Pedra, Papel e Tesoura

26 de fevereiro de 2017

Anotações sobre o para a paz perpétua.

Filed under: Livros, Notícias e política — Tags:, , , — Yure @ 16:23
  1. Um tratado de paz que implique condições de recomeço da guerra é inválido.

  2. Um tratado de paz que considere a possibilidade de guerra em alguma circunstância é, na verdade, um tratado de trégua.

  3. “Paz eterna”, pra Kant, é pleonasmo. Se é paz, tem que durar.

  4. Não é possível herdar um estado independente, nem trocá-lo, nem vendê-lo, nem doá-lo, nem alugá-lo.

  5. Para que haja paz é preciso que os exércitos permanentes deixem de existir. Isso não implica que a população deixe de se oferecer pra servir em caso de guerra, mas que se deveria deixar o exército permanente, que é aquele que faz profissão da guerra, isto é, as forças armadas. Assim, haveria exército somente em caso de guerra, feito por voluntários. Claro que isso só funcionaria numa configuração mundial: todos os países teriam que fazer igual, do contrário estaríamos nos vulnerabilizando.

  6. Dinheiro mata mais que exército.

  7. Aliás, dinheiro pode até comprar exército. Seria interessante que houvesse menos investimento às forças armadas. Mas, se isso não for feito por todos ao mesmo tempo, ninguém fará. Se uma nação investe em seu exército, claro que as outras quererão investir nos seus também.

  8. O estado não deve fazer algo que diminua a confiança da população na paz. Mesmo que não seja possível a paz, é preciso acreditar que seja, ou não nos esforçaremos pra obtê-la. E há mais paz tentando obtê-la do que se entregando à violência por não crer que a paz seja possível.

  9. Não se deve travar guerras de extermínio, isto é, não se deve matar também os cidadãos do país oponente. Eles não lutaram na guerra, então não devem morrer.

  10. Existem táticas de violência que podem ser empregadas por qualquer um em tempos de paz. Isso acaba trabalhando contra a paz, porque são táticas fáceis de performar ou difíceis de detectar. Entre elas, o envenenamento e a espionagem.

  11. O estado de natureza é um de constante ameaça.

  12. A lei está preocupada com o obrigatório ou o proibido. Só é dito o permitido se for necessário dizer.

  13. Uma lei geral não é uma lei universal.

  14. Para Kant, a paz só será possível se todos os países forem repúblicas.

  15. Liberdade é fazer o que se queira desde que não se prejudique ninguém. Libertinagem é fazer o que se queira sem levar os outros em consideração.

  16. Liberdade jurídica, pra Kant, é submeter-se somente às leis que o sujeito livre aceita. Isto é, só cumprir as leis com que se concorda. Igualdade jurídica é a submissão dos indivíduos a uma lei comum decidida de comum acordo.

  17. Entrar em guerra ou não deveria ser uma decisão digna de plebiscito. A população sofre com a guerra e paga por ela, então entrar em guerra não deveria ser uma decisão tomada só no governo, sem deliberação também popular.

  18. Algumas guerras não valem a pena, mesmo que tragam paz quando concluídas.

  19. Se a população não tem influência política, o território não é uma república.

  20. É possível ser uma república sem ser democrática. Democracia, aristocracia e monarquia são formas de soberania, enquanto que república e despotismo são formas pelas quais a soberania governa.

  21. A diferença entre república e despotismo está na separação de poderes. Se o governo, mesmo que seja democrático, tem um poder que funciona ao mesmo tempo como legislativo e executivo, é despótico (exemplo: Brasil, pois o nosso executivo pode redigir leis, em vez de apenas sancioná-las ou vetá-las). Se o governo separa legislativo e executivo, com cada um exercendo funções diferentes, é uma república.

  22. A democracia é despótica… a menos que seja representativa, com legislativo e executivo separados. Se for representativa, há chance de não ser despótica. Se bem que isso torna a democracia quase uma aristocracia eletiva, se não exatamente isso.

  23. Pra Kant, a democracia só pode ser republicana via revolução violenta.

  24. A forma de governo é mais importante pro povo do que a forma de soberania.

  25. Para Kant, o sistema representativo é o único que possibilita a república.

  26. Os estados estão em estado de natureza um para com o outro. É preciso que haja diálogo entre eles. Hoje, isso é feito pela Organização das Nações Unidas, cujo objetivo é evitar uma possível terceira guerra mundial.

  27. Isso é feito por leis admitidas de comum acordo entre os estados.

  28. “Hospitalidade” é não tratar hostilmente um estrangeiro. O limite da hospitalidade é a civilidade do estrangeiro, isto é, deve-se tratá-lo com hospitalidade na medida em que ele não se faz odiar.

  29. A forma esférica da Terra permite que nós nos encontremos. Não há pra onde fugir: eventualmente encontraremos outra pessoa.

  30. A América era, pros invasores europeus, uma terra sem dono, porque seus habitantes lhes eram insignificantes.

  31. Qualquer efeito é também uma causa e implica causas anteriores (exceto a primeira causa, que não tem causa).

  32. A guerra serviu para espalhar pessoas pela Terra.

  33. A guerra parece ser parte da natureza humana, pois se faz guerra até sem motivo suficiente.

  34. A guerra corrompe.

  35. Quem força demais acaba quebrando. Se aplica força demais, não quer usar, mas quebrar.

  36. O despotismo acaba virando anarquia.

  37. O despotismo é o “cemitério da liberdade”.

  38. A diferença de idioma e a diferença religiosa são frequentes causas de ódio e de guerra. Não se entendem e, quando se entendem, não se gostam.

  39. O comércio não coexiste com a guerra. Se há comércio, há paz entre os povos (não necessariamente dentro de um povo). Se há guerra, não há comércio (a menos que se conte, talvez, o comércio interno).

  40. O servo mais fiel é o dinheiro.

  41. O legislador ou o governador deveria procurar conselho na filosofia, seja nos escritos ou em filósofos vivos que estejam em seu território.

  42. Por que os filósofos não se tornam políticos? Porque se forem políticos, poderão se corromper e deixar de lado tudo o que escreveram. Ou então, se ele se recusar a se corromper, não conseguirá dar corpo a nenhuma de suas boas intenções. Numa política majoritariamente corrupta, ninguém que não se corrompe pode fazer alguma coisa, mesmo que seja boa. Dizem que o Lula roubou. Ora, mas quantas coisas boas ele fez! Tanto que querem ele de volta (se bem que nem lembraríam se o governo atual não fosse ruim).

  43. Os filósofos devem falar à vontade. Se algum dia um governante precisar de conselho, poderá procurar na produção filosófica. Para Kant, isso é confiável porque filósofos não fazem propaganda. Talvez não fizessem na época dele, mas hoje há quem faça.

  44. Ninguém está obrigado ao que excede seu poder. Como alguém pode me obrigar a fazer o que eu não posso fazer?

  45. Moral e política combinam?

  46. Se o povo se rebela por causa de leis injustas e instaura novas leis, tudo bem, desde que as novas leis sejam melhores.

  47. Mas se essa reforma for feita às pressas, muito provavelmente acabará em anarquia.

  48. Se você supõe que o ser humano é incapaz de melhorar seu comportamento, usará isso como licença pra ser um canalha.

  49. É mais fácil pedir desculpas do que permissão. Se você usurpa o poder com violência e depois faz um bom trabalho como governador, provavelmente esquecerão que você é ilegítimo.

  50. Se uma besteira que você fez é descoberta, a tendência é que você negará que a culpa é sua ou colocará a culpa em outro. Isso é feito com frequência na política.

  51. “Dividir e conquistar”: uma outra tática suja da política é colocar os superiores um contra o outro, para fazer a oportunidade de conquista aparecer. Também pode ser feito com inferiores quando posam ameaça.

  52. Alguns planos políticos só dão certo enquanto a população não descobre.

  53. Para Kant, uma máxima que não pode ser manifestada publicamente é injusta. Se eu penso algo que não posso tornar público, é melhor eu não agir segundo esse pensamento, ele diz. Eu faria ressalvas, mas é melhor não dizer quais.

  54. A conquista de um território, mesmo pequeno, nunca é algo de pouca importância.

  55. Existem pessoas que sempre assumem que as outras têm má intenção.

  56. Mesmo que você não ame alguém, deve ser justo com ele.

  57. Se uma máxima não pode ser declarada, ela é injusta; se uma máxima pode ser declarada, mas não necessariamente, é moral sem ser política; se uma máxima precisa ser declarada, é moral e política. Ou, pelo menos, é o que Kant diz.

  58. A função da política é tornar os súditos felizes. Claro que isso só pode ser feito no âmbito da vontade geral. Não dá pra agradar a todos em tudo, mas se deve agradar no que todos querem em comum: educação, saúde, segurança, essas coisas.

  59. Isso requer transparência. O governo não pode fazer nada que os súditos não possam saber.

  60. Os truques sujos da política são considerados espertos se expostos. Eles só são vistos como “ruins”, “prejudiciais” ou “imorais” quando falham. Enquanto estão dando certo, o que as pessoas dizem? “Ele foi muito é esperto!” Essa astúcia é bem vista enquanto não dá errado.

  61. Numa configuração maquiavélica, isto é, enquanto pensarmos que os fins justificam os meios, é impossível aliar ética e política.

  62. Para Kant, se todos praticassem o imperativo categório, haveria paz.

  63. Não importa o que digam, é preciso praticar a justiça.

  64. O mundo não vai acabar se os maus sumirem.

  65. Existem máximas que só podem ser efetivadas em segredo. Então, você as pratica sem falar delas. É como meu colega machista. Hoje, ser machista é errado. Então, ele não fala publicamente que é. Age de forma machista sem falar disso nem deixar que isso transpareça publicamente. E, se transparecer, dá pra desdobrar.

  66. Se os políticos falassem abertamente todos os seus planos, ia ter rebelião o tempo todo!

  67. “O melhor governo” é uma discussão infindável. Mas a “melhor forma de governo” é uma questão resolvível. Em adição, uma pessoa que governa bem em uma forma de governo ruim pode obter bons resultados. Da mesma forma, um mau governante numa boa forma de governo não garante que o governo será bom.

  68. Se os governantes fossem escolhidos pela divindade, deveriam fazer um trabalho melhor e nunca algo digno de vergonha.

21 de fevereiro de 2017

A “Crítica do Juízo”, de Kant.

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“Crítica do Juízo” foi escrita por Kant. Abaixo, alguns pensamentos parafraseados encontrados nesse texto.

  1. Uma coisa pode ser um desperdício de bens e recursos e ainda assim ser uma coisa bela.

  2. Outros elementos além da beleza, e que trabalham com ela, influenciam no meu gosto.

  3. O gosto de alguém só se torna objeto de interesse em sociedade.

  4. O conceito de agradável é sempre pessoal.

  5. Embora beleza possa ser inconfundível, o gosto não pode ser censurado como se fosse logicamente errado e como se fosse possível se corrigir.

  6. Se alguém diz que algo é belo, está se pronunciando por todos.

  7. Uma pessoa de bom gosto aprecia a beleza sem necessitar que algo seja adicionado.

  8. É mais fácil ser belo aquilo que é simples, como as cores tomadas isoladamente.

  9. Nada de errado em utilizar atrativos pra realçar a beleza, mas tenha em mente que realçar a beleza não é aumentá-la.

  10. Se deve julgar a beleza por ela mesma, não pelos atrativos adicionados pra chamar atenção pra ela.

  11. Um filósofo e um vulgo podem se apoiar nos mesmos princípios, mas o filósofo conhece o princípio com mais clareza.

  12. A beleza de algo não tem nada a ver com sua função.

  13. É possível uma música sem letra ser bela.

  14. Não existe regra objetiva para determinar o que é belo.

  15. Não há modelo de beleza, mas há objetos belos.

  16. A imagem que exagera características de um modelo é uma caricatura.

  17. Dizer que algo é belo implica a intenção de que outros concordarão que esse algo é belo.

  18. A imaginação não pode ser “livre” e ao mesmo tempo estar em conformidade a uma lei.

  19. Se a imaginação obedece regras, então ela não está comprometida com o belo, e sim com o bom, sendo, portanto, uma fonte de moral, não de arte.

  20. Restringir a imaginação à regras coíbe o juízo com base no gosto.

  21. Se algo não foi feito pela imaginação e não parece representar nada, esse algo dá tédio de olhar.

  22. Uma boa arte é aquela para qual você sempre volta.

  23. O sublime (que causa prazer estético pela potência) é diferente do belo (que causa prazer estético pela harmonia).

  24. Os objetos sublimes (tornado, erupção vulcânica, uma detonação e outros eventos violentos) podem ser mortais.

  25. A beleza pode ser realçada por atrativos.

  26. O sublime é violento.

  27. Há dois tipos de sublime: matemático e dinâmico.

  28. O sublime é absolutamente grande, invocando a ideia de algo sem comparação.

  29. O sublime é um sentimento em nós, não é uma propriedade do objeto sublime (que é sublime no sentido de que ele causa essa sensação).

  30. O sublime nos faz perceber como somos pequenos diante de algo.

  31. Algo é anormalmente grande quando sua grandeza trabalha contra sua natureza.

  32. Não há razão pra crer que o universo é finito.

  33. A sensação de sublime pode advir de objetos que normalmente causam medo.

  34. A estética tem sua função formativa.

  35. Entusiasmo difere de exaltação porque a exaltação é doentia e embaraçosa.

  36. Se isolar por aprimoramento pessoal é diferente de se isolar por ódio ou por timidez.

  37. Algumas pessoas se isolam porque não querem odiar os outros.

  38. Deleite e dor nem sempre são corporais.

  39. Você não deveria dizer que “gosta” de algo só porque todo o mundo gosta.

  40. Não é possível forçar alguém a gostar de alguma coisa.

  41. Dizer que você escreveu um trabalho aclamado pela crítica não garante que eu vá ler e gostar.

  42. Julgar uma sensação implica critérios pessoais intransferíveis.

  43. É ridículo dizer que alguém que tem um gosto diferente do seu tem mau gosto.

  44. Não dá pra fazer uma regra objetiva do gosto.

  45. A arte não dá conceitos, mas mostra exemplos.

  46. Você não pode dizer “é ruim porque eu não gosto”.

  47. Para algo ser universalmente aceito como prazeroso, é preciso que os sentidos de todo o mundo fossem iguais e que todos estivessem em contato com o mesmo objeto ou com um objeto exatamente idêntico.

  48. Preconceito leva ao prejuízo.

  49. Preconceito é um juízo provisório tomado como princípio.

  50. Se o ser humano é um animal social e o gosto é um atributo social, então todos os seres humanos têm gosto.

  51. O gosto só se manifesta externamente se estivermos em sociedade.

  52. Uma inclinação passa a ser admirável na medida em que é publicamente aceita.

  53. As pessoas com sensibilidade à beleza são frequentemente vistas com bons olhos.

  54. Se uma pessoa admira uma flor artificial pensando que é natural e depois descobre que não é natural, pode ser que ela admire a flor de outra forma, como uma bela imitação bem executada.

  55. As cores do arco-íris: sublime vermelho, audaz laranja, franco amarelo, amável verde, modesto azul, constante anil, tenro violeta.

  56. O branco seria a inocência.

  57. Arte é qualquer técnica pra produzir algo que a natureza não produz sozinha.

  58. A arte precisa ser produto da liberdade, sendo a liberdade uma consequência da razão.

  59. Arte não é ciência.

  60. Se você produz algo por dinheiro, está desempenhando um ofício.

  61. Não se faz ciência da arte, mas crítica de arte.

  62. A ciência sem arte é inútil.

  63. A função da arte como arte estética é dar prazer estético.

  64. Algumas músicas só servem mesmo pra eliminar o silêncio das festas.

  65. “Gênio” é uma disposição do ânimo, caracterizada por grande originalidade artística, que não parece ser adquirida (talento natural).

  66. O gênio é o professor, os outros são alunos.

  67. O gênio é uma força da natureza.

  68. Para ser considerado gênio, a pessoa deve ser capaz de originalidade.

  69. Se você não tiver originalidade, aprender a desenhar, escrever ou compor não vai te tornar um bom desenhista, escritor ou músico.

  70. Não é possível ensinar a ter inspiração.

  71. Todas as artes visam um fim.

  72. Um artista genial, mesmo sendo original, não precisa prescindir de todas as regras da arte pra assegurar sua originalidade.

  73. Não é preciso ser artista pra apreciar arte.

  74. A arte pode representar de maneira agradável coisas que são horríveis na natureza.

  75. A arte pode representar coisas abstratas (a guerra, por exemplo) como se fosse físicas (um anjo de vermelho usando uma espada).

  76. Faz parte da habilidade artística exprimir conceitos (ideias) de maneira inusitada.

  77. O artista pode aprender de outros, bem como pode aprender da natureza.

  78. O artista, enquanto trabalha sua arte, utiliza seu gênio e também seu gosto, para que ele possa saber se está ficando agradável ou não.

  79. É possível gostar do que não é belo.

  80. É possível que alguém produza algo que é agradável sem ser original, bem como é possível fazer algo original e desagradável.

  81. Uma bela arte precisa de “espírito”, isto é, precisa ser capaz de incitar emoções.

  82. O gênio funda uma escola de arte, mesmo que não seja uma instituição com prédio e mensalidade.

  83. Mas o aluno precisa ter alguma originalidade.

  84. Quatro habilidades são necessárias às belas artes: imaginação, entendimento, espírito e gosto.

  85. Uma pessoa de visão perfeitamente sadia pode não ver o que o outro vê em um quadro.

  86. Continuando sua referência a Sexto Empírico, Kant diz que a oratória, como arte de convencer, não é adequada aos tribunais e nem às igrejas, porque falar bem não é sinônimo de ter razão.

  87. A oratória, como arte de convencer, nos torna aptos a tirar proveito dos outros.

  88. Mesmo quando visa bons fins, a retórica ainda é um truque sujo.

  89. A retórica pretende tornar um ponto de vista mais aceito cutucando as emoções do ouvinte, para que ele não raciocine como devia sobre o que está sendo dito.

  90. A matemática, na música, tem a função de fazer as partes (melodia, ritmo e pulso) concordarem entre si.

  91. Se você não quer ser influenciado por uma pintura, basta olhar em outra direção ou fechar os olhos, mas fugir da música é mais difícil.

  92. Mais difícil de escapar da música é escapar de um perfume.

  93. Existem prazeres que desagradam e dores que agradam.

  94. Uma boa piada é absurda.

  95. Uma piada pode ser ainda mais engraçada se não for contada como uma piada, mas com seriedade.

  96. Três coisas que tornam a vida tolerável: o sono, a esperança e o riso.

  97. Não dá pra fazer ciência do nosso próprio gosto.

  98. Descrever não é demonstrar.

  99. Há três faculdades do conhecimento: entendimento, razão e juízo, as quais podem chegar à conclusões diferentes.

  100. Não é possível fazer ciência da beleza.

  101. A sociedade perfeita só é possível se os filósofos conseguirem se comunicar com os leigos.

  102. A admiração não diminui com o tempo. Já a estupefação só ocorre enquanto há novidade.

  103. “Sentimentalismo” é a tendência a experimentar emoções ternas com mais frequência ou intensidade, mesmo quando não há realmente um objeto que as incite.

  104. O que diferencia a religião da superstição é que na religião há medo, mas também há admiração pela divindade.

  105. Pra saber se algo é bom, é preciso conceito, saber o que a coisa é, mas para saber se algo é belo, não há necessidade de conceito, basta ver, ouvir, sentir.

  106. Bom não é agradável.

  107. Gostar de todos é gostar de nenhum.

  108. Quem está faminto come qualquer coisa.

  109. Por causa disso, só é possível ter “gosto” (preferência) quando não estamos passando necessidade.

  110. Querer e estar interessado são a mesma coisa.

12 de fevereiro de 2017

O que aprendi lendo “Metafísica dos Costumes”.

Metafísica dos Costumes” foi escrita por Immanuel Kant. Abaixo, o que aprendi lendo esse livro.

  1. Este livro é uma continuação da Crítica da Razão Prática.
  2. Os livros de filosofia são frequentemente acusados de serem complicados de propósito, só pra parecer que o autor é mais inteligente do que na verdade é.

  3. Todos os autores de filosofia deveriam escrever de um jeito que os que não são filósofos possam entender.

  4. Muitas vezes, o processo filosófico não pode ser popularizado, por requerer uma linguagem que está distante do vulgo, mas isso não quer dizer que os resultados da reflexão ou da pesquisa não possam ser oferecidos em linguagem leiga na conclusão.

  5. Popularizar um texto que não foi escrito por mim abre espaço para que eu possa torcer o significado original do texto.

  6. Se considerarmos a filosofia como um corpo de conhecimentos filosóficos, então existem várias filosofias, cada uma dando sua contribuição ao pensamento moderno.

  7. Mas se consideramos a filosofia como um conhecimento só, então há um processo que se aperfeiçoa e se purifica ao longo do tempo.

  8. Então, não podemos dizer que a filosofia anterior não tem importância: ela serviu como meio de aperfeiçoamento e purificação que possibilita o estado atual do pensamento filosófico.

  9. Uma obra de filosofia ou de ciência, então, nunca é totalmente sua: ela foi construída sobre uma bagagem cultural que você tem e que foi adquirida com o estudo de outros autores, seja através de professores ou de livros.

  10. Existem leis que não precisam ser promulgadas.

  11. É lícito universalizar a experiência, mas é preciso estar pronto pra quando sua universalidade for desmentida.

  12. Uma lei desnecessária deve deixar de ser lei.

  13. A ética é experimental.

  14. O caminho pra felicidade individual passa pela experiência íntima do indivíduo.

  15. Assim, o que traz felicidade a um pode não trazer ao outro.

  16. “Concupiscência” é o desejo que pode ser transformado em ato, mas que ainda não foi transformado em ato.

  17. “Livre arbítrio” é a escolha feita com base na razão somente: se eu faço algo movido por forte emoção, podemos dizer que fiz sem querer.

  18. O arbítrio humano nem sempre é livre, mas nunca é animal.

  19. “Lei moral” diz respeito ao uso da nossa liberdade.

  20. “Lei jurídica” diz respeito somente aos atos externos.

  21. O conceito de dever deriva do de obrigação, o qual, por sua vez, deriva seguramente do imperativo categórico: eu sou obrigado, pelo sentimento moral, a agir de um jeito que beneficiaria todos, se todos adotassem meu comportamento.

  22. Obrigação é uma necessidade moral, que deve ser preenchida com um ato livre: eu posso ser obrigado a uma coisa e ainda assim recusar.

  23. “Imperativo” é uma regra que dá caráter de necessidade a algo que antes não tinha esse caráter.

  24. “Dever” é algo que sou obrigado a fazer, ou seja, uma ação específica, particular, que visa preencher a necessidade moral enunciada pela obrigação, que por sua vez se sustenta no imperativo categórico.

  25. Se algo não é proibido, é automaticamente permitido.

  26. Se algo é permitido, é moralmente indiferente.

  27. Uma “pessoa” é um sujeito responsável por suas ações, que é capaz de livre-arbítrio.

  28. O contrário de “pessoa” é “coisa”.

  29. Uma ação que contradiz o dever é chamada “transgressão”.

  30. Quem transgride é sempre culpado, mas quem transgride sabendo que o que ele faz é errado, esse é criminoso.

  31. A lei natural precede à positiva.

  32. É imoral a máxima (regra de conduta pessoal) que não leve em conta a universalidade: eu devo agir como se todo o mundo fosse agir como eu, como se eu estivesse o tempo todo dando exemplo.

  33. Máximas procedem da escolha, mas leis partem de outra fonte.

  34. Um imperativo categórico é um comando.

  35. Não é estranho que se punam os maus, mas não se recompensem os bons?

  36. A lei ética é a que deixa seu objetivo claro.

  37. Se você cumpre seus deveres, só está fazendo sua obrigação.

  38. Honrar os compromissos mesmo quando não há risco de punição por desconsiderá-los ainda é um ato de virtude.

  39. A doutrina do direito é a soma de todas as leis que podem se manifestar externamente.

  40. Uma ação é justa se não fere a liberdade de ninguém ao mesmo tempo que está de acordo com uma lei respeitada por todos.

  41. Um juiz não pode emitir uma decisão sem condições definidas: é preciso que haja dados sobre os quais ele possa pensar antes de emitir uma decisão.

  42. É lícito fazer violência a quem não me fez nada de mal?

  43. A lei não pode punir quem comete um crime a fim de se manter vivo: não há pena que a lei possa emitir que seja maior que a morte.

  44. As pessoas não são somente meio, mas sempre são também fim.

  45. Não cause prejuízo.

  46. Assegure sua propriedade sem tomar a do outro.

  47. O único direito inato é a liberdade, os outros direitos têm que ser adquiridos.

  48. Mentir é dizer falsidade de propósito.

  49. “Meu” é algo cujo uso está ligado a mim de tal forma que seu uso por outros, sem meu consentimento, me seria prejudicial.

  50. É possível possuir algo fisicamente (tendo o objeto) ou juridicamente (tendo direito ao objeto).

  51. Eu só posso dizer que algo é meu se ele permanece sendo meu (conforme nota 52) mesmo quando eu não estou em sua posse física.

  52. É possível que eu chame de “meu” um serviço prestado por outros.

  53. Se alguém já ocupa uma terra, invadi-la é lesar o ocupante.

  54. Um conhecimento empírico é sempre subjugado a espaço e tempo.

  55. Um objeto externo não é um objeto longe, mas um objeto distinto.

  56. É possível ser dono do que nunca se usará.

  57. Dizer que algo é meu implica dizer que ninguém pode usar aquele algo sem minha permissão.

  58. Você não pode ter o que já é de alguém, salvo no caso de a posse ser partilhada de comum acordo entre as partes.

  59. Mesmo que eu possua um ser humano como posse, eu não tenho direito de usá-lo como objeto, uma vez que todos os humanos que são meios precisam também ser fins.

  60. Quem adquire primeiro tem mais direito.

  61. A Terra é redonda, ainda bem; facilita os seres humanos a se encontrarem.

  62. Se a Terra fosse um plano infinito, as comunidades não se formariam.

  63. A terra desocupada é do primeiro ocupante que chegar lá.

  64. A posse definitiva só é possível graças às leis: no estado de natureza, uma posse minha pode ser subtraída a qualquer momento.

  65. Não se deve tomar a terra que já pertence a seus habitantes.

  66. Uma terra na qual não se pode viver é de todos.

  67. Cada ser humano é responsável pela humanidade.

  68. “Alienação” é a transferência de propriedade.

  69. Um contrato me garante uma promessa, não necessariamente a coisa prometida.

  70. “União sexual” é o uso recíproco dos corpos e das habilidades, uma espécie de acordo no qual um se servirá intimamente do corpo alheio.

  71. Não é possível adquirir o membro do outro sem adquirir seu corpo inteiro.

  72. Os casados têm posse dos bens materiais um do outro.

  73. Um casamento “de verdade” deve ser feito entre pessoas da mesma classe social, para evitar que a diferença de status dê ocasião à desigualdade no matrimônio.

  74. O simples romance, sem sexo, é amizade, não matrimônio.

  75. A criança é uma pessoa.

  76. O filho não pediu pra nascer: se nós trouxermos uma criança para uma vida ruim, nós somos criminosos.

  77. O filho deve ter dupla educação: pragmática (como sobreviver) e moral (como ser honesto).

  78. A maioridade só chega quando o filho é capaz de se sustentar sozinho.

  79. Dinheiro” é qualquer coisa que só tem valor quando é dada: com efeito, o valor do dinheiro só aparece quando o gastamos.

  80. Se tivermos muito dinheiro, mas não o gastarmos, é o mesmo que estarmos pobres.

  81. Toda a força de trabalho pode ser trocada por dinheiro.

  82. Quanto mais trabalho , mais dinheiro é posto em circulação.

  83. Para que o dinheiro funcione, ele deve ser difícil de obter.

  84. Um trabalho serve a outro trabalho, sendo esses trabalhos mediados pelo dinheiro.

  85. Conhecimento tem preço.

  86. Somente o dinheiro legal pode ser chamado de “moeda”.

  87. O autor fala por si, o editor fala pelo autor.

  88. Publicar um livro sem autorização põe em risco os lucros do editor legítimo.

  89. É possível ter mérito depois da morte.

  90. Se uma pessoa me empresta algo, mas não cobra seu retorno e nem vem buscar, o objeto passa a ser meu.

  91. Prove que algo é seu.

  92. Não se deve denegrir a imagem de alguém que está ausente e não pode se defender, a menos que se esteja completamente certo do que se está falando.

  93. Caluniar uma pessoa morta deve ser julgado pelo público e não por um tribunal.

  94. Antes de pedir algo emprestado você deve avisar ao dono que você será responsável (pela perda do objeto caso algo aconteça com o objeto emprestado).

  95. Antes de você emprestar algo, determine os termos de ressarcimento caso o objeto emprestado seja danificado ou perdido.

  96. Você não pode adquirir algo de alguém que não dono do objeto.

  97. Por causa disso, é errado comprar mercadoria roubada.

  98. Quem adquire mercadoria roubada sem saber não deveria ser punido.

  99. Eu deveria ser capaz de recuperar o que é meu mesmo que esteja longe.

  100. Estranho um povo jurar pelos mortos sem contudo acreditar em vida após a morte.

  101. Eu não posso ser obrigado a jurar.

  102. É possível usar a religião para torturar.

  103. O tribunal é a justiça de um país.

  104. Se eu tenho que viver junto dos outros, adotarei o estilo de vida da maioria.

  105. Uma constituição representa a vontade do povo e o mantém unido.

  106. Os três poderes que representam, ou melhor, deveriam representar a vontade geral: o soberano legislativo, os governantes executivos, os juízes do judiciário.

  107. O legislativo deve ser o próprio povo ou pessoas do povo escolhidas pelo povo.

  108. Se o poder executivo também legisla, temos um governo despótico.

  109. O executivo não tem poder de julgamento.

  110. Pra o criminoso ser justamente punido, é preciso que se assuma que ele fez aquilo de caso pensado ou que isso fique assim demonstrado: quem comete um crime sem querer não merece punição.

  111. Se o povo deixa de se interessar por religião, as posses clericais estão em risco.

  112. Se você não diz pra polícia o que você está fazendo quando esta lhe pergunta, você é automaticamente suspeito e passivo de prestar depoimento ao delegado ou juiz, sob pena de ser detido.

  113. A polícia não pode invadir minha casa, a menos que tenha ordem judicial pra isso.

  114. O dinheiro dos impostos deve sempre ir para serviços públicos.

  115. O estado pode forçar os ricos a arcar com as necessidades dos pobres.

  116. Assim nasce o imposto sobre propriedade e o imposto sobre atividade comercial.

  117. Se você jogar muito na loteria, você ficará pobre.

  118. Igreja não é religião: “igreja” é uma instituição cristã voltada para o culto público de Deus, mas religião vem de dentro, do espírito, é uma coisa pessoal, não necessariamente associada à igreja, templos ou locais especiais (João 4:20-24).

  119. Os humanos têm necessidade espiritual, o estado não pode banir uma religião sem causar revolta.

  120. Os impostos da igreja devem ser saldados com o dízimo.

  121. O senhor assume a guarda dos filhos dos servos junto com esses servos, isto é, a responsabilidade de mantê-los e educá-los.

  122. A justiça à venda é injusta.

  123. A punição pelo crime deve ser agravada pela posição social da pessoa: o presidente que comete crime deve ser mais severamente punido, já que ele está servindo de exemplo à nação o tempo todo.

  124. Se você rouba, você deixa implícito que não tem problema roubar, o que expõe você a ser roubado.

  125. Os cidadãos têm o direito de se mandar do país.

  126. Nada de errado em um senhor de terras chamar estrangeiros pra morar com ele.

  127. O senhor de terras pode banir um indivíduo de seu território, isto é, deportá-lo.

  128. Uma república genuína representa o povo: uma república que não representa o povo é ilegítima.

  129. A república ideal é aquela na qual o povo é soberano.

  130. Por que os presidentes não lutam na guerra?

  131. Para entrar em guerra, é preciso renunciar à paz primeiro.

  132. Onde há armas, a lei emudece.

  133. Num tratado de paz costuma rolar anistia.

  134. Depois de vencer uma guerra, se pode pilhar os bens públicos, mas não os bens particulares, isto é, os bens de cada súdito do governo vencido.

  135. Um adversário que falta contra o imperativo categórico é um adversário injusto. Numa guerra contra ele, não se deve usar meios injustos, mas se pode usar os meios justos em toda a sua extensão.

  136. A finalidade do direito é a paz perpétua.

  137. Colonizaram a América sob o pretexto de civilizar as pessoas do local e de mandar para lá os criminosos do país colonizador, na espera de que esses criminosos se tornassem melhores em solo americano. Isso não justifica a violência dos meios utilizados para tais objetivos.

  138. Se não consegues provar a positiva, podes tentar provar a negativa.

  139. Se não consegues provar nem a positiva e nem a negativa, podes tentar demonstrar que a pergunta é sem sentido.

  140. Não interessa se a paz é possível ou não; é preciso agir como se fosse. Trabalhar pela paz, mesmo que esta seja impossível, não vai deixar nosso mundo pior. Isto é, dependendo do meio usado pra obter a paz…

  141. Exemplos ilustram sem provar.

  142. Se incorporam conceitos metafísicos mesmo nas afirmações que visam utilidade prática. A metafísica é necessária.

  143. Mesmo que trabalhem e recebam salário, os filhos que não deixaram a casa dos pais ainda lhes devem obediência.

  144. Para Kant, os estupradores e os abusadores de menores devem ser punidos com a castração, enquanto que os que têm relações sexuais com animais devem ser punidos com banimento. E se quem abusa da criança for uma mulher? Kant cala sobre isso. Donde decorre que, em sua cabeça, abuso de menores é penetração com órgão genital. Logo, se não há penetração, não há crime de pederastia. Se a pederastia for algo além da penetração, a punição não pode ser castração, mas algo que também possa afetar uma mulher infratora.

  145. Uma injustiça que subsiste por muito tempo não se torna, por isso, direito.

  146. É melhor ter pouco dinheiro e alguma liberdade do que viver num lugar luxuoso sem liberdade nenhuma.

  147. A igreja deve ser subordinado ao estado também.

  148. A metafísica engloba um conjunto de conceitos racionais puros, isto é, tidos por corretos pela lógica, sem a necessidade de provas empíricas.

  149. O filósofo prático é aquele que usa a razão visando uma melhor ação prática, agregando a uma reflexão prática o conhecimento que for necessário.

  150. Kant nunca intencionou destruir a metafísica e frequentemente afirma sua necessidade.

  151. Será que eu tenho forças pra fazer o que me requerem?

  152. Dois objetivos que também são deveres: amor ao próximo e autoaperfeiçoamento.

  153. Aperfeiçoamento é pessoal: eu não posso aperfeiçoar outra pessoa (pense em todas as pessoas más que têm ótima educação).

  154. Felicidade é estar satisfeito com sua condição.

  155. Se eu quero manter minha integridade moral e só posso fazer isso se eu for feliz, então a felicidade deixa de ser fim, tornando-se meio.

  156. O amor-próprio implica o desejo de ser amado.

  157. Benevolência (boa vontade) não é o mesmo que beneficência (boa ação): você pode querer o bem pra uma pessoa sem fazer o bem a ela.

  158. Quando se diz que certa pessoa “não tem consciência”, se está querendo dizer que ela não presta atenção nas acusações que sua consciência faz: ela prefere ignorar essas acusações.

  159. Faça bem à humanidade, mesmo que ela não mereça, porque você tem o dever de zelar por ela.

  160. Assim, no futuro, a humanidade poderá ser digna de ser amada.

  161. Faça bem também a quem não ama.

  162. Praticando o bem mutuamente, o amor pode se seguir por consequência.

  163. Quando uma prova basta, não é necessário provar de outras maneiras.

  164. Ter virtude “além da medida” já é vício.

  165. A sabedoria, em sentido estrito, é prática: o filósofo cuja filosofia não tem implicação prática pode muito bem não estar interessado em sabedoria.

  166. É possível ser mais virtuoso do que o suficiente.

  167. O método dialogal é uma tentativa de trazer à consciência algo que já se sabe.

  168. Se eu chego à conclusão de que tenho uma responsabilidade inevitável, automaticamente estou me obrigando a ela.

  169. Um dever para comigo mesmo é automaticamente um dever para com toda a humanidade.

  170. Devo me aperfeiçoar além do ponto em que a natureza me colocou ao nascer.

  171. Eu devo preservar minha vida.

  172. Suicídio é homicídio.

  173. Eu não posso, por interesse, me livrar de uma parte saudável do meu corpo.

  174. Provar que a masturbação é errada é uma tarefa difícil, porque a masturbação não faz mal a ninguém.

  175. É possível guardar algo em seu coração e falar algo completamente oposto ao que se sente.

  176. Drogas só devem ser usadas em situação medicinal: usá-las por prazer é abuso.

  177. Um banquete é um convite formal ao excesso.

  178. “Mentira” é inverdade intencional: se você disse algo errado sem querer ou porque não sabia a verdade, você não mentiu, mas se equivocou.

  179. Não se deve fazer o bem através da mentira.

  180. O ser humano mente pra si mesmo, com frequência.

  181. A pessoa mente pra si mesmo ao professar algo em que não acredita por causa de uma possibilidade de ganhar algo com isso.

  182. Outro exemplo é eu dizer que eu, como cristão, amo as leis de Deus, quando na verdade só tenho medo de punição.

  183. “Avareza” é não gastar quando necessário.

  184. Não há meio-termo entre verdade e mentira.

  185. Ser mesquinho é ser pobre de propósito: de que serve o dinheiro se você não gasta?

  186. Se achar acima da lei é arrogância.

  187. Não é digno de um ser humano se curvar diante de outro ser humano, posto que são fundamentalmente iguais.

  188. Quem se faz de capacho deve ser pisado.

  189. A consciência é um fórum interior.

  190. É possível deixar de dar atenção à consciência, mas não se pode deixar de ouvir sua voz.

  191. O primeiro comando de todos os deveres para consigo mesmo: conhece-te a ti mesmo.

  192. Embora não haja relação de direitos e deveres entre seres humanos e seres não-humanos, o ser humano ainda tem, ao menos, deveres para com a natureza em geral, como um todo, devendo zelar pelas belezas naturais a fim de exercitar sua capacidade de amar e se abstendo da crueldade contra animais para preservar sua capacidade de sentir empatia.

  193. O animal deve ser recompensado por um trabalho bem-feito.

  194. O dever para com o animal é um dever para consigo próprio, pois auxilia no aprimoramento de sua humanidade, o qual tem repercussão no próprio trato entre humanos.

  195. Todo o mundo deveria ter uma religião.

  196. O ser humano tem obrigação de desenvolver suas capacidades.

  197. Mesmo que se esteja satisfeito com as habilidades que já se tem, é sempre útil melhorá-las ainda mais.

  198. Organize suas habilidades segundo seu objetivo.

  199. Ciência é teórica, sabedoria é prática.

  200. A educação física é tão importante quanto o estudo das ciências; o cientista, se não tiver corpo ou tiver um corpo que não é saudável, a ponto de não servir ao seu propósito, não pode colocar o conhecimento que tem em prática.

  201. Escolha como profissão aquilo em que você seria mais útil, ou seja, aquilo que você faz melhor.

  202. O aprimoramento deve ser direcionado ao objetivo que você persegue.

  203. Como nunca alcançaremos a perfeição, então sempre há como melhorar.

  204. Há dois tipos de deveres que mantemos com os outros: os que implicam obrigação mútua e os que não implicam.

  205. Amor e respeito não são a mesma coisa.

  206. “Filantropia” é amor a todos os seres humanos.

  207. “Misantropia” é o oposto, é o ódio a todos os seres humanos.

  208. “Egoísmo” é amor só a si mesmo e indiferença em relação aos outros.

  209. “Timidez” é a falta meios de expressão para o amor que se sente.

  210. Tenho que fazer aos outros o que eu quero que me seja feito.

  211. O princípio do amor se divide em: beneficência, gratidão e solidariedade.

  212. É preciso cuidar do próprio corpo.

  213. Quando você se sente bem com o bem-estar dos outros, você é benevolente.

  214. Quando você trabalha pelo bem-estar dos outros, você é beneficente.

  215. É raro encontrar alguém que faça do bem-estar dos outros o seu objetivo.

  216. Trabalhar pela felicidade dos necessitados é dever de todos.

  217. Se o outro está precisando, conceder-lhe um benefício não deve ser feito visando algo em troca.

  218. O limite da beneficência é o próprio prejuízo.

  219. Eu não posso ser beneficente ao outro impondo a ele meus próprios padrões de felicidade: eu tenho que saber o que torna a pessoa feliz e então fazer isso a ela.

  220. Uma pessoa é rica quando tem mais ou melhores meios do que necessita para alcançar seus objetivos.

  221. O governo pode ser injusto a ponto de tornar seus cidadãos pobres deliberadamente a fim de torná-los necessitados de sua beneficência.

  222. Se eu causo um prejuízo a alguém e depois o reparo, isso não é beneficência.

  223. Reconhecimento é um tipo de gratidão.

  224. Os antigos merecem respeito, mas isso não quer dizer que os novos sejam piores.

  225. É mais fácil fazer o bem se o mal incomoda.

  226. Os vícios que trabalham contra o amor: inveja, ingratidão, malícia.

  227. A inveja que não se manifesta externamente é chamada “ciúme”.

  228. A inveja é o mal-estar ao ver os outros se dando bem.

  229. Inveja só ocorre em pessoas insatisfeitas com a própria condição.

  230. Malícia é se contentar com o mal-estar dos outros.

  231. Se algo ocorre a algum ser humano, é de nosso interesse.

  232. Um tipo de malícia é o desejo de vingança.

  233. Na medida em que vingança é uma aplicação da minha própria visão do que é justo, ela não é justa, porquanto algo só pode ser justo se for para todos.

  234. No final das contas, justiça perfeita é só a de Deus.

  235. Nenhuma punição deve ser feita de cabeça quente; a raiva nos leva a punir em excesso, ou seja, a cometer abuso.

  236. Um crime que tornaria a natureza humana detestável é o que chamamos de “inumano”.

  237. O ser humano está entre o anjo e o animal, mas isso não o torna um híbrido dos dois.

  238. Tudo tem valor, mesmo que tal valor seja negativo.

  239. Um ser humano deve se tratar como humano e aos outros humanos como humanos que são.

  240. É imoral tratar um ser humano como se fosse menos que isso.

  241. Honra é respeito alheio: se te respeitam, você é honrado.

  242. Não se deve desprezar um ser humano por causa de uma de suas falhas, porque uma falha sozinha não torna ninguém uma má pessoa.

  243. Um “escândalo” é uma ofensa à honra acompanhada de mau exemplo.

  244. “Soberba” é querer que os outros se humilhem a nós.

  245. A soberba é contraprodutiva: quanto mais se exige respeito, menos os outros o respeitam.

  246. O respeito deve ser merecido antes de ser reivindicado.

  247. “Detratação” é tornar público um defeito particular, causando escândalo, isto é, fofoca.

  248. Não precisa fofocar pra estar errado, basta querer saber da vida alheia.

  249. “Escárnio” ou “zombaria” é transformar as falhas de alguém em objeto de riso, diferindo de “gracejo”, que é transformar as qualidades em objeto de riso.

  250. “Amizade” é união de duas ou mais pessoas por amor e respeito mútuos.

  251. Amigos respeitam os limites um do outro: uma pessoa que te irrita ou te rebaixa de propósito não é sua amiga.

  252. É um ato de amor um amigo dizer, com tato, onde você está errado.

  253. O amigo de verdade continua lá pra você mesmo quando você passa necessidade.

  254. É de lascar quando uma pessoa briga com a outra só pra depois ter o prazer de se reconciliar com ela.

  255. Há uma necessidade de revelar nossos segredos, porque queremos ser aceitos.

  256. O amigo ouvirá seus segredos e não os revelará.

  257. Amigos bons são raros.

  258. Não se isole.

  259. A virtude deveria ser moda!

  260. Virtude não é inata.

  261. Existem duas formas de ensinar ciência: palestra (aula expositiva) e por questionamento (construindo o raciocínio por meio de perguntas lançadas à plateia).

  262. No modo de ensino por perguntas, há uma divisão: é possível perguntar à razão do aluno ou é possível perguntar à memória dele.

  263. Se perguntamos à razão, a aula torna-se diálogo.

  264. Para que uma aula dialogada entre razões funcione, é importante que o aluno também pergunte ao professor.

  265. O professor tem que dar bom exemplo porque crianças aprendem também imitando.

  266. Não diga pra alguém seguir o exemplo de outro; se você o fizer, essa pessoa terá inveja do exemplo que deveria seguir e não quererá segui-lo.

  267. Se o exemplo é bom, a pessoa o seguirá se tiver bom senso.

  268. Um coração “suficientemente bom” quer ao menos dividir sua felicidade com outros.

  269. Se o aluno não sabe a resposta, sugira uma.

5 de fevereiro de 2017

Rousseau encontra Temer.

O Contrato Social: como Rousseau veria a crise política brasileira se ele estivesse vivo e tivesse acesso à Internet.

RESUMO.

Através da leitura do Contrato Social de Rousseau, é possível fazer uma reflexão política sobre o governo Temer e sua relação com o conceito de vontade geral como soberana no estado político democrático. Levando em consideração as medidas antipopulares às quais Temer submeteu o Brasil, como a limitação dos gastos públicos e a reforma do ensino médio, chegamos à conclusão de que este governo se esforça para enganar a vontade geral para seguramente trabalhar contra ela. Mas a população responde, pois deve responder, embora ainda não tenha respondido à altura.

Palavras-chave: Rousseau. Contrato Social. Política. Brasil. Temer.

ABSTRACT.

Through a reading of Rousseau’s Social Contract, it’s possible to make reflection about Temer’s government and it’s relationship with the general will as sovereign in a democratic political state Taking in consideration the unpopular measures to which Temer submitted Brazil, such as limitation of public expenses and the high school reform, we arrive at the conclusion that this government gives effort to trick the general will to safely work against it. But the population responds, as it has to respond, even if it couldn’t respond with enough strength yet.

Keywords: Rousseau. Social Contract. Politics. Brazil. Temer.

1 INTRODUÇÃO.

Observando o desenvolvimento da obra O Contrato Social, de Jean Jacques Rousseau, é impossível não fazer paralelos entre o que lá está posto e a situação atual da política brasileira. Este governo vai mal, até para quem viveu fora do Brasil e que já está morto. Isso é especialmente grave porque, se estamos cometendo erros apontados por Rousseau na época dele, séculos antes do que acontece agora, então houve um retrocesso. Estamos cometendo erros que já foram cometidos há muito tempo e para os quais já se atentou. Em outras palavras, cometer erros que já foram anunciados por alguém que morreu faz mais de duzentos anos é irresponsabilidade.

2 A VONTADE GERAL COMO SOBERANA.

Para Rousseau, a vontade geral é a senhora do Estado. “Vontade geral” é um termo um tanto ambíguo, sendo frequentemente definido como aquilo que todos querem, excluindo os desejos conflitantes.1 Assim, o povo é senhor do Estado apenas naquilo em que todos concordam, uma vez que o povo, como um todo, incorpora também vontades que se contradizem. Estas são deixadas de fora.

Assim, o Estado deve ser guiado por aquilo que todos os membros do povo querem, como educação, saúde e segurança. Mas, quando não é possível obter consenso de todos sobre determinada questão, a vontade geral pode por vezes se manifestar na vontade majoritária.2 Assim, se aparentemente não há unanimidade sobre algo, é porque alguns particulares estão confundindo a vontade particular com a geral.

Dessa forma, verificamos que, para Rousseau, a vontade geral é soberana e o governo deveria se ordenar para obedecê-la. Se a vontade geral não se extrai fácil, ela pode se manifestar na vontade majoritária. É mais fácil obter consenso absoluto sobre objetivos (todos querem corte de gastos públicos), mas a decisão sobre os meios, sobre os quais o consenso é mais difícil obter, deveria ser tomada com base na decisão majoritária (a maioria não quer que esses cortes sejam feitos na educação e na saúde).3

2. 1 SE O GOVERNO NÃO HONRA OS COMPROMISSOS QUE TEM COM O POVO…

Assim como um grande arquiteto, antes de construir, observa e sonda o solo, para ver se este tem condições de sustentar o peso, o sábio instituidor não começa por redigir boas leis em si mesmas; mas examina anteriormente se o povo, ao qual são destinadas, está apto para as aceitar.4

O governo Temer tem se mostrado muito antipopular. Existe uma pesquisa do IBOPE que mostra que a maioria das pessoas realmente quer que os gastos públicos diminuam, mas a pergunta feita pela pesquisa não diz que esses cortes serão feitos através do congelamento de gastos com setores públicos cruciais.5 Portanto, a pesquisa não pode ser associada à atitude do governo de congelar gastos com educação e saúde, especialmente por um período que muito excede aquele que Temer passará no poder. Além do mais, um olhar sobre o sítio eletrônico e-Cidadania, no qual o texto da proposta de emenda constitucional está disponível na íntegra, mostra a rejeição da maioria.6 Logo, há uma pressão para corte de gastos, mas não pelo congelamento nesses setores.

Uma lei deveria levar em consideração a vontade geral. Porque a vontade geral, quando aprova uma lei, tem a si mesma em consideração, é uma lei que ela quer e que seguirá.7 Do contrário, o governo, que deveria zelar pela vontade geral (ou da maioria), se manifesta contra ela ao promulgar uma lei impopular. Para Rousseau, isso é clara prevalência de interesses particulares8 e sua marca é a alteração da Constituição.9 Isso nos leva ao impasse seguinte.

2.2 …O POVO NÃO PRECISA HONRAR SEUS COMPROMISSOS COM O GOVERNO.

Quando o governo se rebela contra seu soberano, isto é, a vontade geral, é preciso que o povo reprima o governo. Num Estado democrático como o nosso, isso é feito pela negação de serviço, ou seja, pela greve. Negando serviços ao Estado, fazemos nossa voz ser ouvida, infelizmente não como devia ser. Exemplos de greve são as de professores, servidores ligados à polícia, alunos, banqueiros e consumidores.10

Outra forma de protesto são as depredações e os atentados, atos claramente ilegais, mas justificáveis em Rousseau. Com efeito, se o governo se mostra contra o povo, que apreço posso ter por suas leis?

2.2.1 Manifestações violentas.

Tão logo se encontre a multidão reunida num corpo, não se pode ofender um dos membros sem atacar o corpo, menos ainda ofender o corpo sem que os membros disso se ressintam.11

Sendo assim, manifestações violentas estão fadadas a acontecer, é um reflexo natural quando a população reconhece o governo como seu inimigo. Esse tipo de manifestação é um extremo, ela só acontece quando a relação entre população e governo está prestes a tornar-se insustentável. Então, quando elas começam a acontecer, a pauta reivindicada deveria ser tratada como urgente.

Antigamente, as revoluções começavam assim. No Brasil, isso seria difícil, porque uma revolução implica armas e nossa população é majoritariamente desarmada. Mas isso não significa que a população não possa confeccionar armas caseiras.12 Numa configuração democrática, o diálogo seria o caminho perfeito, mas a situação pode degenerar à tirania se o governo responde com mais violência ou dissolução se o governo perde o controle da situação.13

3 SOBRE GOVERNOS ILEGÍTIMOS.

Rousseau enumera algumas ocasiões em que a tomada de poder pode acontecer. Para ele, é tirano qualquer um que usurpa o poder existente e ignora a vontade geral, mas é tirano e déspota quem faz isso e se põe acima das leis.14 Suponhamos que o que aconteceu com Dilma foi um golpe branco, executivo e midiático.15 Se assim o fosse, Temer, que teria assumido por via ilegítima, seria ao mesmo tempo tirano e déspota, pois o golpe teria ocorrido numa situação democrática fora da lei. Alguém pode argumentar que a vontade geral, sendo soberana, faz bem não importa o que decida, e o povo apoiou a saída de Dilma. Mas Rousseau adverte que a vontade geral não é infalível.16 Na verdade, o povo, se fosse enganado, quereria o seu mal pensando ser o bem.17 Para que a vontade geral se equivoque menos, é preciso não tomar partido de um grupo. Se você, ao se tornar parte de um grupo, vota por esse grupo, em vez de por si mesmo, seu voto está condicionado à visão de um grupo, que pode estar contra a vontade geral (aquilo que todos querem) e a favor de uma vontade particular (aquilo que o grupo quer).

Logo, cada um deve votar tendo sua vida como critério de votação e não o ponto de vista de outra pessoa que não vive o que você vive.18 Por exemplo, suponhamos que você use como critério de voto o noticiário. Ora, mas o noticiário tem uma visão carioca do Brasil, ele não fala do seu estado se não por uma visão carioca. Ele não fala especificamente da sua vida e pode muito bem estar manipulando informação. Logo, você, ao usar o noticiário carioca como critério, é levado a votar segundo interesses cariocas. Mas se você votasse usando somente sua vida como critério, a vontade geral apareceria mais facilmente. Quando um grupo (a mídia, neste caso) consegue adquirir um grande número de partidários, ela pode fazer valer o seu interesse particular, pois quem decide numa democracia é a maioria e ela está conseguindo fazer a maioria concordar com ela. Você passa a votar não pelo Brasil que você quer, mas pelo que a mídia quer.

A usurpação de poder não necessariamente é ruim, mas passa a ser se a vontade geral é ignorada pelo governante ilegítimo. Assim, se assumimos que a saída de Dilma foi golpe, este governo, o qual tem se mostrado fechado ao diálogo, aprovando medidas antipopulares, é tirano e déspota.

4 OS PROBLEMAS DO GOVERNO DEMOCRÁTICO REPRESENTATIVO.

Numa cidade, bem dirigida, todos votam nas assembleias; sob um mau governo, ninguém aprecia dar um passo para isso fazer, porque ninguém se toma de interesse pelo que se faz, prevendo que a vontade geral não prevalecerá, e porque, enfim, os cuidados particulares tudo absorvem.19

Rousseau também vê problemas no sistema democrático como ele está, principalmente no que diz respeito à classe dos deputados. Numa Europa majoritariamente monárquica, o assunto da democracia era tratado enfaticamente, porque o ganho de força dessa forma de governo era novidade.

No Contrato Social, a classe dos deputados é definida como o conjunto dos representantes do povo nas deliberações políticas. Mas ele aponta logo a contradição que aí existe: o deputado quase nunca representa o povo. Aliás, o deputado sempre representa a si mesmo.20 Se ele diz representar o povo, age segundo a ideia que ele faz de povo, que não é a mesma ideia que o povo faz de si mesmo, uma vez que o deputado está a salvo de muitas vicissitudes que afligem a população.

Para Rousseau, o povo pode representar a si mesmo. A classe dos deputados deve ser extinta. Numa configuração brasileira, talvez fosse possível permitir que o povo votasse leis, fazendo parte do executivo, pela Internet, como se participasse daquelas votações que ocorrem no sítio do Senado, nas quais os visitantes se posicionam favoráveis ou contra as medidas e leis que são disponibilizadas para leitura.21 Como isso só seria possível se a Câmara dos Deputados aprovasse, o sistema democrático nunca se recuperará dela. Pois, se a classe dos deputados é nefasta para Rousseau e se ela teria que aprovar sua própria extinção, então Rousseau concluiria que o sistema democrático está quebrado além do ponto em que se pode ter qualquer esperança de reparo.

5 COMO SABER SE O GOVERNO VAI BEM.

Na suposição de um golpe, Temer é um déspota. Mas será que o governo vai bem apesar disso? Para Rousseau, como essa é uma questão altamente subjetiva, precisamos juntar, dentre todos os critérios, alguns elementos que perpassam todos ou a maioria. Rousseau identifica elementos como multiplicação populacional e prosperidade (tranquilidade). Se o povo cresce e cresce tranquilamente, então vai bem.22

Mas por que esses critérios? Levando em consideração que, na época de Rousseau, havia um grande interesse em multiplicação, porque se vivia menos tempo, faz sentido que a multiplicação do povo seja uma prioridade estatal. Hoje, com os recursos desaparecendo rapidamente, há uma pressão contrária: controle de natalidade. Por causa disso, nós avaliaremos o governo com base apenas no outro critério, que é o de tranquilidade.

A inadimplência é a maior em décadas.23 Tanto particulares quanto empresas estão em dívida e fechando. Isso é agravado pelo crescente desemprego24 e pela tensão entre facções criminosas que operam com tribunais próprios nos presídios, o que requer posicionamento imediato.25 Se um governo é medido pelo seu grau de tranquilidade, este é o pior em muito tempo. As manifestações sociais são unânimes ao pedir a saída de Temer.

6 CONCLUSÃO.

Levando em consideração a prosperidade, a desaprovação pública, a mudança forçada em setores cruciais e, se admitimos que houve um golpe, a forma como Temer subiu ao poder, Rousseau reprovaria este governo. Na verdade, pondo as coisas nestes termos, até parece um governo ridículo.

Para não ser injusto, o governo Temer até que fez algumas coisas boas em meio à confusão e à bagunça, mas elas não saldam o prejuízo causado em termos humanos. Um país não se faz só de economia, que parece ser a prioridade de Temer, e mesmo na economia as coisas não vão muito bem.

REFERÊNCIAS.

ABDALA, V. Taxa de desemprego fica em 11,8% em outubro com 12 milhões de desocupados. Disponível em: <https://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/brasil/2016/11/29/taxa-de-desemprego-fica-em-118-em-outubro-com-12-milhoes-de-desocupados.htm>. Acessado em: 22/01/17.

AGÊNCIA BRASIL. Ibope: 72% aprovam reforma do ensino médio e 59% são a favor da PEC do Teto. Disponível em: <http://www.blogdobrother.com/2016/11/ibope-72-aprovam-reforma-do-ensino.html>. Acessado em: 22/01/17.

AZEVEDO, G. ; RAMALHOSO, W. UOL Confere: Governo Temer distorce dados econômicos em propaganda de 120 dias. Disponível em: <https://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/brasil/2017/01/05/uol-confere-governo-temer-distorce-dados-economicos-em-propaganda.htm>. Acessado em: 22/01/17.

EL PAÍS. PEC 55: só 33% dizem conhecer texto, aprovado pelo Senado. Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2016/12/12/politica/1481569650_222836.html>. Acessado em: 22/01/17.

ESTADÃO. Temer: Organizações criminosas promovem ‘pavorosa matança’ com ‘códigos próprios’. Disponível em: <https://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/brasil/2017/01/11/temer-organizacoes-criminosas-promovem-pavorosa-matanca-com-codigos-proprios.htm>. Acessado em: 22/01/17.

ROUSSEAU, J. J. O Contrato Social. Tradução de Rolando Roque da Silva. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/contratosocial.pdf>. Acessado em: 22/01/17.

SENADO FEDERAL. Consulta Pública – PEC 55/2016. Disponível em: <http://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=127337>. Acessado em: 22/01/17.

1O Contrato Social, livro II, capítulo III, página 41.

2O Contrato Social, livro I, capítulo VII, página 29.

3Para um panorama mais preciso desse cenário, uma pesquisa aponta que 59% dos brasileiros são a favor de limitar os gastos do governo federal, conforme diz o Blog do Brother (http://www.blogdobrother.com/2016/11/ibope-72-aprovam-reforma-do-ensino.html). Enquanto que muitos ligam essa informação à PEC 55, apenas 33% afirmam conhecer o texto da PEC, segundo o El País (http://brasil.elpais.com/brasil/2016/12/12/politica/1481569650_222836.html). Além do mais, a pergunta feita pelo MEC através do IBOPE não especifica quais limitações seriam feitas, mas os movimentos sociais deixam patente que esses congelamentos não deveriam ter sido feitos na educação e na saúde. Logo, o resultado da pesquisa não tem nexo necessário com a atitude do governo de congelar gastos nessas áreas, pois os que estavam a par da mudança não gostavam dela, enquanto a maioria ignorava os detalhes.

4O Contrato Social, livro II, capítulo VIII, página 61-62.

5Blog do Brother, .

7O Contrato Social, livro II, capítulo VI, página 53.

8Sobre como interesses particulares podem desestabilizar gravemente o governo, basta que se lembre do que aconteceu com Geddel.

9O Contrato Social, livro III, capítulo X, página 119.

11O Contrato Social, livro I, capítulo VII, página 28.

12Novamente, isso é ilegal, mas, numa situação extrema, é preciso imaginar o cenário de quebra em massa de leis para propósitos de especulação.

13O Contrato Social, livro III, capítulo I, página 81.

14O Contrato Social, livro III, capítulo X, página 121.

15Digo “suponhamos” porque não há consenso e não é meu objetivo fazer um artigo só com minha opinião.

16O Contrato Social, livro II, capítulo III, página 40.

17O Contrato Social, livro II, capítulo III, página 41.

18O Contrato Social, livro II, capítulo III, página 42.

19O Contrato Social, livro III, capítulo XV, página 130.

20O Contrato Social, livro III, capítulo XV, página 131.

21De um ponto de vista mais técnico, a coisa poderia funcionar mais ou menos da seguinte maneira: cada indivíduo tem uma conta de usuário, cada conta só pode votar uma vez em cada lei. O sítio só pode ser acessado por um endereço brasileiro, o que requereria um levantamento de dados junto aos provedores. Após acessado, criar uma conta requereria um cadastro de pessoa física. Quando o CPF fosse inserido, o sistema perguntaria de quem é aquele CPF. Assim, o indivíduo, além de colocar o CPF, precisaria colocar seu nome completo, conforme consta no registo da Receita Federal, letra por letra. Depois de obter essas duas informações, o sítio verificaria se aquele nome está realmente ligado àquele CPF através do banco de dados da Receita Federal (a Plataforma Lattes, do CNPq, é capaz disso), a propósito de verificação. Assim, se eu soubesse um CPF, mas não o nome ligado ao CPF, ou vice-versa, a criação da conta seria inviabilizada. Isso serve para evitar que pessoas façam múltiplas contas utilizando CPFs aleatórios. Mesmo depois de criada a conta, só se poderia votar numa lei através de um endereço de protocolo de Internet brasileiro, para evitar que pessoas de fora do país, ao obter controle sobre a conta de algum brasileiro, pudessem votar, o que seria uma violação da nossa democracia. Para evitar esse tipo de abuso, um IP pode votar apenas uma vez em cada lei. As limitações práticas disso é que não é possível ao brasileiro votar se estiver no exterior e não seria possível, mesmo com contas diferentes, votar a partir de um mesmo computador. Nenhum membro do executivo, fora o povo, que estaria na qualidade de executivo, pode votar nesta etapa. A lei ficaria disponível para votação por um mês e, quando o período de votação acabasse, a lei prosseguiria ao Senado se a maioria dos votos fosse favorável a isso. Se um membro do executivo (fora o povo) interfere, se um computador brasileiro fornece contas e endereços IP para pessoas do exterior votarem em leis brasileiras, se o sistema é invadido e adulterado ou abusado de alguma forma, todos os envolvidos em território nacional devem ser punidos por crime hediondo. Os administradores do sistema seria escolhidos por concurso público. Se a classe dos deputados não fosse extinta por isso, este sistema poderia pelo menos representar um passo adicional antes da aprovação, com o povo votando e, se favorável, passando a lei à Câmara e, da Câmara, ao Senado.

22O Contrato Social, livro III, capítulo IX, página 118-119.

23“Os números da economia são muito ruins: 60 milhões de brasileiros e 4 milhões de empresas estão inadimplentes. Isso nunca aconteceu no país.”, diz Paulo Felmann (https://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/brasil/2017/01/05/uol-confere-governo-temer-distorce-dados-economicos-em-propaganda.htm)