Pedra, Papel e Tesoura

3 de junho de 2020

Anonymous e Bolsonaro.

Recentemente, o Anonymous obteve dados pessoais de vários ministros, alguns deputados e do próprio presidente do Brasil, vazando-os no Pastebin. Os dados ficaram online apenas por pouco tempo, mas muitos conseguiram obtê-los antes de serem apagados. Agora, tem gente ameaçando a família da Sara Winter e pessoas depredando a casa do Weintraub. Até aqui, nada fora do comum. Mas, então, uma conta falsa (que eu não sabia que era falsa) afirmou que o Anonymous revelaria a ligação entre Bolsonaro e a morte de uma pessoa pública. Aquilo me fez pensar imediatamente em Teori Zavaski, mas aí eu lembrei que, à época, Bolsonaro era um desconhecido sem influênica. Então lembrei da Mariele Franco. Mas o próprio grupo Anonymous desmentiu a informação no dia seguinte, dizendo que não seriam eles a fazer essa ligação. Sua ação foi, portanto, limitada ao vazamento de dados, alguns dos quais podem ser encontrados fuçando edições antigas dos diários oficiais, que são públicos. Mas suponhamos que o Anonymous tivesse como provar uma ligação entre Bolsonaro e Mariele, o que poderia acontecer?
Meu sobrinho é fã do Anonymous e eu expliquei pra ele o que aconteceria se esse grupo resolvesse vazar algum tipo de prova irrefutável de que Bolsonaro está envolvido no caso Mariele Franco. Primeiramente, seria uma denúncia anônima que precisaria ser averiguada. Com Bolsonaro aparelhando a polícia federal, a apuração de uma denúncia dessas poderia sair lentamente ou nem sair. Segundo, se fosse realmente uma prova, seria uma prova obtida por vias ilegais. Nossa lei como está diz que provas obtidas ilegalmente são, muitas vezes, nulas.

Se Anonymous estivesse na posse de tal informação e tal informação fosse verídica, eles teriam feito sua parte vazando essa informação anonimamente, mas, a partir daí, o resto teria que ser feito pelo sistema jurídico deficiente no Brasil. Lembre que um escândalo que faria nações sérias ruborizarem resultaria em chefes de estado renunciando por lá, mas a gente esquece escândalos por aqui.
Não me entenda mal. Acredito que Bolsonaro há de cair, mas pelas razões certas e pelo processo devido. Barroso está no tribunal superior eleitoral agora e ele já falou que pautará os pedidos de cassação da chapa Bolsonaro/Mourão. Se a chapa for cassada, haverá novas eleições presidenciais, que poderão ocorrer concomitantemente às municipais.

Em seguida, há uns trinta pedidos de impeachment nas mãos do Maia, o qual só não os abre por medo de conflagração social. Tal conflagração poderá acabar acontecendo de qualquer forma, com os protestos pró-democracia voltando a acontecer, apesar do vírus. Melhor eu me preparar pra cursar pedagogia…
Anonymous opera através do discurso. Pra que haja efeito, o discurso precisa ser ouvido e o povo precisa agir de acordo. Infelizmente, no Brasil, isso é mais difícil. Se o Anonymous tivesse informações bombásticas de verdade, eles provavelmente ficariam decepcionados com o pequeno impacto que isso causaria no Brasil. Lembra da série de reportagens do Intercept que ficou conhecida como “vaza-jato”? Pois é, eu também tinha esquecido. E o Moro tá aí, incólume, voltando a ser endeusado.

Se eu pertencesse ao Anonymous, eu ficaria me perguntando se vale a pena tentar dialogar com um país no qual 30% de sua população continua com o presidente não importa o quê, mesmo com as acusações de crime de responsabilidade, acusações de interferir na polícia federal, acusações de tentar blindar os filhos… Pra essa gente, quem discorda do Messias está necessariamente errado. Não há diálogo com eles. Não havendo diálogo, não há discurso que surta efeito. Na possibilidade de a maioria protestar, a minoria vai avacalhar tudo e tentar, com violência, criar condições pro golpe militar.
O que podemos fazer então? Infelizmente, só protestar e esperar pra que a violência que poderia daí surgir simplesmente não surja. Mitigar os possíveis danos que manifestações poderiam causar à causa democrática, de forma que os protestos possam ocorrer sem que sejam contraproducentes, era isso que deveria ser feito.

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