“Ética” foi escrita por Espinoza. Abaixo, algumas anotações que fiz sobre o texto dele.
- “Causa de si” não significa que algo fez a si mesmo, mas algo que contém existência em seu conceito, isto é, algo que não podemos nunca dizer que não existe sem estarmos automaticamente errados.
- Um corpo não pode ser limitado por um pensamento e um pensamento não pode ser limitado por um corpo.
- “Atributo” é algo que eu percebo em uma essência numa substância.
- “Livre” é algo que não deriva sua existência de algo externo e não tem sua vontade condicionada por nada externo.
- Se sua existência é derivada de outra coisa ou se sua vontade é condicionada por coisas que lhe são externas (como leis da natureza), você não é livre.
- Se algo não pode, logicamente, ter sua existência derivada de algo externo, é causa de si (ver nota 1).
- Se uma causa age, há efeito, ao passo que não há efeito sem causa.
- Não é possível conhecer um efeito sem conhecer a causa.
- Um efeito carrega características de sua causa, o que significa que uma causa não pode gerar um efeito que nada tenha a ver com ela.
- Muitas vezes, explicar a natureza de algo não basta, se houver coisas relacionadas ao objeto que não são explicadas pela sua natureza.
- Deus existe.
- Potência é existência latente.
- A substância divina contém existência.
- Perfeição põe existência, enquanto que imperfeição a retira, então um ser sumamente perfeito deve existir.
- No campo conceitual, uma substância não pode ser dividida em decorrência de um atributo.
- Se uma substância infinita pudesse ser dividida, as substâncias resultantes não seriam infinitas (o que não pode ser) ou seriam infinitas (mas não pode haver mais que uma substância infinita), de forma que, pela lógica, uma substância infinita não pode ser dividida.
- Algo infinito não é resultado da soma de finitos.
- Se duas coisas infinitas pudessem existir, uma não seria maior que a outra.
- Uma substância não é o objeto corpóreo a que ela corresponde.
- Deus é a causa primeira de tudo o que seu intelecto poderia ter concebido.
- A vontade divina não pode ser coibida, de forma que ele é livre.
- Você não pode forçar Deus a agir.
- Dizer que Deus já criou tudo o que poderia criar, ou seja, que a criação está concluída, não é nenhuma blasfêmia.
- Se Deus criasse tudo o que é possível ser criado, continuaria sendo onipotente.
- O intelecto e a vontade divinos são diferentes do intelecto e da vontade humanos.
- O intelecto divino é criativo, enquanto que o humano é apreensivo.
- Eu criei meu filho como pessoa, mas não como essência (eu não criei a espécie humana).
- Se a substância de algo implica existência necessária, podemos dizer que tal substância é eterna.
- Um ser determinado por outro não pode se tornar indeterminado por si mesmo.
- Há diferença entre ser necessário (sempre existe), contingente (pode ou não existir) e impossível (nunca existe).
- Quando Deus age, ele não tem em vista o bem, como se o bem fosse algo fora dele ao qual Deus tivesse que se conformar.
- Deus existe, é único, determinado somente por si mesmo e única causa livre do universo.
- Se você pode saciar suas vontades e necessidades, isso não te torna livre, uma vez que você não pode escolher desejar ou necessitar de algo.
- Você não pode supor que tudo na natureza foi feito com uma função específica.
- A natureza não foi feita em função de você.
- A ideia de que os deuses castigam encontra apoio na crença de que nada na natureza é feito sem razão, de forma que doenças e catástrofes devem também ter uma função.
- Causa final é invenção humana e só existe na mente humana.
- Deus não pode ser controlado por sistemas de ação e recompensa, como se ele fosse fazer tudo o que você quer porque você vai pra igreja, por exemplo.
- Se as pessoas deixarem de ser ignorantes, deixarão de procurar padres e pastores.
- Pecado e mérito são dependentes da liberdade: se não fôssemos livres, nada seria nossa culpa e nada seria nosso mérito.
- Não confunda imaginação e intelecto.
- A natureza é amoral e deve ser julgada por si própria, não por nosso ponto de vista moral.
- Um sentimento ou emoção depende de uma ideia que cause aquele sentimento ou emoção.
- Implica dizer que só têm sentimentos os seres que têm mente.
- Deus é capaz de pensar.
- Humanos têm corpo e também mente e ambas as coisas são como as sentimos.
- A mente só sabe que o corpo existe porque este a afeta.
- Você é sua mente e seu corpo, não somente sua mente, com o corpo à disposição como uma ferramenta.
- O que não significa que a mente conhece totalmente o corpo.
- Entender o que seu corpo sente não implica que você conhece adequadamente seu corpo.
- A mente também não tem um conhecimento claro de si própria.
- Estar ignorante é diferente de estar errado.
- Se você ignorar as causas de sua determinação, se achará livre.
- Até ideias tidas por universais variam em cada pessoa, segundo a forma como essas pessoas comumente concebem tais ideias.
- Portanto, trabalhar com conceitos “universais” não será garantia de que você não irá errar em seu raciocínio.
- Se você duvida, não tem conhecimento seguro sobre o objeto da dúvida.
- Por outro lado, ter certeza não significa que você tem razão.
- Maior parte dos erros de raciocínio acontecem por causa de definições precárias (chamar as coisas pelo nome errado).
- Controvérsias ocorrem quando as pessoas não sabem se explicar… e porque também não sabem entender o que o outro está dizendo.
- Duas pessoas podem estar numa discussão feia pensando que estão discordando uma da outra, quando, na verdade, estão de acordo, mas utilizando palavras diferentes.
- Qualquer conteúdo mental pode ser tomado em sentido afirmativo ou negativo.
- Mesmo que admitamos que a vontade é maior que o intelecto, ela ainda é menor que a percepção (não posso querer o que não sei que existe).
- O conhecimento de Deus lhe trará a felicidade.
- A mente humana não deve servir somente como alvo de censuras.
- Emoções e sentimentos não são tão ruins como a filosofia clássica nos leva a crer.
- Nossos afetos e nossas ações não devem ser abominados.
- A natureza é sempre a mesma.
- Você não pode dizer que a natureza “cometeu um engano”.
- Um efeito pode ter mais de uma causa simultânea.
- Quando nossa mente é a única causa em ato sobre alguma coisa, estamos agindo, mas, quando nossa mente não é a única causa agindo sobre nós, então estamos sendo afetados.
- Essa afetação pode ser uma paixão.
- Há animais com mais habilidade física ou sensorial do que os seres humanos têm.
- Se a mente morre, também o corpo…
- Mas, se o corpo morre, também a mente!
- A habilidade de estudar um objeto depende dos sentidos.
- O corpo pode dobrar a força de vontade, que é um atributo mental.
- Logo, a mente não manda no corpo sem também ser mandada por ele.
- Fazemos coisas por impulso pensando que as fizemos de caso pensado.
- O fato de eu estar consciente de minhas ações não prova que sou livre.
- Você não pode esquecer de propósito.
- Não existem “prazos de validade” absolutos para seres, isto é, um ser não pode, por sua própria essência, estipular uma data de autodestruição.
- Não é possível afetar o corpo sem afetar a mente.
- Quando você sente alegria ao pensar ou estar na presença de um objeto, pode-se dizer que você tem amor por aquele objeto.
- Ódio é o contrário: a associação da tristeza (entendida como qualquer emoção que empobreça a capacidade de agir ou pensar) com um objeto específico.
- Quem ama, quer manter o amado em bom estado.
- Amor e ódio não são mutuamente excludentes.
- A perspectiva de amor ou de ódio são a origem de outros sentimentos como segurança, esperança, medo, decepção e outros que se relacionam com o passado ou futuro.
- Quando a pessoa ou objeto amado é afetado por alegria ou tristeza, também nós somos afetados pela mesma emoção.
- Quando amamos, fazemos um julgamento acima do justo da coisa amada, ao passo que fazemos um juízo abaixo do justo das coisas que odiamos.
- Quando você deixa os outros alegres, acaba ficando alegre também.
- Vergonha é a sensação de que você não está a altura de seus próprios padrões.
- Se alguém ama o que você ama, você passa a amar mais, mas, quando alguém odeia o que você ama, você tende a amar menos.
- É por isso que, quando amamos algo, nos esforçamos para que os outros também amem esse algo, mas, quando odiamos algo, queremos que todos também odeiem.
- Queremos que os outros vivam de acordo com nossas próprias inclinações, o que é uma manifestação de ambição.
- Mas isso não é verdade quando derivamos alegria de algo que não pode ser partilhado.
- Quando amamos algo semelhante a nós (como uma pessoa), queremos ser amados por esse algo.
- “Ciúme” deriva do amor que sentimos por alguém e da inveja que sentimos por outra pessoa que também ama quem amamos.
- Quanto mais amamos, mais sentimos ciúme quando a inveja se faz presente.
- O ciúme mata o amor antes sentido, de forma que passamos a odiar quem antes amávamos.
- Quando odiamos alguém que antes amávamos, a tendência é que o ataquemos mais do que o atacaríamos se nunca o tivéssemos amado.
- Se odiamos alguém, sentiremos vontade de fazer mal a esse alguém, a menos que tiremos um mal maior pra nós mesmos se fizermos mal a essa pessoa.
- “Bem” é um termo genérico para todos os tipos de alegria, enquanto que “mal” é um termo genérico para todos os tipos de tristeza.
- Como nossas fontes de alegria e de tristeza variam, bem e mal variam de pessoa para pessoa.
- Se alguém nos odeia sem razão, provavelmente atacaremos essa pessoa.
- No entanto, se alguém nos odeia e sabemos que seu ódio é justo, termos vergonha.
- Analogamente, se alguém nos ama sem razão aparente, provavelmente o amamos de volta.
- Quando fazemos o bem a quem nos fez bem, estamos sendo gratos.
- Crueldade é fazer o mal a quem te ama.
- Ódio recíproco gera mais ódio.
- Não há esperança sem medo, e vice-versa.
- Eu julgo os afetos dos outros segundo meus afetos (se alguém tem medo do que eu não tenho, o chamarei de medroso, por exemplo, mas, se ele não tem medo de algo que eu temo, o terei por corajoso).
- “Arrependimento” é derivar tristeza de algo que você fez.
- Quando você está com muito medo de alguma coisa, você se esquece de pensar em como evitar essa coisa.
- Existem emoções e sentimentos para os quais ainda não existe nome.
- Nossa impotência nos entristece.
- Só é possível sentir inveja pelas conquistas de semelhantes (ninguém inveja as conquistas de gente muito mais forte, inteligente ou rica, mas só daqueles que estão próximos, porque fica a sensação de “poderia ter sido eu”).
- Um pai pode treinar seu filho pra causar inveja aos outros.
- As três emoções fundamentais são a alegria, a tristeza e o desejo, com todas as outras emoções e sentimentos sendo derivados dessas três.
- A mente é posta em movimento pela alegria e pelo desejo, enquanto que a tristeza a retarda ou mesmo para.
- Desejo varia segundo disposição corporal.
- Desejo é nossa natureza tentando nos fazer agir de determinada forma.
- Se você tem certeza, não tem esperança, mas segurança.
- A menos que você tenha certeza de algo ruim; nesse caso, é desespero.
- Uma pessoa que se odeia logo pensará que todos o odeiam.
- Humildade pode muito bem ser uma forma passiva-agressiva de manifestar seguramente a inveja.
- Sentimos vergonha quando fazemos algo que outros poderiam desaprovar.
- É diferente de pudor, que é o medo de passar vergonha.
- “Saudade” é o desejo por alguma coisa, intensificado pela memória dessa coisa, mas refreado pela memória de que essa coisa provavelmente não existe mais.
- É possível desejar algo só porque todo o mundo deseja (emulação).
- Se você, por humildade, gostaria de evitar a glória, não assine seus trabalhos.
- Se você não pode controlar suas emoções e sentimentos, é escravo deles.
- Algo está “perfeito” quanto atende às expectativas do dono.
- Se o criador concluiu o trabalho, mas alguém diz que podia ser melhor, a obra ainda é perfeita, uma vez que atendeu às expectativas do criador.
- Por causa disso, não podemos dizer que o mundo é imperfeito, na medida em que não sabemos qual era a intenção de seu criador.
- Não podemos chamar de imperfeito algo que não fizemos, a menos que estejamos usando os critérios do criador da coisa que estamos julgando.
- Não se pode dizer que as coisas naturais são perfeitas ou imperfeitas sem estarmos na posse dos planos do criador.
- “Contingente” é algo que pode deixar de existir, enquanto que “possível” é algo que pode vir a existir.
- Existem coisas mais potentes que nós, as quais podem nos aniquilar.
- Somos parte da natureza.
- Uma pessoa nunca se suicida por sua própria natureza, mas é levada a isso por causas exteriores contra as quais se sente impotente.
- Auto-preservação está por trás de todas as virtudes, o que implica interesse próprio.
- Se dois objetos concordam por suas ausências, não estão realmente de acordo.
- Emoções são causa de discórdia.
- A razão é causa de concórdia.
- Somos movidos mais pela inveja do que pela razão.
- Uma vida solitária é dolorosa.
- É mais fácil obter o que queremos ao trabalharmos juntos.
- A coisa mais útil a um ser humano é outro ser humano.
- Animais têm sentimentos.
- O estado civil não é o estado natural.
- A existência de uma sociedade implica que seus integrantes abriram mão de seu direito de exercer sua própria justiça, confiando no sistema de justiça oferecido por aquela sociedade.
- As leis não são obedecidas por serem racionais, mas por causarem medo.
- Se alguém te diz que a tristeza é uma virtude, essa pessoa tem inveja da tua felicidade.
- Rir faz bem.
- Não retribua o mal com mal.
- Quem não faz bem aos outros, seja por razão ou por comiseração, não é humano.
- Humildade e arrependimento trazem mais benefício do que dano.
- Uma pessoa corajosa e idiota é um problema de segurança pública.
- Humildade predispõe à razão.
- Agir virtuosamente é agir racionalmente.
- Se você não se conhece, você não conhece a fundação da virtude.
- Se a virtude é um ato guiado pela razão e você não conhece a fundação de seus atos (você mesmo), então você não sabe nada sobre virtude.
- Uma pessoa incapaz de agir racionalmente se deixa levar pelo que dizem dela.
- Sentir-se sem valor e sentir-se superior aos outros são, ambos, demonstrações de ignorância.
- Agir dessa forma é agir com emoção, não racionalmente.
- É mais fácil ajudar alguém frágil do que alguém orgulhoso.
- O soberbo odeia a companhia de alguém que não lhe puxe o saco.
- Uma pessoa orgulhosa não quer ser lembrada de quem ela realmente é.
- Você também é orgulhoso se você pensa que os outros são inferiores a você, mesmo que você tenha uma ideia humanizada e correta de você mesmo.
- Se você é assim, você não mudará facilmente; na verdade, se você só busca a companhia de pessoas que concordam com você, a tendência é piorar.
- O desejo de um bem futuro pode ser mais facilmente refreado se a pessoa tiver um bom nível de satisfação presente.
- Ensinar a fazer o bem através do medo do mal tornará o aluno tão infeliz quanto o professor que lhe ensina tal coisa.
- É por isso que as pessoas odeiam profetas do apocalipse moderno.
- Se você fizer o bem, evitará o mal por consequência.
- Uma boa punição é motivada tão somente pelo desejo de fazer o bem ao público, não por ira, ódio, preconceito ou histeria.
- Se você está feliz, não pensará na morte.
- A sabedoria vem da meditação sobre a vida e não da meditação sobre a morte.
- O objetivo da educação deve ser “ensinar os estudantes a conduzir racionalmente suas vidas.”
- Uma pessoa sozinha não pode acabar com a pobreza.
- Boa alimentação é alimentação variada: um pouco de tudo, não muito de uma coisa só.
- Infelizmente, isso não é barato.
- Quanto mais você estuda uma emoção, menos ela te afeta.
- Se você fala contra a glória e a vaidade do mundo, provavelmente quer receber glória por dizer tal coisa.
- Falar contra algo que você gostaria de fazer revela impotência de ânimo para mudar as circunstâncias e obter o que você deseja.
- Compreenda suas emoções para controlá-las.
- O ódio é algo diferente da coisa odiada.
- Infância é um estado inferior, em termos de mente e de corpo, então não devemos coibir o passo de maturação de ninguém (menor infantilizado).
- Pelo contrário: temos que oferecer aos menores cada vez mais meios de maturação.
- Porque o caminho para a beatitude é difícil de encontrar e difícil de seguir, requerendo mente e corpo em bom estado.
[…] Emoções podem se combinar e criar outras mais fortes. […]
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Pingback por Anotações sobre o leviatã. | Analecto — 29 de novembro de 2018 @ 19:32
[…] existência de uma mente que ordene a evolução, do contrário não se pode falar que a evolução errou, como se a natureza visasse qualquer fim […]
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Pingback por Anotações sobre “A Evolução Criadora”, de Henri Bergson. | Analecto — 2 de julho de 2018 @ 14:39