem pode e deve se superar, Nietzsche talvez não reclamasse da nossa fé. Pra ele, a igreja pega o homem, o melhor ser da Terra, e o desfigura, em vez de torná-lo melhor. Isso seria razão de orgulho pra Deus, que fez o homem? Mas, novamente, isso depende de como a religião é usada. Lembre que, pra Nietzsche, a verdade precisa ser útil pra que seja aceita. Se realmente a Bíblia Sagrada fosse a verdade, pra quê tornar o cristianismo uma coisa mais penosa do que precisa ser? Uma verdade pesada é um convite à procura de mentiras leves.
A arte de lidar com as mulheres.
Pra Schopenhauer, a mulher é mais propensa a mentir e enganar (aos outros e a si mesma), tanto no amor como durante um julgamento, e também mais radical ao tentar conseguir o que deseja, tendências aumentadas com o aumento de sua influência na vida pública. Por essas e outras razões, Schopenhauer acredita que a dama, a mulher que recebe respeito pela simples razão de ser uma mulher, é um conceito absurdo e danoso. Eu não sei como era no século dezenove, mas eu penso que, hoje, em tempos nos quais a palavra da mulher vale muito, qualquer homem se sentiria tentado a acreditar que isso é uma possibilidade, não porque a mulher é inerentemente falsa, mas porque a lei a protege mais. É mais fácil pra uma mulher que comete crime contra um homem se safar.
Talvez por isso Schopenhauer diga que a inteligência atrapalha a pegação, porque mulheres preferem homens mais bobinhos, mais dispostos a obedecer e acreditar nelas. Tipo o Hifumi. Esse controle é facilitado pela cultura monogâmica, que está em declínio, pois a exigência de que você só pode amar uma mulher de cada vez o impede de usar o amor de mulheres melhores quando o amor de uma não satisfaz ou é condicionado, o que ajuda a mulher a manter o homem eleito sob controle. Lembrando que Schopenhauer era um filósofo misógino, que prefere que a mulher seja sempre tutelada pelo sexo masculino, então não se alarme ao ler que ele escreveu esse tipo de coisa. Em todo caso, ele diz com acerto que relacionamentos fracassados como esses certamente exerceriam efeito negativo na geração seguinte.
Recentemente, um professor de tiro foi acertado por seis disparos desferidos por sua parceira e há quem diga que não podemos ter certeza ainda sobre o quão culpada é essa mulher. Fosse o contrário, a cobertura do caso seria maior e ninguém duvidaria que a culpa é inteiramente do homem. Não acredito que a mulher é naturalmente propensa ao perjúrio, a mentir em julgamento sob juramento, mas uma pessoa ciente de que a lei está enviesada a beneficiá-la seria mais facilmente tentada a viciar a aplicação dessa lei. Não é tanto um problema da mulher, mas mais do sistema jurídico e da cultura de que todas as mulheres são dignas de respeito incondicional. Não seria melhor respeitar alguém, homem ou mulher, na medida de suas obras, não por pertencer a este ou aquele grupo?
Um comentário em “Leituras da semana #5.”