- Se você se sente tentado, é porque está despendendo esforço para resistir.
- Boas intenções podem se colocar entre você e a virtude.
- Você está tranquilo quando não tem nenhum problema pra resolver no momento.
- Buscar a tranquilidade é buscar o sossego, no qual não há sofrimento, mas também não há fortes alegrias.
- É necessário desejar pouco.
- Se você tem muitos desejos, se frustrará com mais frequência.
- Você não obterá a felicidade sem antes ficar satisfeito consigo próprio.
- Aprenda a tolerar quando necessário.
- Seja útil a si mesmo e aos outros.
- O universo é sua pátria.
- É necessário equilibrar atividade e repouso.
- Mesmo quando mudos, podemos ensinar pelo exemplo.
- Trabalhe no que lhe dá prazer.
- Não se comprometa com o que não pode fazer.
- Os males causados pela riqueza são piores que todos os outros males.
- É melhor nunca ter sido rico do que perder sua fortuna.
- Se dinheiro fosse tão bom, Deus teria.
- As únicas dívidas que se deve ter são as dívidas para com nós mesmos.
- Não seja apaixonado por dinheiro, o que não implica não ter nenhum dinheiro.
- Não deveríamos comprar coisas pela sua aparência, mas pela sua utilidade.
- Coma quando tem fome, não por prazer.
- Não compre livros se não for lê-los.
- É imoral ostentar livros que não lemos.
- O que caracteriza o vício é o excesso.
- Acontecimentos ruins fazem parte da vida.
- Só se desespera quem quer.
- Evite as grandes ambições para evitar grandes decepções.
- O sábio não se inquieta em frente à sorte.
- Se você aceitar que vai morrer, pode aceitar qualquer coisa.
- É inútil se revoltar contra aquilo que não depende de nós.
- Seja pessimista, nunca espere que algo dará certo depois de tentar.
- Não se esqueça que o que acontece de ruim a alguém pode acontecer com você.
- Não tente fazer algo que não vale a pena ou que provavelmente não dará certo.
- Triste quando uma pessoa tem vontade de fazer alguma coisa, mas não sabe o que gostaria de fazer.
- Fofoca é vício.
- Não prometa.
- Tudo tem um lado bom.
- É possível encarar os problemas com bom humor.
- Quando uma desgraça acontecer, você não precisa reagir como os outros.
- Não é preciso se sentir mal por alguém que não sofre com o que lhe acontece.
- Omitir não é mentir.
- A solidão nos restaura as forças.
- Trabalhe, mas também divirta-se.
- Trabalhar demais prejudica a produtividade.
- Termine o que começou.
30 de maio de 2015
Anotações sobre “A Tranquilidade da Alma”.
25 de maio de 2015
Anotações sobre a “Carta a Meneceu”.
- Os jovens devem filosofar.
- Se estamos felizes, é como se tivéssemos tudo, mas, se estamos infelizes, fazemos de tudo para sermos felizes.
- A morte não é preferível à vida, mas, se bem e mal residem nas sensações, então a morte, se é ausência de sensação, não é algo tão ruim.
- Aceitar a morte como um sono igual aos sonos que temos cotidianamente permite a fruição plena da vida, porque não dá pra viver plenamente tendo medo da morte o tempo todo.
- A morte chega quando já “não estamos” e, quando estamos, é ela quem não está (normalmente perdemos a consciência antes do corpo parar de funcionar).
- Não é porque temos de aproveitar a vida que o faremos irresponsavelmente.
- O futuro é feito de probabilidade: sempre podemos, com nossas ações, maximizar nossas chances de que algo bom aconteça.
- Prazer e dor são os princípios motrizes da ação humana.
- Devemos perseguir os prazeres que compensam, isto é, aqueles cuja fruição não nos leva a uma dor maior que o prazer.
- Para devastar uma pessoa, permita que ela seja rica por um ano e então, subitamente, tire tudo dela.
- A comida mais sem graça é muito gostosa na boca de alguém mortalmente faminto.
- É necessário abdicar de buscar os maiores prazeres da vida, que são os mais frívolos, porque viver modestamente nos treina para não sucumbir aos cuidados com a riqueza e nos permite tolerar com mais dignidade a pobreza.
- Os prazeres naturais e necessários podem ser buscados sempre; os prazeres naturais, mas não necessários, só devem ser buscados se o benefício compensa o risco de arrependimento; os prazeres artificiais devem ser evitados.
- A prudência é a mais alta das virtudes.
- Não existe destino.
24 de maio de 2015
Agora, sim: consertei o problema do som.
Antes de ir direto ao ponto, meus pedidos de inclusão foram todos recusados novamente, porque o Orquídea Negra não conseguiu resolver meu problema à tempo. Na terça-feira, irei à coordenação do curso pra saber se ele conseguiu e, talvez, incluir as disciplinas (ou, pelo menos, tentar pela terceira vez…).
O problema de som que venho enfrentando parece estar com os dias contados, porque elaborei uma solução experimental. Existe um programa de linha de comando chamado Pacmd. Ele permite configurar um servidor de som Pulseaudio enquanto este executa. Em primeiro lugar, entendamos o problema.
As caixas de som estão ligadas, mas não sai som delas (Linux Mint Debian Edition, 64-bit, Cinnamon Edition). Se eu instalar o Controle de Som do Pulseaudio (pavucontrol), vejo que o som está sendo direcionado para os fones de ouvido. Mudar a configuração para saída de linha resolve o problema, mas isso deve ser feito à cada sessão, o que é muito chato. Como não disponho de meios para resolver o problema, preciso usar um meio temporário: um comando que deve ser usado automaticamente a cada início de sessão, que pode ser configurado pelo Aplicativos de Sessão.
Em segundo lugar, precisamos descobrir que comando é esse. Eu já li o manual pra você, então vou soprar a resposta. Execute o comando “pacmd list-sinks” num Terminal. Isso te dará uma lista de “pias” (sinks).
1 sink(s) available.
* index: 0
name: <alsa_output.pci-0000_00_1b.0.analog-stereo>
driver: <module-alsa-card.c>
flags: HARDWARE HW_MUTE_CTRL HW_VOLUME_CTRL DECIBEL_VOLUME LATENCY FLAT_VOLUME DYNAMIC_LATENCY
state: SUSPENDED
suspend cause: IDLE
priority: 9959
volume: front-left: 32770 / 50% / -18,06 dB, front-right: 32770 / 50% / -18,06 dB
balance 0,00
base volume: 65536 / 100% / 0,00 dB
volume steps: 65537
muted: no
current latency: 0,00 ms
max request: 0 KiB
max rewind: 0 KiB
monitor source: 0
sample spec: s16le 2ch 48000Hz
channel map: front-left,front-right
Estéreo
used by: 0
linked by: 0
configured latency: 0,00 ms; range is 0,50 .. 341,33 ms
card: 0 <alsa_card.pci-0000_00_1b.0>
module: 6
properties:
alsa.resolution_bits = “16”
device.api = “alsa”
device.class = “sound”
alsa.class = “generic”
alsa.subclass = “generic-mix”
alsa.name = “ALC888 Analog”
alsa.id = “ALC888 Analog”
alsa.subdevice = “0”
alsa.subdevice_name = “subdevice #0”
alsa.device = “0”
alsa.card = “0”
alsa.card_name = “HDA Intel”
alsa.long_card_name = “HDA Intel at 0xfeaf4000 irq 44”
alsa.driver_name = “snd_hda_intel”
device.bus_path = “pci-0000:00:1b.0”
sysfs.path = “/devices/pci0000:00/0000:00:1b.0/sound/card0”
device.bus = “pci”
device.vendor.id = “8086”
device.vendor.name = “Intel Corporation”
device.product.id = “3a3e”
device.product.name = “82801JI (ICH10 Family) HD Audio Controller”
device.form_factor = “internal”
device.string = “front:0”
device.buffering.buffer_size = “65536”
device.buffering.fragment_size = “32768”
device.access_mode = “mmap+timer”
device.profile.name = “analog-stereo”
device.profile.description = “Estéreo analógico”
device.description = “Áudio interno Estéreo analógico”
alsa.mixer_name = “Realtek ALC888”
alsa.components = “HDA:10ec0888,1b0a009f,00100001”
module-udev-detect.discovered = “1”
device.icon_name = “audio-card-pci”
ports:
analog-output-lineout: Saída de linha (priority 9900, latency offset 0 usec, available: no)
properties:
analog-output-headphones: Fones de ouvidos (priority 9000, latency offset 0 usec, available: no)
properties:
device.icon_name = “audio-headphones”
active port: <analog-output-lineout>
Anote o nome daquela que tem a porta referente às caixas de som (algo como analog-output-lineout), que deve estar lá pela última linha de pia. No meu caso, a pia é “alsa_output.pci-0000_00_1b.0.analog-stereo“.
Em terceiro lugar, precisamos testar a solução. Abra o Controle de Som do Pulseaudio e mude novamente o som para os fones de ouvido, se já não estiver, então execute o comando pacmd set-sink-port seguido do nome da pia e do nome da porta. No meu caso, o comando foi:
pacmd set-sink-port alsa_output.pci-0000_00_1b.0.analog-stereo analog-output-lineout
Depois, cheque o Controle de Som do Pulseaudio novamente para ver se o som mudou dos fones de ouvido para as caixas de som. Se tiver, é porque esse comando serve também para nosso propósito e, de posse dele, podemos criar um script de inicialização de sessão com ele.
Por último, abra o Aplicativos de Sessão e adicione uma nova entrada. Ponha um nome com significado e o comando que deu certo, depois um comentário. No meu caso ficou:
Nome: Configuração da Porta de Som
Comando: pacmd set-sink-port alsa_output.pci-0000_00_1b.0.analog-stereo analog-output-lineout
Comentário: Conserta a saída de som do Pulseaudio.
Startup Delay: 0
Isso não resolve a causa do problema, mas anula seus efeitos, porque o som será direcionado às caixas de som automaticamente à cada sessão.
O que aprendi da “Ética a Nicômaco”.
- Todas as ações visam um bem.
- O fim alcançado pelo estado é mais belo, por beneficiar aos súditos também.
- Mas a política não é ciência exata e a busca pelo bem da cidade é um estudo proximal.
- A política é ação, prática.
- Bem agir e bem viver coincidem com felicidade.
- Para a maioria das pessoas, vive bem e age bem quem procura e encontra o prazer, ou seja, para essas pessoas, felicidade é prazer.
- A busca pela honra é uma busca difícil, porque honra é algo que depende mais de quem reconhece o outro como honrado e não tanto de quem procura a honra.
- A vida virtuosa não necessariamente traz felicidade.
- O dinheiro é apenas útil e é perseguido em nome de um fim maior.
- Há várias ciências que tratam do bem.
- Os bens particulares não diferem muito do bem em si.
- Se não houvessem bens particulares, não haveria sentido em conceber o bem em si, já que ele não poderia explicar nada.
- As ciências tentam alcançar o bem, mas não são elas que explicam o que é o bem.
- Isso porque as ciências visam fins específicos.
- O bem de cada ciência é o fim que ela visa.
- O bem é aquilo que procuramos sem ser em vista de outra coisa, por isso dizem que o dinheiro não traz felicidade: o dinheiro é usado para obter outra coisa que talvez lhe traga felicidade.
- Aristóteles começa suas reflexões usando opiniões correntes porque, se uma das opiniões se mostrar verdadeira, ajudará bastante.
- Quem quer alcançar a felicidade pela virtude precisa praticá-la.
- A felicidade é um estado da alma alcançado por aqueles que se aproximam daquilo que amam.
- Como pode ser feliz mais facilmente aquele que dispõe dos meios, há quem diga que obter felicidade também é questão de sorte.
- A virtude é ensinável.
- Uma felicidade obtida com o próprio esforço é melhor que uma felicidade obtida com sorte.
- Se felicidade é um tipo de atividade, ninguém é feliz depois de morto.
- Porém, existem os que sustentam que não existe felicidade, mas “momentos felizes”, no sentido de que a felicidade não tem caráter estável porque a própria pessoa não o é.
- Mas a felicidade obtida pela virtude é estável, porque ações virtuosas tem resultados de longa duração.
- A pessoa feliz não é imune ao azar, mas a forma como ela lida com o azar faz sua felicidade permanecer ou não.
- A virtude permite lidar melhor com infortúnios.
- Se felicidade é ação, então a pessoa virtuosa será feliz se praticar o bem.
- A felicidade do virtuoso é estável porque não serão pequenos acidentes que o deixarão infeliz.
- A felicidade pessoal também depende da felicidade dos amigos e dos parentes.
- A virtude se ensina pelo hábito.
- Todas as virtudes, tal como as artes, são adquiridas pela prática.
- A forma como alguém age em determinada circunstância o faz bom ou mal em algo.
- A boa ação frente a algo é uma ação comedida, equilibrada: se você foge de tudo, é um covarde, mas se não foge de nada é um imprudente.
- Coisas nobres e vantajosas também se apresentam como agradáveis, prazerosas, enquanto que coisas vis e prejudiciais se apresentam como dolorosas.
- Não é possível ser bom sem prática.
- A teoria de que a virtude não é ensinável torna os filósofos adeptos conformados.
- Platão deixou a definição de virtude em aberto, mas diz que ela é fruto de uma feliz opinião que vem de algum lugar, mas Aristóteles diz que a virtude é uma de três coisas: disposição de caráter, faculdade mental ou paixão.
- Virtudes têm a ver com escolhas.
- A virtude é disposição de caráter, mas, para Aristóteles, disposições de caráter não são inatas.
- A virtude humana é aquilo que nos torna bons ou que nos permite fazer bem nossa função.
- A virtude visa o meio-termo.
- Porém, isso é numa situação em que a pessoa pode dar-se ao excesso, dar-se à falta ou escolher o meio-termo (não existiria a “virtude de não fumar cigarro” porque não existe meio-termo saudável nessa prática).
- Virtude não é o fim das emoções, mas a sua condução correta.
- Isso não é válido somente para as emoções, mas também à ações.
- Mas isso significa que ser virtuoso é difícil: acerto é um só, mas existem vários jeitos de errar a medida.
- Virtude aristotélica numa meia-concha: disposição de caráter relativa a escolha e que consiste na medida correta, que deve ser avaliada segundo cada caso e requer sabedoria prática.
- As proposições gerais precisam estar em harmonia com casos particulares.
- As pessoas que manifestam vícios julgam que os virtuosos são viciosos.
- A virtude é o meio-termo entre dois vícios, um por carência e o outro por excesso.
- Para achar a medida certa ou se aproximar dela, devemos ir na direção do extremo que parece ser o menos danoso.
- É menos digno de censura aquele que peca sem querer.
- Não é voluntária a ação cometida por ignorância ou por compulsão.
- Algumas ações voluntárias podem ser involuntárias dependendo do ponto de vista.
- Ações feitas por ignorância merecem perdão.
- Ação voluntária é aquela praticada pelo indivíduo, de sua vontade e não coagido por força maior, que está completamente ciente do que está fazendo.
- Não podemos culpar nossas emoções por algo que praticamos.
- Desejo e escolha são coisas diferentes.
- As escolhas não podem se basear em opiniões, mas em juízos sólidos de bom ou mau.
- Só que o juízo de bom ou mau varia de pessoa para pessoa.
- Mas pode-se dizer que escolha é a decisão com base em princípios racionais entre duas ou mais opções.
- Deliberações são feitas sobre coisas que estão ao nosso alcance e que podem ser realizadas.
- Não é possível deliberar sobre nossas funções ao mesmo tempo que exercemos essas funções: um cientista, durante suas pesquisas, não deveria parar para se perguntar se aquilo é o que ele deveria estar fazendo.
- Porém, durante o exercício da função, na qual os fins não são questionados, os melhores meios para alcançar o fim ainda são motivo de deliberação.
- Dá pra deliberar sobre nossos fins quando todos os meios de chegar a ele falham.
- Não se delibera sobre o que parece óbvio.
- Em geral, queremos o bem, mas cada pessoa, em particular, julga bom aquilo que lhe parece bom.
- Muitas condições ruins que nos levam a agir malignamente poderiam ser evitadas.
- O medo é a antecipação de algo ruim.
- Existem coisas que devemos temer.
- Existem coisas que só se devem temer em certas situações.
- Existem coisas que não devem ser temidas mais que o necessário.
- Existem coisas que não devemos temer.
- Alguns “corajosos” são movidos por medo de penas ou medo da vergonha.
- A coragem é aquela que não vem da coação.
- A paixão (emoção) auxilia a coragem.
- O bravo está ciente do perigo, mas o otimista supõe que não haja perigo ou que este seja irrisório.
- A coragem é mais evidente quando mais próxima do vício do medo, ficando entre a covardia e o excesso de confiança, mas é mais fácil reconhecer o corajoso em situações que inspiram medo e não nas que normalmente inspiram excesso de confiança.
- É mais fácil se abster do que é bom do que suportar o que é doloroso.
- Intemperança é “mais voluntária” que a covardia.
- O pródigo se arruína porque não julga seus bens com a devida medida, gastando em excesso e dando em excesso.
- Liberalidade é doar na medida certa, sem ser pródigo, nem avarento.
- Ninguém pode ser rico sem esforço, pois mesmo o que nasceu rico, se não se esforçar em manter a riqueza, ficará pobre.
- O pródigo ainda é mais útil que o avaro.
- A magnanimidade é a “coroa das virtudes”: ressalta as virtudes que já temos e não existe sem um conjunto de outras virtudes.
- Magnanimidade é ter para si o devido valor como pessoa.
- Aqueles que pecam pelo excesso de raiva, contra-atacam imediatamente, de forma que sua raiva não permanece por muito tempo.
- É possível também pecar por desejo de agradar.
- Enquanto a modéstia é recusar um elogio que vem, a falsa modéstia é negar as capacidades que possui.
- Há meio-termo também nas piadas.
- É possível conhecer algo pelo estudo de seu oposto: quando estudamos hábitos saudáveis, logo descobrimos que hábitos não são saudáveis, apesar de não tê-los como objeto de estudo inicial.
- O justo é honesto e obediente às leis.
- A justiça é escritora.
- A justiça é a virtude completa, na qual estão compreendidas todas as virtudes.
- O injusto lucra com atos vis.
- O trabalho do juiz é, pela pena, igualar perdas e ganhos entre ofensor e ofendido.
- Os pitagóricos definiam justiça como reciprocidade.
- A justiça deve levar em conta vários fatores para determinar perdas e ganhos.
- O dinheiro foi feito para facilitar a transação de objetos e de serviços.
- O que torna o dinheiro valioso somos nós; o dinheiro não tem valor intrínseco.
- O que faz os preços aumentarem ou diminuírem é a procura.
- O valor do dinheiro é inconstante, mas mais estável que o valor dos próprios objetos.
- Existem ações injustas e pessoas injustas. Roubar uma vez não te torna ladrão. Então, embora, ações injustas sejam injustas sempre, a pessoa que comete um ato injusto não necessariamente é injusta.
- Quando um governante passa a arrogar para si aquilo que ele não merece e, por isso, começa a agir injustamente, ele acaba se tornando um tirano.
- Existem leis naturais e existem leis humanas. As humanas são mutáveis, enquanto as naturais não mudam.
- O que torna o praticante de uma ação injusta uma pessoa injusta é a voluntariedade. Se a pessoa fez, de boa vontade, um ato injusto, ciente de sua injustiça, ela é injusta, por que fez, de propósito, o que sabia ser errado.
- Quando injusto acontece, mas vem de uma fonte externa, temos um infortúnio. Se algo injusto acontece e somos a causa disso, mas por ignorância, temos um engano. Se algo injusto acontece, sabemos que é injusto, mas não fizemos de propósito, temos um ato injusto que não torna o praticante uma pessoa injusta. Se algo injusto acontece, sabemos que é injusto, nós somos a causa e fizemos de propósito, temos um ato injusto que nos caracteriza como injustos.
- Pode alguém aceitar ser vítima de uma injustiça e sê-la voluntariamente?
- Não é possível sofrer injustiça voluntariamente, isto é, se colocar na posição paciente enquanto alguém pratica um dano contra você.
- É possível ser injusto consigo próprio.
- Existem coisas que são impassíveis de ser explicadas universalmente.
- Quando exceções à regra são descobertas, o indivíduo pode permitir-se ajustar a regra.
- Se a universalidade de uma lei é contestada, ela precisa de ajustes.
- Existem três guias da ação: sensação, razão e desejo.
- A origem da ação é a escolha, motivada pelo desejo e feita pela razão.
- Existem cinco manifestações da verdade: técnica, ciência, sabedoria prática, filosofia e razão intuitiva.
- Aristóteles já distinguia indução da dedução (silogismo).
- Os pressupostos usados no silogismo devem vir da indução.
- Os primeiros princípios são apreendidos primeiro pela razão intuitiva.
- A sabedoria é o conhecimento mais perfeito.
- Se o gênero humano não é a melhor coisa do mundo, qualquer ciência que trate das pessoas não é a melhor que existe.
- Sabedoria geral e sabedoria prática não necessariamente coincidem.
- A sabedoria filosófica trata das coisas mais gerais (do que é “certo”), enquanto que a sabedoria prática trata das coisas particulares (do que é “vantajoso”).
- A sabedoria filosófica é conhecimento científico combinado com razão intuitiva.
- A razão do filósofo não ser visto como alguém lá muito útil é simples: ele não busca o conhecimento dos seres humanos para os seres humanos se não acidentalmente, porque está preocupado com o conhecimento das coisas maiores.
- A sabedoria prática é preferível à sabedoria filosófica, porque auxilia na resolução dos problemas mais iminentes: não tem muito juízo quem se preocupa com coisas mais intelectuais sem ter resolvido questões como alimentação, trabalho e abrigo antes.
- A sabedoria prática não versa apenas sobre os universais.
- A deliberação boa não necessariamente produz o bem, porque se pode deliberar como obter um fim que é mau.
- A razão parece transformar predisposições à coragem, temperança e outras em virtudes de fato.
- As virtudes envolvem sabedoria prática.
- O exercício da sabedoria prática leva a pessoa a colecionar todas as virtudes.
- Existem três tipos de moral que devem ser evitadas: vício, incontinência e rudeza.
- O contrário do vício é a virtude e o da incontinência é a continência.
- Continência (refrear desejos presentes) não é o mesmo que temperança (não desejar o que é ruim).
- O conhecimento não necessariamente impede alguém de praticar o que é errado: podemos saber que é errado agredir alguém e ainda o fazer durante um acesso de ira.
- Pode haver excesso mesmo nas coisas boas.
- Porém, se praticamos o excesso de algo bom, somos incontinentes em relação àquilo e não incontinentes em sentido absoluto.
- Não se aplica o nome “incontinente” à pessoas que sofrem de algum mal congênito ou que estão sob condições mórbidas, porque o controle estaria completamente além de suas forças.
- A incontinência em relação à cólera é menos vergonhosa porque a cólera só se mostra quando nos reconhecemos como ofendidos.
- A incontinência em relação aos apetites é mais vergonhosa porque ela é espontânea: a cólera só acontece por um motivo externo, mas você não precisa de um motivo externo para querer comer um pudim fora de hora, não precisa nem mesmo estar com fome, bastaria lembrar de que é bom e o desejo viria.
- Além disso, a raiva é algo que acomete a todos, enquanto que o desejo por coisas como glória, fama, tipos específicos de comida não acomete a todos.
- A cólera é mais justificável por tentar sanar uma dor, enquanto outros excessos não visam sanar dor alguma, mas apenas obter mais prazer.
- A razão também é fonte de maldade.
- É necessário se arrepender para mudar.
- O intemperante não resiste às pulsões que a maioria resiste, enquanto que o incontinente cede à pulsões que a maioria não resistiria.
- O incontinente tem desejo ou tem desejo forte, mas não é capaz de dominar-se.
- O intemperante é pior, porque tem vontade fraca, então imagine se ele tivesse uma boa razão para ser ruim ou se ele estivesse sob um desejo que é humanamente extenuante, como no caso do incontinente: ele seria capaz de um mal maior do que o incontinente, que faz algo errado por ter desejos verdadeiramente fortes.
- O intemperante é “incurável”, porque prefere ouvir o corpo e não a razão.
- Mas só é incontinente aquele que cede ao que é vergonhoso.
- O intemperante prefere ouvir o corpo em lugar da razão, por isso faz o que faz.
- O incontinente sabe que deve ouvir a razão, mas não pode evitar transgredi-la.
- A contemplação é um prazer que não envolve apetite nem dor.
- O prazer não é processo, mas fim.
- Algo não é ruim só porque é buscado por tolos.
- Bondade não necessariamente traz felicidade.
- A amizade parece justificar a vida: não vale a pena viver sem amigos.
- Os ricos e poderosos são os que mais precisam de amigos, porque gastar só consigo mesmo não é o bastante.
- Os ricos também precisam de amigos porque é mais difícil defender sozinho uma grande riqueza.
- O ser humano não é o único capaz de sentir amizade.
- A amizade é produtiva porque multiplica a capacidade de ação e de pensamento.
- Amamos aquilo que nos parece bom.
- Os amigos amam-se um ao outro.
- Amizade é benevolência recíproca entre pessoas que conhecem os sentimentos um do outro.
- Existem pessoas que amam a outra pela sua utilidade prática: quando a pessoa cessa de ser útil, cessa o amor por ela.
- Existem pessoas que amam a outra pelo prazer que proporcionam, mas esse amor também não necessariamente é durável.
- A amizade verdadeira requer que a pessoa queira bem também ao outro, de forma que esta difere das outras formas de amor por não apenas tomar utilidade, mas também oferecê-la, tal como prazer.
- Esse tipo de amizade continua enquanto as duas partes forem boas e a bondade é algo durável.
- A amizade verdadeira é rara como as próprias pessoas boas e requer tempo para se estabelecer.
- A distância interrompe as atividades da amizade, mas não necessariamente a mata.
- Procuramos amigos agradáveis, mas não necessariamente o amigo agradável é bom (amizade falsa).
- É possível se deleitar em amar sem ser amado de volta.
- A amizade é pautada no amor.
- O amor platônico como desejo daquilo que não se tem é criticável: amar alguém porque ela tem uma qualidade que reconhecemos como boa e que nós não temos é um tipo de interesse.
- Diferentes comunidades parecem ter diferentes tipos de amizade.
- Três tipos de governo: monarquia, aristocracia, a moda de Esparta.
- Os tipos de governo podem ser encontrados na família: os irmãos são democráticos entre si, mas submissos ao mando do pai, que forma uma aristocracia com a mãe.
- Num sistema de governo, a amizade é possível quando há justiça.
- É possível ser amigo de um escravo enquanto ele não está sendo mandado.
- Casais com filhos não se divorciam facilmente.
- A amizade pautada na utilidade é a que comporta mais queixas.
- A amizade não é um comércio.
- Quando não podemos saldar uma dívida com um amigo, é nobre que demos o nosso melhor em saldar o que pudermos.
- A proporção preserva a amizade.
- Permitir que o consumidor escolha o preço da mercadoria evita queixas.
- O comprador julga algo segundo o valor que ele pensa que aquela coisa tem, não seu valor depois de comprada.
- Só é possível amar o que se afigura bom.
- Não é possível amar o que se afigura mau.
- Quando nosso amigo se torna mau, não deveríamos romper com ele imediatamente, mas tentar trazê-lo à bondade novamente.
- Antigos amigos ainda podem ser tratados com mais respeito que os desconhecidos.
- Quem não ama a si mesmo, julga não ter nada de amável em si.
- O início da amizade da mais elevada espécie é a benevolência.
- O benévolo ama fazer bem aos outros, como se os outros fossem suas “obras”.
- Existem duas formas de amor a si mesmo: o amor que procura dar-se prazer e o amor que procurar se aperfeiçoar.
- Se a felicidade é atividade, mesmo o que se basta, o sumamente feliz, precisa de amigos aos quais fazer bem, para manter a felicidade.
- Perceber que estamos vivos é “perceber que percebemos” ou que pensamos.
- Amizade é condição de possibilidade da felicidade: não é possível ser feliz sozinho.
- “Medida certa” não precisa ser algo fixo, mas algo que fique entre duas coisas fixas.
- Não devemos ter um grande número de amigos, porque isso prejudica a intimidade.
- A educação dos jovens era feita com os “lemes” do prazer e da dor.
- O prazer é um bem em si mesmo.
- Prazeres que os são para pessoas ruins não são prazeres para pessoas boas.
- O prazer depende da pessoa.
- Como não podemos nos dedicar continuamente, com a mesma intensidade, a uma atividade, não podemos estar sempre contentes.
- Parece que existem diferentes tipos de prazer que atraem de forma diferente diferentes tipos de pessoa.
- Gostar daquilo que fazes te torna produtivo naquilo.
- Quando tentamos prestar atenção em duas coisas, a que é mais prazerosa toma mais atenção.
- Se a felicidade não fosse atividade, bastaria estar deitado para ser feliz.
- Felicidade é fim em si mesma: ninguém se pergunta “por que quero ser feliz?”
- A função da recreação e do divertimento era nos refrescar antes de voltarmos à labuta.
- A vida conforme a razão é a mais feliz.
- Os atos virtuosos parecem depender de oportunidades para acontecer.
- Não é necessário ter muitos bens para ser feliz.
- É a prática que faz a profissão, nunca somente o estudo.
20 de maio de 2015
Como consertei o som do LMDE.
SoFurry – The furry creativity home.
Depois de atualizar o LMDE1 para o LMDE2, comecei a experimentar um problema muito irritante: o som das minhas caixas de som havia desaparecido. Procurando soluções online, vi que eu podia redirecionar o som para as caixas de som utilizando o pavucontrol. O pavucontrol (Controle de Volume do Pulseaudio) denuciou que, depois da atualização, o som estava sendo enviado para os fones de ouvido, os quais não existiam, logo não havia som. Redirecionei o som usando o pavucontrol e tudo deu certo…
Até que eu tive que encerrar a sessão e voltar, apenas para ver que o problema estava ali novamente. Procurei soluções por dois dias, mas sem sucesso. Então eu tive que raciocinar. Em algum momento, eu quebrei o som completamente, de forma que nem o pavucontrol resolvia. Então entrei em outra conta e verifiquei se o problema acontecia lá também. Não acontecia. Então, o problema era relativo à minha conta, o que é uma pista e tanto! Isso significa que o problema residia em algum arquivo de configuração no meu diretório pessoal.
Existe um diretório oculto na pasta pessoal chamado .config, onde ficam os arquivos de configuração, inclusive, do Pulseaudio. Por alguma razão, esses arquivos de configuração estavam sendo reescritos a cada início de sessão. Eu já tive um problema parecido. Seguinte:
- Vá ao diretório pessoal.
- Aperte Ctrl+H, isso mostrará os diretórios e arquivos ocultos.
- Entre em .config.
- Apague o diretório pulse dentro de .config.
- Encerre sua sessão.
- Entre novamente.
- Chame o Controle de Volume do Pulseaudio.
- Direcione o som para as caixas de som. Isso irá criar um arquivo de configuração correto no diretório de configuração, mas ainda precisamos impedir que ele seja reescrito.
- Volte para ~.config/pulse.
- Altere as permissões de todos os arquivos lá dentro, de forma que apenas o proprietário tenha permissões de escrita sobre eles (isso é feito pelas propriedades do arquivo, acessíveis pelo menu de contexto).
- Volte para ~.config.
- Mude as permissões do diretório pulse, para que ele também fique somente leitura.
- Mude as permissões do pavucontrol.ini, um arquivo também naquele diretório, para somente leitura.
- Encerre sua sessão.
18 de maio de 2015
Poxa, que bom que isto aconteceu.
apt dist-upgrade
Eu estava aqui me lamentando porque não havia saído a atualização do Linux Mint Debian Edition para a versão dois e, quando fui checar na Internet, vi que a atualização havia sido lançada ontem. E vi isso nas primeiras horas do dia (literalmente na primeira hora). Estou fazendo a atualização neste instante. De repente, meu sono se foi.
Como se não bastasse esse ser talvez o meu penúltimo semestre na faculdade, meu amigo de infância ter se mudado para perto de mim, eu ter levado meu PC para manutenção e tê-lo recebido novo em folha, ainda recebo a maravilhosa notícia de que meu sistema operacional já é elegível para uma tremenda atualização. Que excitante! Vejamos se é bom como nos filmes.
O que se pode esperar é que o Linux Mint Debian Edition agora seja baseado em Debian Stable, mas com as atualizações de componentes-chave ocorrendo constantemente. Isso significa que nós, usuários de Debian Edition, somos como que porquinhos da Índia ou cobaias. Certos aplicativos serão nos dado ainda em fase de testes e isso me deixa alegre; usar a versão mais recente de programas como o Cinnamon, mas sem abdicar da estabilidade de programas do repositório do Debian Stable me equilibra entre o novo e incerto e o velho, mas seguro. Quando Debian Stable for atualizado, eu receberei a atualização imediatamente também e eu gosto de ter a versão estável mais recente. Me anima que essas atualizações possam vir automaticamente sem que eu tenha que escolher (porque minha escolha sempre é sim e eu não podia automatizar essas escolhas).
15 de maio de 2015
Mészáros: educação contra o capital.
Philosophy – Wikipedia, the free encyclopedia.
Atenção, professoras de filosofia da educação, este trabalho foi escrito por Yure! Se você ver este trabalho em meio aos trabalhos de seus alunos, assinado por Yure, somos a mesma pessoa!
Este é um resumo de uma parte do primeiro capítulo do livro A Educação para Além do Capital, de István Mészáros.
Senhor Mészáros começa apresentando alguns pedaços interessantes do pensamento de Paracelso, Martí e Marx.
Segundo Paracelso, a educação não tem limites cronológicos se não a vida do corpo. Enquanto estamos vivos, aprendemos. A cada instante, aprendemos algo novo e esse aprendizado se encerra na morte. Já para Martí, é quase isso, exceto que a educação mediada pela escola, tendo em vista determinados fins, é condicionada e isso se põe como obstáculo ao aprendizado genuíno. Pela autoridade da escola, acabamos por aceitar como corretas coisas que não são verdade, mas meras convenções. Ou seja, para Martí, a pessoa não aprende o tempo todo, pois não necessariamente aprende na escola à qual tem que ir. Marx não está tão interessado sobre quando o ser humano aprende, e sim como aprende. Segundo ele, a educação escolar é um condicionamento: o educador é educado e essa educação é passada a futuros alunos. A menos que o professor seja um livre pensador, suas aulas são reprodução do pensamento já existente. Mas, mesmo que ele seja um livre pensador, as escolas têm seus objetivos e o professor acaba se vendo obrigado a condicionar suas aulas segundo os objetivos da escola, que, como uma entidade inserida na sociedade, herda esses objetivos dessa realidade maior que é a sociedade capitalista ocidental (o contexto de Marx).
Os pensamentos desses três indivíduos convergem sobre a necessidade de uma mudança no nosso sistema educacional. Segundo Mészáros, a escola tem um papel de mudança, mas esse papel é desempenhado de forma incompleta: a escola capitalista tem um comportamento estranho de tampar buracos na lógica do capital, sem dar espaço ao pensamento que poderia substituir o capital. Isto é, a educação ganha uma aparência de ambiente produtor de mudanças, mas, na verdade, é um ambiente de manutenção, sendo assim uma instituição conservadora. Claro que o capitalismo tem projetos educacionais atraentes, mas são projetos que concordam com a realidade capitalista, no sentido de que amenizam efeitos negativos oriundos da sua lógica e não suas causas, permitindo o aparecimento de novos efeitos.1 Esses projetos falham porque visam consertar o capitalismo, sendo que o capitalismo não tem conserto.
O capitalismo leva às últimas consequências um fenômeno chamado divisão do trabalho.2 Porém, pensadores como Adam Smith, não são capazes de ver que a causa da divisão é justamente o sistema capitalista, que dá a cada um sua determinada função. Por exemplo: o indivíduo que formou-se sapateiro e artesão tem uma visão de mundo naturalmente mais ampla do que a do outro que formou-se somente sapateiro. Ora, mas o indivíduo que é apenas sapateiro desempenha melhor essa função e tem melhores chances no mercado em que está inserido. O domínio de várias perícias não é apenas desencorajado, mas impraticável, se o que você quer é ganhar dinheiro.3 As pessoas são, assim, transformadas em objetos.
Esse é um problema que não pode ser resolvido meramente com a razão, a menos que a razão trabalhe contra o capitalismo e não contra este ou aquele efeito de seus processos dementes. Mas a pregação da razão como solução dos problemas da sociedade é uma manifestação de má-fé. Não basta admitir que o problema é “nosso” ou de determinado pensador, é necessário também apontar as causas desses erros. Se elas estão na educação, então temos que mudar a educação, mas não podemos sem mudar a sociedade, que sofre justamente com má educação. Cai-se, então, num círculo vicioso. Então, a possibilidade de uma razão libertária acaba tornando-se utópica. Além disso, pensadores como Robert Owen acabam por propor uma mudança através de um ajuste a favor dos trabalhadores, o que é suspeito, porque, se por um lado a classe trabalhadora não deveria ser tão explorada, ele teme que os trabalhadores tenham liberdade demais, já que Owen é membro da classe dominante. Além do mais, foram postuladas reformas graduais, as quais tiveram sua validade desmentida pela história. A mudança precisa acontecer de uma vez.
A escola, a possível salvadora da humanidade, serviu à sociedade como meio de adestramento de crianças, que se tornarão futuros capitalistas, com os objetivos e valores do capital integralizados, justificados. Assim, a educação contra o capital requer uma quebra com esses valores que são integralizados nos alunos. Mas vale lembrar que a educação não acontece apenas na escola. A aprendizagem é nossa própria vida. Maior parte da aprendizagem então se dá fora da escola e aí se vê uma brecha para atacar a educação que os alunos recebem e que os perverte. Esse ataque não é simplesmente uma negação do que está sendo ensinado, contudo, mas o estímulo ao trabalho por uma sociedade alternativa.
Para Mészáros, Marx e Martí, a escola atual é uma lavagem cerebral na qual são incutidos nos alunos valores que justificam o capital, como, por exemplo, a de que pobres o são porque não querem trabalhar e que deveriam haver leis que limitem o tempo livre desses vagabundos, obrigando os meninos a ir para escolas profissionalizantes e mandando os pais a trabalhos forçados, nos quais ganhavam “um centavo por dia”, como diz Locke.
1Por exemplo, a crise ambiental. Muito se fala de atitudes sustentáveis, mas essas são medidas de contenção de efeitos e não de eliminação de causas. Não precisaríamos ter de adotar, cada um, essas atitudes se a necessidade de matéria-prima e de lucro não fosse tão desenfreada. Mas ninguém fala dessas coisas, se não de forma banal. O que não quer dizer que não tenhamos que ser “sustentáveis”, já que agora isso se tornou necessário, enquanto a fome por matéria-prima e o desperdício são características descaradas de quem pouco se importa com isso, justamente aqueles que mais causam danos em nome do lucro.
2Divisão do trabalho: a cisão entre trabalho do pensar e trabalho do fazer. Existe uma elite que pensa e um bando de trabalhadores que sabe apenas desempenhar sua função. A elite pensa e não trabalha. Os trabalhadores não têm tempo nem oportunidade de pensar, tão engajados que estão na luta pela sobrevivência.
3Esse é o contexto de Mészáros. Hoje, as condições mudaram a ponto de ser recomendável que o indivíduo seja o mais “capacitado” possível, o que não significa que as coisas estejam melhores. Agora, há uma segregação ainda maior entre os pobres e os ricos, porque os pobres não podem pagar pela capacitação exigida.
Por que a crise afetou a educação?
Philosophy – Wikipedia, the free encyclopedia.
Atenção professoras de filosofia da educação, este artigo foi escrito por Yure! Então, se você vir este artigo em meio aos artigos de seus alunos e ele estiver assinado com o nome Yure, somos a mesma pessoa!
Resumo.
Hannah Arendt filosofou sobre muitas coisas e escreveu muitos livros. Mas este artigo se foca em um aspecto específico de um de seus livros. Neste artigo, temos uma análise dos principais pontos do tópico “crise na educação”, do livro Entre Passado e Futuro.
Aqui, é feito um apanhado do ponto de vista da filósofa sobre como a educação deveria ser para salvaguardar a integridade da criança antes de estar pronta para a vida adulta. Além disso, também é feito aqui uma reflexão sobre como a crise afetou a educação e de como a configuração da crise remonta às ideologias americanas. Porém, não é um artigo sobre política e de como ela afeta a educação. Este artigo procura as razões mais pessoais por trás do texto de Arendt, para mostrar como o problema na educação não é culpa exclusivamente do Estado.
Palavras-chave: Arendt, educação, crise, política.
Abstract.
Hannah Arendt philosophized over many things and wrote many books. But this article focuses on a specific aspect of one of her books. In this article, we have an analysis of the main points in the topic “crisis in education”, from the book Between Past and Future.
Here, we try to make a collection of the philosopher’s views on how the education should be to keep the child’s integrity safe before the child is ready to start an adult life. Plus, a reflection over how the education went into crisis and how the crisis’ configuration can be backtracked to the American ideologies is also done. However, this isn’t an article about politics and how it affects the education. This article looks for more personal reasons behind Arendt’s text, to show that the problem in education isn’t something to be blamed solely on the State.
Keywords: Arendt, education, crisis, politics.
Introdução.
A educação não é exatamente estável hoje. Apesar de a educação ter passado por momentos piores, já ter sido caótica e também muito mais elitista, hoje nós temos a impressão de que nosso ensino está avançando na direção certa e já mostrando resultados. Na verdade, não é bem isso o que acontece. O que acontece é que hoje nós temos um inculcamento de uma ideologia que forma para o sistema, o que é apenas natural, considerando que a escola é um organismo inserido na sociedade e, como tal, acaba trabalhando para seu perpetuação. A situação parece melhor porque a educação é conformista.
Então, embora nossa educação certamente esteja melhor, ainda lhe falta o elemento libertário, que sempre escapou das paredes da escola e sempre foi sua maior ambição. A educação que forma para a vida e não simplesmente para o sistema seria aquilo que os professores bem intencionados mais almejam, mas é uma esperança que ainda é frustrada pelas demandas do sistema capitalista que ativamente boicota os esforços de professores sinceros em formar livres pensadores.
Se nossa educação é vista com olhos otimistas, foi à custa de críticas feitas no passado sobre uma educação ainda pior. De fato, é sobre críticas que se forma aquilo que hoje nós vemos como “avançado”, uma vez que não se pode criar o novo sem apontar o que falta ao velho. Neste documento, procuro enunciar algumas críticas feitas por Hannah Arendt contra a educação de seu tempo e seu terreno (Estados Unidos, século vinte). São críticas ainda muito atuais, pois alguns dos problemas que ela aponta não foram devidamente adereçados e provavelmente não o serão num futuro próximo, mas estão aí para orientar nossa educação atual para o rumo devido.
Como base, este texto utiliza a quinta parte, “a crise na educação”1, do livro Entre o Passado e o Futuro. Porém, em vez de se ater aos aspectos políticos, procuro dar mais ênfase aos aspectos existenciais e psicológicos, recorrendo à política quando necessário apenas. Isso porque a política do tempo e do terreno de Arendt não é como a nossa política, hodierna e brasileira, o que faz com que alguns pontos do seu texto não nos sejam relevantes.
Na primeira parte, por que educar, examinamos o ponto de vista de Arendt acerca da razão de ser na educação e de como ela acontece. Depois, em por que a crise afetou a educação, procuramos saber o que levou a educação que Arendt observava à crise sobre a qual ela discorre. Também delineamos as características da crise. Por último, o que fazer frente à crise.
Por que educar?
Por que mesmo devemos educar as pessoas? O que levou o ser humano a ensinar coisas aos seus filhos? Não seria simples a resposta? Nós educamos porque o mundo está posto ali já antes de nosso nascimento. Esse é um mundo estranho que tem que ser explicado.
O mundo no qual são introduzidas as crianças […] é um mundo velho […], construído pelos vivos e pelos mortos.2
Ele tem seus próprios processos de ação e suas regras são complexas na mesma medida em que ele é velho. Nós estamos em um constante processo de descobrimento dessas regras, das regras de funcionamento do mundo natural, mas nós também criamos nossas próprias regras, as regras do mundo social. São regras difíceis, por vezes contraintuitivas, sem as quais não podemos sobreviver. A inobservância dessas regras torna a vida neste mundo difícil, penosa, e indigna. Cada nova descoberta, acordo, técnica e até mesmo moda que substitui o que é velho faz com que aqueles que não aderem à mudança se tornem obsoletos, indesejáveis. E o ser humano não é capaz de viver sozinho no mundo. Seu poder vem da maioria, da socialização. Então, pertencer à sociedade, participar em seus avanços e usufruir da observância das regras do “jogo da vida”, que se desenrola na arena do mundo, é necessário para a sobrevivência não apenas do indivíduo, mas de toda espécie humana. Talvez isso fosse razão suficiente: educamos para ensinar como o mundo funciona, como ele é, de forma que as crianças desenvolvam sua forma de viver da melhor maneira possível. E os recém-chegados ao mundo, as crianças, não sabem dessas regras ainda e precisam de um lugar onde possam aprendê-las. Por isso, Arendt afirma que:
[…] a essência na educação é a natalidade.3
Para Arendt, a educação começa, em primeiro lugar, em casa, mas não como letramento. Em casa, a criança, na sua vida privada, é preparada pelos pais, de forma segura, para aquilo que depois seria a ponte entre vida privada e vida pública: a escola. Em casa, a criança se desenvolve, se conhece e se torna ciente de suas capacidades físicas e mentais, através, por exemplo, do jogo. É como uma planta, que está crescendo e precisa ser nutrida pelos pais. Ela aprende de forma orgânica, natural, coisas como falar o idioma materno e as primeiras regras de comportamento, que são absorvidas pela imitação. Em outras palavras, os pais são as primeiras figuras de autoridade que a criança conhece. Assim, há uma relação de autoridade e responsabilidade entre pai e filho.
[Os pais] assumem na educação a responsabilidade, ao mesmo tempo, pela vida e desenvolvimento da criança e pela continuidade do mundo.4
Para proteger a criança, a vida privada precisa ser protegida também. Para Arendt, a criança não deve ser exposta ao mundo, isto é, à vida pública, sem antes estar devidamente preparada. A vida pública seria caracterizada pela política e, no contexto americano, pela igualdade. Só que, quando há igualdade, não há autoridade, que é requisito para uma formação devida. Então, antes que a criança possa entrar em contato com a política, com a igualdade e com a vida pública, ela precisa ser antes preparada na escola e, antes de ir para a escola, precisa ser preparada na família.
Para Arendt, a escola é uma ponte. Ela faz uma ligação entre vida privada, família, e vida pública, o mundo, sem, ao mesmo tempo, ser o mundo ou a família. A escola prepara a criança para entrar no mundo dos adultos, sendo uma etapa necessária para sua emancipação.
É importante ressaltar que a escola não necessariamente é a instituição a qual estamos acostumados. Existem diferentes tipos de escola em diferentes tipos de sociedade. A escola pode ser a igreja, pode ser o lar, pode ser o convívio. Ela não necessariamente é um instituto especializado. Funciona como escola qualquer etapa intermediária, preparatória, entre família e mundo. Essa mudança de um extremo para outro é feita de forma gradual. Idealmente, a formação da criança, além de prepará-la para o mundo, deveria também prepará-la para mudá-lo. E de fato…
[…] estamos sempre educando para um mundo que ou já está fora dos eixos ou para aí caminha […].5
Colocamos em nossas crianças nossas esperanças de manter o progresso do mundo.
Resumindo.
Para Arendt, a educação ideal começa na família, com a preparação da criança, num meio privado, para a escola. A criança precisa ser protegida da vida pública, porque não está pronta ainda, até que ela esteja amadurecida o bastante para ser-lhe apresentada aos poucos através da escola, que faz assim a ponte entre família e mundo. A criança não deve lidar com política e deve estar submetida à autoridade dos pais.
A autoridade é necessária à educação, o que também implica a responsabilidade por parte da figura de autoridade, que também é o professor, quando ela chega à escola. Assim, há uma dialética entre autoridade sobre o filho e também dever por sua segurança e formação devida, enquanto ele está nesse meio privado. Quando o filho está maduro o bastante, deve ir para a escola.
Na escola, a criança é preparada para o mundo dos adultos, ao qual deve ingressar quando estiver devidamente pronta.
Por que a crise afetou a educação?
Arendt estava inserida num contexto norte-americano. Como todo filósofo tende a interpretar a realidade que o cerca, ela falou dos Estados Unidos. Porém, ela não é tão atual ao dizer que a crise na educação nos Estados Unidos é algo que era devido à peculiaridades do estilo de vida de lá. Essas coisas não são peculiaridades, ao menos não mais. Com a gradual americanização do mundo, a crise norte-americana se repete, quase tal e qual, em outros lugares, incluindo no Brasil. Como será visto, a adoção de alguns paradigmas ideológicos estadunidenses pelo resto do mundo põe em questão alguns princípios basilares que foram discutidos na seção anterior e que são indispensáveis ao correto desenvolvimento da criança.
Que paradigmas? Os paradigmas de repúdio à autoridade e de esforço desenfreado pela igualdade. Isso porque o contexto de Arendt veio logo após o nazismo, no qual a imagem da autoridade foi manchada pelo autoritarismo. Isso gerou uma crise que afeta vários campos, mas falaremos apenas da educação aqui.
Nós temos hoje uma série de preconceitos sobre a vida pública e a vida privada. Isso não é fonte de problemas apenas educacionais, mas também psicológicos e existenciais. A vida pública é glorificada como algo ao qual todos temos que entrar tão cedo quanto possível, ao passo que a vida privada é vista como uma oportunidade do ser humano de se render aos seus impulsos reprováveis. Existe uma pressão pelo fim da vida privada, uma pressão para que você aja do mesmo modo em público e em casa. Dá para ver, de imediato, por que isso é algo nefasto.
Por “fim da vida privada”, me refiro à pressão para que seu comportamento seja “genérico”, seja o mesmo em diferentes situações. Ao mesmo tempo, é requerido que você despenda cada vez mais tempo fora de casa, trabalhando, se socializando, interagindo. As pessoas desenvolveram um preconceito com a vida privada, como se ela não fosse produtiva. Isso também tem origens no pragmatismo americano. Na vida pública, você produz mais, então deveria passar menos tempo em casa, onde você não produz.
A vida pública americana é um local de igualdade. Nesse lugar, todos somos iguais, ou, pelo menos, é o que se prega. É um lugar no qual nós somos livres para falar, pensar e agir, uma liberdade que foi o lema do século passado. Operários e mulheres foram livres dos grilhões dos senhores e dos maridos, conquistando, pela liberdade, condições melhores de vida e de escolha. Mas essa é uma liberdade que não deveria se estender aos filhos.
Aquilo mesmo que significara uma verdadeira libertação para trabalhadores e mulheres […] constituiu abandono e traição no caso das crianças […].6
Os filhos passaram a reivindicar para si uma igualdade impraticável entre adultos e crianças, criando suas próprias microentidades com suas próprias leis, onde podem buscar amparo quando elas têm suas aspirações de igualdade ultrajadas pela autoridade dos adultos.
Isso põe em questão a autoridade que é necessária para ensinar. Além disso, a autoridade teve sua imagem manchada por abusos cometidos no passado. Os pais educados pela igualdade talvez se sintam mal em exercer autoridade sobre os filhos e acabam os deixando se desenvolver como lhes apraz, mas isso não é apenas um problema ideológico, tendo também sua faceta mesquinha: renegar a autoridade é renegar também a responsabilidade. Os filhos crescem repudiando a autoridade e os pais desta geração são pais irresponsáveis. A crise na educação tem também raízes na crise que afeta a família. Talvez falar de autoridade com tanta convicção e até paixão soe um tanto antidemocrático, mas a obediência a quem pode comandar melhor é sempre uma atitude sensata.7
Isso afeta também a escola. No contexto de Arendt, temos o exemplo dos imigrantes.
Como para a maior parte dessas crianças o inglês não é a língua natal […], [a escola] obviamente deve assumir funções que […] seriam desempenhadas normalmente no lar.8
Como a família está falhando, cabe à escola algumas das tarefas que deveriam ser dos pais. Daí a demanda por escolas de tempo integral, já que os pais irresponsáveis não querem cuidar dos filhos como deveriam e despendem tempo demais trabalhando, normalmente porque o sistema capitalista o pressiona para isso. Afinal, é requisitado cada vez mais trabalho de nossa parte para manter nosso nível de conforto. E isso tem implicações no funcionamento da escola. O currículo teria que ser ajustado, o ambiente da escola teria que ser mudado e a escola, que não deveria ser nem família nem mundo, acaba perdendo seu caráter frente aos alunos, que a veem como uma mera extensão da casa. A mudança no currículo escolar ocorre de forma análoga à mudança no currículo universitário no contexto de Arendt, onde não havia ensino médio.
Em consequência dessa ausência de uma escola secundária, a preparação para o curso superior tem que ser proporcionada pelos próprios cursos superiores, cujos currículos padecem, por isso, de uma sobrecarga crônica, a qual afeta por sua vez a qualidade do trabalho ali realizado.9
Tendo que ser família e escola, a escola perde o foco naquilo que realmente deveria estar ensinando, ocasionando um ensino inferior. É importante levar em conta que esse problema é amenizado nas escolas de tempo integral, por razões evidentes.
Outro problema é a tendência moderna de manter as crianças como crianças. “Aprender brincando” é um lema muito ouvido recentemente, mas isso tem seus efeitos negativos sobre o desenvolvimento da maturidade da criança.10 A criança passa a ter dificuldade em saber quando deve parar de brincar e quando deve começar a ser séria, pois as duas coisas estão mescladas. Isso é especialmente frustrante para a criança mais velha ou o adolescente, que já rejeitam as brincadeiras tolas das crianças mais novas e acabam tendo que brincar com elas em nome da ideologia de igualdade que permeia a educação.
Ao discutir que a quantidade de alunos que não sabem ler nos Estados Unidos é maior que em todos os países da Europa, Arendt diz que isso se dá pela corrida dos Estados Unidos em ser uma “nova ordem mundial”, em ter tudo novo, incluindo métodos de ensino. Os métodos norte-americanos são experimentais (ou, pelo menos, eram na época em que Arendt escreveu o livro) e têm que ser pautados nessas ideologias de liberdade e igualdade democráticas. Esses métodos são ainda imaturos e atacam aquilo que a Europa já sabe que dá certo. O método europeu funciona bem, mas por que ele não é aceito nos Estados Unidos? Simplesmente por se fundar em uma ideologia incompatível.
O que é intentado na Inglaterra é a “meritocracia”, que é obviamente mais uma oligarquia, dessa vez não de riqueza ou de nascimento, mas de talento. […] A meritocracia contradiz, tanto quanto qualquer outra oligarquia, o princípio da igualdade que rege uma democracia igualitária. Assim, o que torna a crise educacional na América tão […] aguda é o temperamento político do país, que espontaneamente peleja para igualar […] jovens e velhos, […] dotados e pouco dotados, […] crianças e adultos e […] alunos e professores.11
É o fim da autoridade. Mas é justamente isso que querem os Estados Unidos. Uma educação internamente igualitária, onde professores não valem mais que seus alunos em hierarquia.
Um forte golpe sobre a autoridade do professor foi uma reforma na pedagogia que permitiu que professores que não conhecem bem a matéria que devem passar fossem admitidos no ofício, com o pretexto de termos “professores aprendentes”, que aprendem a matéria durante o ofício. Só que isso tira do professor aquilo que mais lhe dá autoridade, que é a crença de que ele sabe mais que os alunos. Se ele sabe tanto quanto os alunos em determinado assunto, por que os alunos o devem ver como professor mesmo?12
Como a autoridade do professor europeu está bem estabelecida, seus ensinamentos são levados mais em conta pelos alunos, são mais admiráveis, são mais difíceis de ser contestados (o que é uma faca de dois gumes), são melhor aceitos. E, como responsabilidade e autoridade andam juntas, o professor tende a ser mais responsável pelos seus alunos, zelando pelo seu crescimento. E crescimento é algo tido em alta conta pelos próprios alunos, porque, numa meritocracia, quem mais estuda e mais sabe, mais pode. Num sistema igualitário, tanto faz eu estudar ou não.
Resumindo.
A crise na educação também da crise na família e da crise na política. Da política porque existe agora uma demanda por igualdade e liberdade para todos, ao menos aqui na América e nos países sob influência dos Estados Unidos. Da família porque temos uma pressão para acabar com a vida privada, onde a criança deveria se desenvolver, ao passo que os pais não querem mais assumir responsabilidade integral pelos filhos, relegando a autoridade aos professores. Afinal, é na vida privada onde se criam os filhos e os pais são constantemente afastados dela.
As crianças acabam sendo levadas à escola cada vez mais cedo, às vezes em tempo integral, sobrecarregando a escola, que perde seu caráter.
O que fazer frente a crise?
Desconstruindo a seção anterior, nós temos os seguintes pontos fracos apontados por Arendt no ensino:
-
Absorção de uma educação igualitária, sem autoridade, nem de professores, nem de pais. As figuras de autoridade estão relegando seu poder à outras figuras.
-
Falta de responsabilidade por parte dos pais (crise da família). Os pais passam menos tempo com os filhos, não querendo fazer mais esforço que o mínimo possível para seu desenvolvimento.
-
Ausência de benefícios por aprender. Os alunos não veem vantagem em aprender.
-
Sobrecarga da escola com coisas triviais que deveriam ser tratadas na família. A escola perde aos poucos seu caráter preparatório e passa a ser vista como extensão à família.
Em primeiro lugar, é necessário trazer de volta a autoridade dos pais e professores. Isso não é fácil por razões ideológicas. Os pais desta geração foram educados pela igualdade e talvez não saibam como lidar com uma situação na qual eles são imbuídos de autoridade. São pais fracos, que se limitam a amparar o filho quando algo dá errado, mas isso é ruim em duas vias.
Primeiro porque fomentam a rebelião do filho, que se junta com outros de sua idade na formação de grupinhos. E é aí que está o inferno.
[…] ao emancipar-se da autoridade dos adultos, a criança não foi libertada, e sim sujeita a uma autoridade muito mais terrível e verdadeiramente tirânica, que é a tirania da maioria. […] A reação das crianças a essa pressão tende a ser ou o conformismo ou a delinquência juvenil, e frequentemente é uma mistura de ambos.13
A criança não está pronta para a vida pública e ingressar num grupo de iguais é lidar com o mundo público, com um sistema político chamado democracia. Se ela não sabe se expressar, pode sentir-se frustrada por ter sugestões genuinamente boas rejeitadas por uma maioria ignorante e ela não poderá fazer nada. Talvez nem sequer voltar à família privada por vergonha de admitir seu erro aos adultos. Outra coisa que permite a vida em sociedade é o devido controle sobre as emoções e isso é algo que se aprende com a educação e com a prática.
[…] a medicina cura as doenças do corpo, a sabedoria livra a alma das paixões .14
Os grupos de pessoas que não foram educadas pelos pais não favorece a prática do controle ordeiro das emoções (essa é uma das coisas que não deveria ser ensinada na escola, mas em casa, e os conflitos entre alunos na escola seriam melhor controlados se os filhos trouxessem educação emocional de casa) e não pode subsistir por muito tempo, descendendo ao caos.
A segunda via é a de que, deixando o filho agir como quiser, mas amparando-o quando seus planos dão errado, o pai está impedindo o filho de sentir as consequências de seus atos, o que prejudica seu julgamento.
Não podendo ser educada em casa, a criança não estará pronta para a escola, na qual provavelmente encontrará a mesma situação. Os professores ou não querem ter autoridade ou não querem assumir responsabilidade. Eles querem manter as crianças como crianças. Como a escola também é um dispositivo ideológico do Estado, talvez os professores prefiram doutriná-las15, mas até isso pode ser difícil, se os jovens que receberão a doutrina não reconhecerem autoridade no professor. Especialmente se o professor de matemática for apenas pedagogo. Houve um tempo em que os professores da primeira à quarta série eram apenas pedagogos, não sendo formados na matéria em que ensinavam. Aquilo era muito suspeito.
E isso não é perigoso apenas no âmbito escolar em geral, mas dentro da sala de aula, quando o pedagogo se mostra incapaz de responder perguntas específicas feitas por alunos interessados e ou os desaponta ou mente. Isso também acontece quando, por falta de professores, mestres de outras matérias acabam sendo chamados para ensinar assuntos que não dominam. Por vezes, o aluno percebe que o professor comete erros grosseiros em relação à matéria com relativa frequência ou mesmo muita frequência. Acaba completamente a autoridade e também o respeito quando o aluno percebe que sabe mais que o professor, porque fica a impressão de que o professor está se esforçando para enganar os alunos, fingindo ensinar o que não sabe. Já na Grécia Antiga se pensava que ser capaz de ensinar algo é um distintivo de que aquela pessoa conhece o que está ensinando.16 Mas os pedagogos deixam a desejar no ensino das matérias que deveriam ensinar. Então instituir pedagogos para ensinar algo que não aprenderam é um retrocesso milenar.
Agora, o próximo problema: os pais não querem ou não podem assumir responsabilidade sobre os filhos. Isso tem raízes no sistema capitalista. Dependendo da condição da política, temos que trabalhar mais ou menos para mantermos nosso nível de vida. Se temos de trabalhar mais, não podemos tomar devida conta de nossos filhos, entregando-os aos outros. Mas a autoridade que é necessária para o desenvolvimento da criança se desenvolve com convivência. Como a criança reconhecerá a autoridade de uma pessoa que passa pouco tempo com ela, na vida privada que é a família? Se temos de trabalhar menos, nem por isso queremos despender mais tempo com os filhos, posto que não temos costume de fazer isso.
Esse é talvez o ponto mais difícil de resolver, porque não bastaria uma reforma política, mas também uma mudança de comportamento nos pais. Não basta assumir autoridade, mas também responsabilidade e autoridade sem responsabilidade é autoritarismo.
Num sistema igualitário, em contraste com a meritocracia europeia, aqueles que estudam e se esforçam não são devidamente recompensados. E por isso, não são vistos com respeito, mas antes com inveja. Isso faz com que os ignorantes assaltem moralmente e até fisicamente aqueles que são bons estudantes, ao passo que não se esforçam para mudar sua própria condição por não verem vantagem nisso. Isso não apenas fomenta a mediocridade entre as crianças, mas também o bullying, porque cada criança procura um meio de se sobressair, logo, se não tem sentido se sobressair por saber mais, elas talvez procurem se sobressair pela força física e pelo controle sobre os outros. Os que estudam e se esforçam precisam ser recompensados com mais do que simples notas no histórico escolar. Mas isso precisa ser devidamente policiado também, para evitar o surgimento de oligarcas. Aqueles que tem desempenho ruim devem receber também atenção para que não sejam excluídos. Afinal, muitas vezes um aluno vai mal por causa do professor, por causa de um problema de saúde ou familiar, por causa de condições que estão além de seu controle. O professor então precisaria atentar não apenas para os bons estudantes, mas também para os péssimos.
Como decorrência da crise na família, as escolas acabam também desempenhando tarefas tipicamente familiares. Para que o aluno trate a escola com mais seriedade, ele precisa saber que ali não é sua casa. Isso não significa ser demasiado duro com o aluno, mas que a escola deixasse claro que ali não é o lugar para aprender aquilo que deveria ser aprendido dos pais. Ao recusar esses papéis, a escola está forçando os pais a assumir responsabilidade pelo filho, o que é o correto.
Só que isso não seria uma medida adotada pelas escolas particulares, as quais Arendt deixa de fora de seu discurso17, porque as escolas particulares e também as escolas paroquiais não são “uniformizadas” como as escolas do Estado. Cada uma funciona da maneira que lhe apraz. Isso porque a escola particular precisa de clientes, ela é uma empresa inserida num mundo capitalista competitivo. Ela precisa se diferenciar da concorrência para não definhar e uma escola que tire dos pais o máximo possível de responsabilidade vai bem entre pais que não querem assumir tais responsabilidades. Então, as escolas particulares continuarão quebradas em sentido moral enquanto a transferência de responsabilidade for lucrativa.
Resumindo.
“Resolver” a crise na educação não é um trabalho simples porque não é um trabalho meramente político, mas também psicológico. Atacar uma ideia (o “sistema”) sem relevar os aspectos materiais e palpáveis que a compõem (as pessoas que fazem o sistema, isto é, alunos, professores e Governo) é fazer metafísica desnecessária.18
Seria necessário restituir a autoridade dos pais e professores, seria necessário que estes fossem mais responsáveis, seria necessário que os alunos vissem benefícios em aprender e seria necessário que a escola não fosse um ambiente de infantilização dos alunos, mas um ambiente no qual eles se preparam para o mundo adulto, o que só pode ser alcançado quando a escola parar de ser também família.
Conclusão.
Eu não quis, com este trabalho, tirar de Arendt a razão em dizer que o problema na educação é também um problema político, mas quis mostrar que há também uma face psicológica, existencial por trás da crise, e que atacar somente a política é um ato de má-fé sartriana (embora ela não faça isso, há quem faça)19.
A política influi sobre muitas coisas, mas a política é feita por nós também. A política é feita por pessoas que escolhem seus governos e, se essas são pessoas corruptas, é claro que nossa política será corrupta. Isso é válido para qualquer tipo de política, não apenas a política estatal nacional que se mostra com mais frequência, mas também para as políticas mais pessoais e mais práticas que estão ao nosso redor: a família e também a escola. Mudar a escola não é apenas questão de mudar o governo, é também questão de mudar professores e alunos, que às vezes também são afetados pelas condições dentro de suas famílias. Muito material se produziu contra o governo, mas pouco se produz contra a pessoa, salvo maus livros de autoajuda, levando alguns a crer que a culpa nunca é deles, mas sempre do Estado.
O grande problema que não foi ainda resolvido é que operar esse tipo de mudança requer educação, que ainda está sob a crise. Porém, é possível tirar a educação dessa crise de forma gradual, um passo de cada vez, passos sendo operados por aqueles que já conseguiram uma educação decente em meio ao caos. Esses somos nós, filósofos. É importante continuar a produzir, não apenas para o governo, mas também para pessoas, que possam mudar sua atitude individual dentro na educação, para que não passem suas vidas esperando de braços cruzados pela reforma política. Ou seja, se não conseguirmos tirar a educação desta crise, podemos pelo menos permitir que ela respire, agindo como pudermos sobre esses pontos individuais, sem descuidar dos mais gerais. Porém, por ser uma crise grande, embora não totalmente paralisante, ela não pode ser resolvida de imediato e talvez nem num futuro próximo.
Referências bibliográficas.
ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. Tradução de Mauro W. Barbosa de Almeida. São Paulo: Editora Perspectiva, 2000.
ARISTÓTELES. Metafísica. Tradução de Leonel Vallandro. Porto Alegre: Editora Globo, 1969.
DEMÓCRITO. Fragmento 31, in Os pré-socráticos: fragmentos, doxografia e comentários. Tradução de Paulo F. Flor. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
IDEM. Fragmento 47, in ibidem.
1Arendt fala especificamente de uma crise ideológica que afeta vários campos, inclusive a educação. É uma crise “na” educação, no sentido de que ela vem de fora e afeta a educação. Não uma crise “da” educação, porque não se origina nela.
2ARENDT, página 226.
3ARENDT, página 223.
4ARENDT, página 235.
5ARENDT, página 243.
6ARENDT, páginas 237-238.
7DEMÓCRITO, página 307.
8ARENDT, página 223.
9ARENDT, página 228.
10ARENDT, página 233.
11ARENDT, página 229.
12ARENDT, página 231.
13ARENDT, páginas 230-231.
14DEMÓCRITO, página 305.
15ARENDT, página 225.
16ARISTÓTELES, Livro I, 981b, 5-10, página 38
17ARENDT, página 227.
18Esta não é uma expressão redundante; existe metafísica necessária. Mas é desnecessária neste caso porque os críticos estariam atacando uma ideia abstraída de elementos bem materiais. Logo, não é necessário fazer metafísica desse problema.
19Para Arendt, a raiz da crise que afeta esses vários campos, política, família e educação, é a forma como encaramos o passado, que levou à contestação do conceito de autoridade. A crise vem do ataque à autoridade nesses diversos campos. Eu não estou dizendo que Arendt pensa que é um problema exclusivamente político, mas que ela pensa que também é político e, com isso, estou de acordo.
8 de maio de 2015
Manual do cristão.
Preguiça de pensar e medo de errar. As pessoas que vão para igrejas muitas vezes sofrem de um dos dois problemas, talvez até dos dois. Permitindo que um padre ou pastor interprete a linguagem divina por eles, eles podem se dar ao luxo de simplesmente seguir aquilo que ele diz, se poupando de um esforço de leitura e hermenêutica que poderia não apenas treinar suas mentes, mas também desenvolver uma relação mais pessoal com o divino. Por outro lado, elas têm medo de que, fazendo isso, sejam mais propícias ao erro do que aqueles que já fazem isso há muito tempo. Então, resolvi compilar versículos dos evangelhos que trazem a moral cristã. Essa compilação traz as leis que foram repassadas por Jesus, poupando a pessoa de ter de caçar esses textos em meio às páginas bíblicas. Porém, não elimina a necessidade de interpretação. Aliás, a moral cristã é simples, não precisa ser um estudioso para entender esses versos. Então, espero que com isso as pessoas vejam que o conteúdo moral bíblico não é difícil e que, assim, elas não precisam de um líder religioso que lhes diga o que é certo e o que é errado. Bastaria ler. E, justamente por sua simplicidade, a chance de errar na hora de interpretar é muito baixa.
Mas aí vem a pergunta: por que apenas os evangelhos? As Bíblias protestantes, em geral, tem sessenta e seis partes, contando livros e cartas, mas existem Bíblias de até oitenta e uma partes, que, inclusive, levando em consideração também a Septuaginta, divergem até em número de capítulos por livro. E não apenas cristãos têm suas dúvidas: muitas críticas feitas por judeus caem sobre a Septuaginta, acusada de pobre e de fazer adições indevidas ao Antigo Testamento. E ainda tem o evangelho segundo Allan Kardek e o Livro de Mórmon. Logo, a minha escolha de crer somente nos evangelhos como norma de conduta moral não tem menor mérito em relação a qualquer outra escolha: estamos todos perdidos aqui.
Mas ainda preciso justificar minha escolha em particular de usar apenas quatro livros para orientar minha conduta religiosa. Bom, se todo cristão acredita nas palavras de Jesus, então acredita que ele é o caminho, a verdade, a vida e que ninguém vai ao Pai se não por ele.1 Ele é o único caminho e sua doutrina está nos evangelhos. Então me parece seguro que aquele que ama Jesus guarde seus mandamentos.2 Por outro lado, isso não significa que os outros ensinos bíblicos estão errados. Então não há necessidade de jogar fora nem a Bíblia de sessenta e seis livros, nem a de oitenta e um, mas deveria haver um interesse em analisar tantos livros quanto for possível e “pescar” deles o que quer que esteja em consonância com o que foi passado por Jesus.3 Especialmente porque ter vida eterna requer conhecimento sobre Deus, o que requer estudo e leitura, não apenas oração.4 Começar pelos evangelhos é crucial, porque eles contém a moral e as normas de conduta. Depois de lidos os evangelhos, recomendo a lida dos Atos dos Apóstolos, das epístolas de Paulo e das revelações do Apocalipse, que são também relevantes ao cristão. Depois, ler o Antigo Testamento, para reforçar a fé e compreender a tragetória judaica até a vinda do Messias, além de verificar que profecias foram cumpridas.
Justificada minha escolha, voltemos à compilação. A seguir, temos os ensinamentos passados às pessoas por Jesus enquanto ele estava na Terra. Então, se você gostaria de saber se está fazendo tudo certinho, continue lendo e avaliando seu comportamento. Se você sente falta dos ensinamentos feitos em outros livros da Bíblia, poderá lê-los por conta própria, tanto em Bíblias de fato, quanto em Bíblias online. Nunca foi tão fácil ter acesso às escrituras como hoje, então faça uso dessas novas tecnologias se você se sentir forte e hábil. Ou pode continuar usando Bíblias físicas, já que nem sempre se pode usar o computador e livros são mais fáceis de levar. Mas, caso a minha introdução te tenha deixado em dúvida sobre a validade dos outros livros, lembre que eles são seguros na medida em que concordam com o que foi dito por Jesus. E o que ele disse, moralmente, é o que copiei abaixo. Lembre-se que seguir essas regras perfeitamente nos torna mais próximos de Deus e que Jesus nos recompensará segundo nossas práticas.5
Provavelmente, a primeira moral a ser apresentada nos evangelhos é “não tenterás o Senhor.”6 Isso significa não colocar Deus à prova. Em outras palavras, não devemos testar para saber se Deus está ali ou não, mas assumir que ele está, sem ao mesmo tempo abusar de sua presença. Na medida do possível, devemos procurar resolver nossos problemas por contra própria, recorrendo a Deus em momentos trágicos, isto é, quando algo ruim e inevitável nos acontece, sem que tenhamos forças para nos recuperar. Isso não significa se aproximar de Deus somente quando o pior acontece, mas também para agradecer, como se verá depois, nas considerações sobre a oração.
A segunda moral é a de adorar apenas um Deus, que é este Deus, cujo nome está além da pronúncia (YHWH, que alguns traduzem como Javé, Iavé ou Jeová).7 Por “adoração” deve-se entender o culto e por “culto” deve-se entender rituais, preces, sacrifícios e todos os comportamentos normalmente dispensados às religiões. Algumas igrejas consideram culto também comportamentos obsessivos sobre coisas fúteis, como ídolos da mídia e bens materiais. Poderíamos, então, por extensão, também considerar culto o amor às coisas do mundo físico quando esse amor supera o amor que temos por Deus. Mas os critérios para avaliar o amor que sentimos é muitas vezes subjetivo. A pessoa talvez precise de um companheiro que possa prover um julgamento externo sobre a conduta, de forma que o erro, se presente, fique mais evidente, o que não implica uma relação de hierarquia (salvo quando o batismo for requisitado, porque ainda deve haver uma relação de hierarquia entre batizador e batizado).8
Como prêmio por essas condutas, temos a salvação, que é mais precisamente definida como “vida eterna”. Essa é uma salvação que pertence aos mansos, aos misericordiosos e aos justos.9 Mas “justiça” é um termo cuja a interpretação varia. Após uma lida nos evangelhos, vê-se que o conceito de justiça normalmente é invocado quando Jesus dá algum sermão sobre os fariseus. Os fariseus eram um grupo judaico que lucrava com a adoração dos fiéis, mas que quebravam às escondidas as leis que eles exigiam que o povo cumprisse. Então, ao mesmo tempo, eles eram hipócritas e obtinham para si uma quantidade desproporcional de lucro. O conceito de justiça é relacionado ao de proporção, algo presente no conceito de justiça de muitos de nós. Então, talvez, o conceito de justiça seja o de proporção lícita. Não devemos ter para nós mais que o devido, de forma que o nosso enriquecimento empobreça outrem, tal como deveríamos dar a alguém o devido respeito (por exemplo, devemos amar a Deus sobre todas as coisas porque ele nos criou e adorá-lo mais que a qualquer outro ser é nada menos que justo, pois ele recebe assim o devido respeito) ou ajudá-lo em sua necessidade, para que estabeleçamos harmonia entre ele e sua condição, isso parece ser a justiça. Se praticamos bem ao próximo, então estamos agradando a Deus e, negando o bem ao outro, não estamos trabalhando para a justiça e estamos o desagradando. É como se aquilo que fazemos pelo próximo fosse feito ao próprio filho de Deus. Se fazemos bem, é a ele que fazemos bem.10 Logo, justiça pode ter a ver com medida, harmonia e proporção, tanto material como moral. Da mesma forma, não devemos exigir dos outros o que não exigimos de nós mesmos. Se isso parece confuso, você pode considerar como justiça divina as ordens que devemos seguir. Continue lendo.
Já que Deus nos criou e merece nosso respeito, lhe devemos obediência. E isso inclui obedecer a regras que, aparentemente, proibem coisas inócuas. Por exemplo, o repúdio da mulher sem razão sexual.11 Hoje, o divórcio acontece com frequência, mas Jesus diz que não deveríamos nos separar a menos que um dos parceiros tenha praticado algum sexo ilícito. Talvez seja porque, naquela época, a separação implicava esse tipo de infração, logo as pessoas separadas eram vistas de forma diferente, talvez com desprezo. Então, se separar sem a devida razão atrairia para o separado uma má fama que lhe era injusta, isto é, indevida. Muitos discordarão disto e talvez se levante a pergunta: “qual seria a razão de proibir o divórcio sem razão sexual hoje?”. Eu não tenho ideia, mas, se Deus mandou e eu lhe devo obediência, só posso concordar. Talvez haja uma razão que eu venha a descobrir no futuro ou talvez Deus tenha razões que eu, como ser humano, não entenda.12
A moral seguinte é a dos juramentos. Nós não podemos fazer juramentos de forma alguma, nem por nós mesmos (porque poderíamos quebrá-los, o que nos culpabilizaria) nem pelos outros (porque isso é falar em nome de alguém que não consentiu e poderia lhe permitir a ferir a honra da pessoa pela qual você jurou). É mais seguro não jurarmos de forma alguma para diminuir nossas chances de desonra.13 Assim, devemos responder com sim ou não, em vez de juro que sim ou prometo que não.14
A próxima moral é a da resistência à injustiça. Embora possamos evitar sermos vítimas de injustiças pela ação sábia, não deveríamos revidar injustiças cometidas contra nós.15 Na verdade, deveríamos amar aqueles que nos ofendem dessa forma (aliás, devemos amar a todos, tal como Jesus nos amou, o que significa também repreender quando necessário).16 Mas amor não é um sentimento doentio de completa submissão. Quem ama quer o aperfeiçoamento do amado. Então a disciplina e a admoestação fazem parte do amor.17 Porém, se a pessoa insiste em fazer o que é errado apesar de alertada sobre as consequências, o bom cristão só pode aceitar e se compadecer do erro em que a pessoa incorre.
Depois temos a moral da modéstia. Ao fazer alguma boa ação, devemos guardá-la para nós mesmos em vez de fazer divulgações desnecessárias. Por exemplo, nos tempos de Jesus, quando ele fazia suas pregações, insistia com muitas pessoas que seus milagres fossem mantidos em secreto. Não devemos atrair atenção pelas coisas boas que fizemos.18 A oração também deve ser particular.19 Os fariseus gostavam de atrair atenção pelos dízimos que faziam e pelos jejuns.20 Também faziam orações públicas, talvez em alta voz também, para que as pessoas os vissem e os vestissem de um valor que não lhes era próprio, já que estavam fazendo a vontade de Deus publicamente, mas quebravam a lei quando sozinhos.21 A razão de quererem chamar tanta atenção talvez fosse a fama e a riqueza que obtinham dos outros fiéis, mas Jesus ensina que devemos ser humildes, modestos, como crianças.22 E uma característica das crianças é a inocência, a ingenuidade, a aceitação sem dúvidas. Um dos requisitos para obter a vida eterna é justamente crer na vinda de Deus “como uma criança crê”, isto é, sem duvidar.23
Quanto a oração, embora ela possa seguir um programa, não pode ser repetida da mesma forma todas as vezes, sem necessidade. A oração não pode ser automática.24 Quando memorizamos um texto e o recitamos, tendemos a não prestar atenção em seu significado e o texto torna-se vazio para nós. Então a oração não pode ser recitada, mas feita de forma pessoal a cada vez. Além disso, não há uma posição específica ou roupagem especifíca para orar, embora isso não significa que possamos assumir postura desrespeitosa ou, por exemplo, orar nus.25 Primeiro, Deus deve ser invocado e elogiado, devemos pedir pela vinda do reino, que sua vontade seja cumprida. E depois devemos fazer nossos pedidos, como comida, perdão e proteção. Vale lembrar que o perdão de Deus só é concedido aos que perdoam aos seus irmãos (e, por irmãos, falo de qualquer ser humano).26 Ao orar, tenha fé em suas próprias palavras e fé de que Deus as ouvirá. A oração com dúvidas não parece ser ouvida.27 A oração precisa ser feita a Deus em nome de Jesus.28
Riqueza não é tudo.29 Jesus disse que não deveríamos buscar as riquezas, mas ressalva que elas nos serão adicionadas se nós procurarmos fazer a vontade de Deus em primeiro lugar.30 A riqueza, se procurada em primeiro lugar, põe, necessariamente, a vontade de Deus embaixo, tornando a riqueza um senhor.31 Como não podemos ter dois senhores, é melhor que façamos uma escolha sensata.32 Além do mais, Deus pode prover riqueza também, desde que o coloquemos em primeiro lugar. Além do mais, nossos olhos, como a candeia da mente, precisam estar voltados para coisas dignas. Se visamos apenas a riqueza, a tentação de obter riqueza ilicitamente é maior.33 Além disso, ter um apego excessivo à riqueza nos torna avarentos e menos capazes de ajudar o próximo financeiramente.34 Por último, se buscamos as riquezas, a comida e os cuidados com a vida e nos esquecemos das coisas que realmente importam, seremos surpreendidos pelos acontecimentos dos últimos dias.35
A próxima moral é muito importante: devemos fazer aos outros aquilo que queremos que nos seja feito e não fazer a eles o que não queremos que seja feito a nós.36 Por exemplo: a menos que você queira ser julgado, você não deveria julgar os outros ou, se você quer ser perdoado, deveria ser capaz de perdoar.37 Isso parece resumir toda a lei que havia antes de Jesus. Válido também para intenções. Não deveríamos nem sequer nutrir desejos de fazer algo errado para com o próximo e parece sábio evitar pensamentos ou ações que nos levariam a tanto (cobiçar a parceira do outro pode nos levar a querer tomá-la para nós, por exemplo). Não devemos também nutrir raiva dele. Amar Deus sobre todas as coisas e o próximo como a nós mesmos são os maiores de todos os mandamentos e são condição de possibilidade do perdão de nossos pecados.38 Quem é incapaz de perdoar não obtém perdão pelas suas próprias faltas. E absolutamente precisamos de perdão porque erramos muito.39 Quanto aos julgamentos, existe um tipo de julgamento válido com o qual devemos medir atos e que permite críticas construtivas: o julgamento segundo a reta justiça, que ultrapassa as aparências.40
Como Jesus é nossa salvação, negá-lo também significa negar a salvação eterna provida por Deus.41 Se realmente queremos nos salvar, temos que ter apreço por Jesus, nossa salvação, e seus ensinamentos, mesmo quando segui-los implicar nossa morte.42 Não devemos nos envergonhar de dizer que acreditamos em Cristo como a salvação provida por Deus.43 Caso sejamos tentados em situações extremas, como, por exemplo, por pregar em um local onde tal coisa é proibida, precisamos manter a calma e nos defender em tribunal com sinceridade e espontaneidade.44 Isso implica que seguir a moral divina pode requerer alguns sacrifícios.45
Apesar de aqueles que aceitam a doutrina de Jesus como entregue por Deus não precisarem seguir as leis dos judeus integralmente, a maioria dos dez mandamentos está ainda em voga.46
As coisas que contaminam o ser humano são suas ações, não coisas exteriores. Para evitar más ações, precisamos colocar nosso “coração” (emoções e sentimentos) atrás da razão. Porque é do coração de onde vem a vontade de fazer o que é errado.47
Deus nos recompensará proporcionalmente às nossas ações.48 Então, para que nós possamos ter a maior recompensa possível, temos que sacrificar o máximo possível, mesmo que isso signifique abandonar família e amigos. Por isso está escrito que é difícil um rico entrar no reino dos céus. Afinal, um sacrifício proporcional, para que ele estivesse em condição perfeita, seria vender tudo o que tem.49
Que não digamos blasfêmias contra o Espírito Santo, porque essa é uma ofensa imperdoável.50
A próxima moral é a dos inimigos de Jesus. Não deveríamos proibir que façam milagres em nome de Jesus.51 Isso porque aqueles que fazem milagres em nome dele não falam mal dele. Observe que se trata de milagres verdadeiros, não aquelas palhaçadas que vemos na televisão. Hoje, por exemplo, vemos na televisão pessoas operando milagres obviamente falsos, combinados, ou aplicando golpes e induzindo histeria. Não devemos acreditar neles. Muitos virão ostentando o nome de Cristo.52 O verdadeiro Cristo, quando vier, nos dará um sinal inconfundível e evidente. Então, qualquer dessas igrejas que se proclama a “verdadeira”, mas que não valorizam estas coisas basilares que escrevo, é genuinamente falsa. Pelos frutos se conhece a árvore.53 Importante também é entender que os inimigos de Jesus são aqueles que conscientemente agem contra o que ele ensinou. Aqueles que são neutros, como os que não conhecem a verdade, por exemplo, também jogam a nosso favor.54
A próxima moral é a moral dos impostos e das dívidas com o mundo. Deveríamos pagar impostos ou arcar com demandas mundanas? Sim, na medida em que isso não transgride a lei maior, que é a de Deus.55 Mesmo os impostos injustos devem ser pagos.56
Existe uma festa na qual se come pão e se bebe vinho, conhecida como páscoa e que pode ser praticada uma vez por ano, normalmente. Ela parece ser necessária também, pois o pão é o corpo simbólico de Jesus, tal como o vinho representa seu sangue. Nos foi requisitado comemorá-la para “estarmos” nele.57 E, se estamos em Jesus, tudo o que pedirmos a Jesus nos será dado.58
Multiplique estas palavras e tenha fé no que Jesus nos disse, pois que Jesus nos disse o que Deus queria que soubéssemos. Tenha fé e multiplique, para que todos saibam o que devem fazer para agradar a Deus por meio de Jesus.59 Amém.
1João 14:6.
2João 14:15; 14:21; 15:10.
3João 5:39.
4João 8:19; 12:50; 17:3.
5Mateus 5:48; 16:27.
6Mateus 4:7. Lucas 4:12.
7Mateus 4:10. Lucas 4:8.
8Mateus 23:8, 9, 10. Marcos 9:50. João 3:5.
9Mateus 5:5, 7, 20.
10Mateus 25:40; 25:45; 26:52. Marcos 9:37.
11Mateus 5:32; 19:9. Marcos 10:11, 12. Lucas 16:18.
12Marcos 10:9.
13Mateus 5:34.
14Mateus 5:37.
15Mateus 5:39. Lucas 6:27, 28, 29, 30; 18:14.
16Mateus 5:44. João 13:34; 15:12, 17.
17Mateus 18:15. Lucas 17:3.
18Mateus 6:2, 4.
19Mateus 6:6.
20Mateus 6:16.
21Lucas 12:1.
22Mateus 18:4; 23:12. Marcos 9:35. Lucas 18:16.
23Marcos 10:15. Lucas 18:17. João 20:29.
24Mateus 6:7.
25João 4:24.
26Mateus 6:14. Marcos 11:25, 26.
27Marcos 11:24.
28João 16:23.
29Lucas 12:23.
30Mateus 6:19. 33. Lucas 12:31.
31Lucas 6:24.
32Mateus 6:24. Lucas 16:13.
33Lucas 11:34.
34Lucas 12:15.
35Lucas 21:34; 21:36.
36Lucas 6:31, 35, 36, 37, 38.
37Mateus 7:1, 12; 18:33, 35. Marcos 4:24.
38Marcos 12:29, 30, 31, 33. Lucas 10:27.
39Lucas 13:3.
40João 7:24.
41Mateus 10:33, 37, 39. Lucas 12:9. João 5:23; 12:48.
42Mateus 24:13. Marcos 8:35. Lucas 6:22, 23; 12:5. João 12:25.
43Marcos 8:38. Lucas 9:26.
44Marcos 13:11.
45Lucas 9:62; 14:33.
46Mateus 15:4; 19:18, 19. Marcos 10:19. Lucas 18:20.
47Mateus 15:19, 20.
48Lucas 12:33; 14:11. João 5:29.
49Mateus 19:21, 29.
50Marcos 3:29. Lucas 12:10.
51Marcos 9:39.
52Marcos 13:21.
53Lucas 6:45. João 14:24.
54Marcos 9:40. Lucas 9:50. João 15:23.
55Mateus 22:21. Marcos 12:17.
56Lucas 16:11, 12.
57João 6:56.
58João 15:7.
59Mateus 28:19. Marcos 11:22; 13:10; 16:16. João 3:16, 18, 36; 5:24; 6:29, 39, 47; 8:51; 12:36.