Anotações sobre a essência do cristianismo.

  1. Os animais não têm religião. Mas têm consciência, em sentido mais geral.

  2. A consciência animal é individual, enquanto a consciência humana é genérica. Esse tipo de consciência, que permite generalizações, permite a ciência. Não basta saber pra mim mesmo, eu quero um conhecimento que sirva sempre, em todo o lugar, pra todos.

  3. Nos animais, vida interior e exterior são uma coisa só, diz Feuerbach. Mas, no caso dos humanos, a vida interior e a exterior são separadas.

  4. Somente o ser humano fala sozinho.

  5. O ser humano, por essa generalização (“somos todos homens” ou “somos todos desta classe”), pode se colocar no lugar do outro.

  6. Para Feuerbach, a religião é um meio de conhecer a si mesmo. Ele diz que o objeto da religião é a própria pessoa. Quem for cristão e se sente desconfortável lendo sobre ateísmo, deve parar agora.

  7. A limitação do ser (nós) é a limitação de nossa consciência. Nós somos finitos. É por isso que somos incapazes de conhecer Deus pela simples razão, porque Deus é infinito. É preciso revelação, se o que se quer é ser religioso.

  8. Um ser humano completo tem três coisas: pensamento, vontade e sentimento. Ou, dito de outra forma, conhecimento, caráter e amor.

  9. Razão, amor e vontade são as três maiores e mais importantes características humanas.

  10. Essas coisas estão em nós, mas de onde vêm?

  11. O ser humano não existe sem essas coisas. O ser humano que não pensa, não ama ou não deseja não é ser humano. É outro tipo de criatura.

  12. Se o ser humano é um animal com consciência, então a consciência não é a única coisa que o distingue do animal, ao menos fora do primeiro momento, porque a consciência opera uma mudança qualitativa no ser por completo. Quem tem consciência, terá outras qualidades que os desprovidos dela não têm. Assim, se há consciência, a diferença gradualmente se expande, outras diferenças vêm a surgir.

  13. Mas será que ter consciência é realmente sempre vantajoso? Pra mim, sim. Pra Feuerbach, não necessariamente, já que ele diz que a falta dessa consciência em sentido estrito, consciência genérica, não diminui o animal.

  14. Quem tem razão, amor ou desejo nunca se liberta dessas coisas. Elas são mais fortes que nós. Não é possível deixar de pensar, amar ou desejar.

  15. A música é o idioma dos sentimentos. O sentimento do compositor fala ao do ouvinte. Rousseau poderia concordar.

  16. É o homem que possui o amor ou o contrário?

  17. Se o homem é quem possui o amor, como se explica a morte por amor? Afinal, todos queremos nosso próprio bem-estar. Se uma pessoa não faz segundo o que é necessário ao seu bem-estar, está sofrendo coação. Mas que coação gostosinha…

  18. E quanto ao estudioso que esquece de si mesmo pra permanecer raciocinando, esquecendo de dormir ou comer?

  19. E quanto ao jejum, que é uma afirmação da força de vontade, de um desejo escolhido sobre outro imposto? O que leva um ser humano a passar tanto tempo sem comer, sem necessidade disso?

  20. O que acontece na religião é que o ser humano tira essas qualidades de si (alavancado pela sensação de que essas qualidades lhe são incutidas por alguém sobrenatural, pois o sobrepujam), as eleva ao grau infinito e a atribui a seres especulados. Pode ser um pra cada qualidade (politeísmo) ou um só para todas (monoteísmo). Parece uma afirmação gratuita.

  21. Para Feuerbach, a distinção entre corpo e “eu”, como se “eu” fosse uma substância que faz uso do corpo, ou “eu” e emoção, como se a emoção atrapalhasse o “eu” no que ele quer fazer, não está suficientemente provada. Para Feuerbach, o ser humano é o conjunto completo, não uma parte dele.

  22. O ser humano é estranho: atribui um valor existencial a coisas aleatórias, porque sua afinidade intelectual com essas coisas lhe desperta sentimentos de profunda afeição. É assim que alguns povos adoravam os astros, como sol, ou mesmo coisas cuja a presença não faz diferença em sua vida. Eu, por exemplo, acreditava que as minhas cartas de baralho eram seres vivos, que pensavam e sentiam. Eu era extremamente apegado ao meu baralho de cartas. Minha mãe achava minha obsessão infantil risível.

  23. Amar o gênero humano, tudo bem. Mas amar só a si é vaidade.

  24. Se algo existe, merece ser conhecido.

  25. Se algo existe, tem valor.

  26. Somos humanos, mas isso não quer dizer que somos todos iguais. Então eu não preciso atribuir aos outros falhas que são minhas como se todos necessariamente as tivessem.

  27. Atribuir a todo o mundo uma limitação que você percebe em si mesmo é uma tentativa de se sentir menos humilhado. Dependendo da falha atribuída, é um ato de mentir pra si mesmo. Por exemplo: nossa sociedade é tão doida por sexo, que assumimos que o celibatário mente ou que os assexuais (pessoas que não sentem atração nem por homens e nem por mulheres) não existem de verdade.

  28. Outro exemplo é supor que ninguém pode conhecer o que não consigo conhecer. Isso é especialmente perigoso, porque uma pessoa que contamina outra com esse pensamento acaba fazendo muitos desistirem de tentar.

  29. Ao fazer isso, a pessoa está tentando se livrar da culpa, dizendo “não é que eu seja burro, é só que a inteligência humana só vai até aqui.” Ela não quer admitir sua incapacidade. É verdade que o ser humano só pode conhecer certas coisas (pois conhece pelos sentidos) e sobre outras só pode especular (pois pode ir além dos sentidos pela razão), mas é interessante que todos tentem, mesmo que alguém diga que é impossível. É assim que a ciência avança. Só tentando se pode dizer se é realmente impossível.

  30. Da mesma forma que não se pode dizer que algo é finito sem ver as bordas, algo infinito pra nós, humanos, pode ser finito pra outros seres.

  31. A pessoa é descrita por suas qualidades, não por suas faltas. Se fôssemos definir uma pessoa só pelo que ela não é, essa definição seria tão longa quanto pobre.

  32. Um ser que se reconhece limitado, isso é, com limitações insuperáveis, se acomoda com essas limitações. Talvez até viva melhor do que aquele que sempre quer se superar, especialmente se este tenta superar um limite que provavelmente não superará em seu tempo de vida.

  33. A inteligência é a área do ser consciente. Quanto mais você sabe, maior é seu mundo. O mundo dos ignorantes é pequeno.

  34. Para Feuerbach, o indivíduo é o próprio deus de seu mundo, isto é, da área da realidade que ele conhece. Isso implica dizer que o indivíduo só precisa do Deus com D maiúsculo se ele sentir que há coisas que ele não conhece. Nietzsche dirá, com seu anúncio da “morte de Deus”, que o progresso científico, quanto mais avança, mais torna a fé desnecessária. A cada geração, o número de crentes tende a diminuir. Ou, pelo menos, é como esses filósofos veem as coisas. Eu, por outro lado, só me tornei religioso por causa da filosofia.

  35. Cometer um erro e ver esse erro é prova de maior inteligência do que a daquele que comete o mesmo erro e não o vê.

  36. Filosofia é um tipo de monólogo. Os resultados da reflexão podem até ser anotados, publicados e debatidos, mas o processo é solitário.

  37. Só Deus pode compreender totalmente a si mesmo.

  38. O deus naturalmente concebível é puro sentimento. Se uma pessoa concebe um deus por outras vias, sua religião não é natural, isto é, ele não chegou a ela sozinho.

  39. Deuses concebidos assim, isto é, naturalmente, são uma egolatria sentimental: o sentimento adorando a si mesmo.

  40. Se o deus natural é puro sentimento, o ateu precisaria se livrar do sentimento pra continuar ateu, diz Feuerbach. Eu tenho minhas dúvidas, já que muitos dos meus colegas ateus são bastante sensíveis.

  41. Se não é possível negar totalmente o sentimento, não é possível um ateu completo, no parecer de Feuerbach. O ateu seria apenas “muito covarde” pra admitir verbalmente “o que o sentimento afirma em silêncio.” Negar o sentimento, pra Feuerbach, é condição de possibilidade pra negar Deus.

  42. Procurar Deus fora do sentimento é um caminho mais fácil pra virar ateu, porque os deuses encontrados fora do simples sentimento não parecem tão reais, diz Feuerbach. A pessoa que trilha esse caminho acaba se perguntando se Deus realmente existe em algum momento.

  43. Feuerbach percebe que seu coração, em seu sentimento, adora a si mesmo, ou seja, não tem outro deus além de si mesmo. Então se procura um deus que o coração possa adorar, uma entidade exterior, colocando nela sentimentos nobres em grau ilimitado. No final das contas, é o coração novamente adorando a si mesmo, mas com o intermédio de uma entidade colocada ali pra disfarçar isso. É assim que Feuerbach conclui que a religião não é a adoração de Deus, mas de nós próprios. É uma prova de amor inconfessável entre indivíduo e humanidade. Isso porque, pra Feuerbach, Deus é uma mistura de tudo aquilo que o ser humano ama em si mesmo.

  44. Para Feuerbach, só é possível crer em Deus sem ter dúvidas confessando que o objeto da religião (a divindade) é o sentimento.

  45. Outros seres fora os humanos podem gostar de matemática ou música.

  46. A religião implica crítica, isto é, julgamento: o que posso ou não posso adorar, o que é e o que não é divino.

  47. Para Feuerbach, o valor de um deus é medido pelo valor de seu adorador. Eu disse que o cristão deveria parar aqui. Nietzsche é mais fácil de engolir sem perder a fé, mas Feuerbach tem alto potencial de erosão.

  48. Para Feuerbach, no final das contas, cada um é seu próprio deus.

  49. Analisando o raciocínio de Feuerbach até agora, ele parece fazer afirmações gratuitas. Ele não diz de onde tira seus pressupostos, por exemplo, de que as coisas mais elevadas no ser humano são razão, amor e vontade. Ele simplesmente pega os pressupostos e executa sobre eles. Se você for religioso e está se sentindo mal lendo, vá ler a Suma Contra os Gentios, tá certo? Ou os Pensamentos. Não precisa continuar se não quiser, filho.

  50. É preciso conhecer Deus antes de adorá-lo.

  51. A religião sempre vem antes da filosofia. Em geral, somos expostos à religião antes de termos maturidade pra pensar por nós próprios.

  52. Pra Feuerbach, a religião que assume que seu deus é o sentimento do próprio adorador é superior à religião que põe seu deus fora do ser humano. Feuerbach diz que a religião que invoca um deus exterior ao adorador é idólatra. Acusação grave. Será que ele foi pro Inferno?

  53. Ainda assim, essa “religião superior” não pode pensar que o sentimento é sobre-humano.

  54. O objetivo do livro é provar que divino e humano são a mesma coisa, logo que o conteúdo do cristianismo é totalmente humano. Pronto, daqui dá pra você dizer se deve continuar ou não. Se você acha que tem a fé fraca demais, não prossiga. Agora é meu último aviso.

  55. O indivíduo que pensa que as características divinas são humanas e são dele, remove de sua divindade todas as qualidades que ela poderia ter. Se seu deus deixa de ter essas qualidades, ele passa a não ter mais efeito na vida da pessoa. E a pessoa pode então dizer que Deus não existe.

  56. Agnosticismo é não atribuir a Deus nenhuma qualidade (afinal, não sabendo se Deus existe, não se lhe atribui qualquer característica). Mas daí pro ateísmo só falta uma confissão. Meu colega, o Beginner, provavelmente tem suas dúvidas sobre isso. Queria ver o que ele diria, já que ele é agnóstico.

  57. Pra Feuerbach, afirmar que Deus existe requer experiência. Deus precisa ter entrado em contato com o adorador, diz Feuerbach. Do contrário, se Deus não fizesse diferença em minha vida, eu nunca poderia afirmar sua existência. Já tive duas orações atendidas, acho que isso conta.

  58. Toda a existência humana implica ofensa. Isso explica porque pessoas muito boazinhas, que não querem ferir ninguém, mas sentem o impulso com crescente frequência e intensidade, se matam.

  59. Se por um lado esvaziar um deus de suas qualidades é anulá-lo, atribuir a ele predicados limitados também não parece correto.

  60. Existem pessoas que enjoam de Deus quando enjoam da religião que praticam. É o caso do meu sobrinho, na época com cerca de nove anos de idade, que disse à minha mãe, que lhe forçava o jeovismo, que não acreditava nem em Deus nem em Satanás. Minha mãe ficou tão confusa quanto ficou indignada. Ela provavelmente pensou “como ele pode não crer, se eu levo ele ao salão do Reino duas vezes por semana, faço estudo bíblico semanal com ele, o faço marcar as revistas, o matriculei na Escola do Ministério Teocrático e ainda por cima leio o Examine com ele todas as manhãs?!” Respondeu a própria pergunta. Nesta semana, os anciãos de congregação falaram com ele (hoje ele recuperou a fé e tem onze anos), pra tentar fazê-lo voltar a atender às reuniões no salão e ele disse categoricamente que ir às reuniões e fazer todas as rotinas de testemunha de Jeová o atrapalha no pleno exercício e aprendizado da fé, a qual ele julga ser capaz de aprender e praticar sozinho. Isso não implica negligenciar os outros cristãos, mas, trocando em miúdos, que ele rejeita o ensino denominacional. Eu e minha irmã estamos orgulhosos do posicionamento do menino, especialmente porque ele permaneceu fiel ao que ele pensa mesmo diante de dois anciãos que a minha mãe chamou pra convencê-lo.

  61. Não adianta dizer que Deus existe, mas que ele não se mostra a mim como ele realmente é, porque eu, como humano, só posso concebê-lo em moldes humanos. Pensar dessa forma, isto é, separar o Deus mesmo de como Deus se mostra a mim, torna impossível a religião, isso é, “a religação” com Deus, porque a religião quer Deus como ele é, não somente sua aparência.

  62. Se o ceticismo é o pior inimigo da religião e a distinção entre “Deus em si” e “Deus para mim” é uma distinção cética, minha fé se torna contraprodutiva, porque estou misturando religião e ceticismo, diz Feuerbach.

  63. Para Feuerbach, bem como para Xenófanes, se outras espécies de animais pudessem imaginar deuses, os moldariam segundo os valores de sua espécie.

  64. Se pensamos que Deus é aquele ser acima do qual não existe outro, já dá pra enumerar outras características dentro desse conceito. Se ele é o maior, deve ser perfeito, sábio, imortal, amoroso, justo, entre outros. Portanto, é ridículo, para Feuerbach, que alguém faça a distinção entre o que Deus é e como ele parece ser. A teologia opera assim, até certo ponto, derivando características do pressuposto de perfeição divina.

  65. Quando o crente pergunta “será que o pastor não está atribuindo caracteres humanos a Deus?”, já está perdendo a fé no que o pastor fala. Já começa a colocar sua religião em dúvida.

  66. O problema do argumento de Feuerbach é que ele pressupõe que o ser humano veio primeiro e que imaginou Deus depois. Assim, faria sentido que tivéssemos colocado em Deus características humanas. Só que isso é um argumento circular: ele pressupõe o que ele quer provar, que Deus não existe. Nós, que somos religiosos, podemos afirmar que Deus veio antes. Então, não é que nós atribuímos a Deus características humanas, mas o contrário: Deus nos dotou, em dose limitada, de características suas (Salmos 82:6). Feuerbach poderia dizer: “mas assim você também pressupõe Deus, também incorre em argumento circular.” E eu diria: “eu acredito, então eu posso, mas você, que se propõe a ‘ser racional’, não pode.” A fé não está subjugada às regras da argumentação correta. Se fosse, seria filosofia, não fé. É claro que é possível fazer filosofia da fé (teologia), mas isso implica, enquanto implicar fé, que eu não posso duvidar de certas coisas. Tem que ser cara lisa.

  67. Pode ser que a tendência a ter fé seja algo natural do ser humano.

  68. O sujeito é o que existe. Os predicados são sua essência. Se existência é predicado, mas não pode haver predicado sem sujeito, quem veio antes?

  69. Parece que Feuerbach está atacando uma teologia feita sem a Bíblia. Porque muitas afirmações teológicas que ele ataca não encontram base bíblica sólida. Falo com a autoridade de quem leu a Bíblia Sagrada inteira duas vezes e que está na terceira leitura.

  70. Duvidar do meu Deus é duvidar da minha escolha, da minha íntima profissão de fé. É, em certo sentido, duvidar de mim mesmo.

  71. Se Deus não precisa de templos (João 4:21), então por que os templos são tão belos? Sim, é pra mostrar que nos importamos, mas não há como dizer que tal coisa é necessária.

  72. Feuerbach diz que os gregos excluíam de seus deuses as emoções e sentimentos baixos ou vis. Isso não é verdade: Zeus traía a mulher, entre outros maus exemplos. Se os humanos, historicamente, só atribuíam aos deuses coisas boas, como se explica os deuses gregos que tinham defeitos, os quais muitos eram, sim, tidos como defeitos mesmo naquela época?

  73. Para Feuerbach, a inexistência de um Deus sábio, vivo e bondoso não inviabiliza a sabedoria, vida ou bondade dos outros seres. Veja a nota 66.

  74. Para Feuerbach, uma qualidade não é divina porque Deus a tem, mas porque a qualidade é, em si, divina. Novamente, essa afirmação é gratuita. Ele está pressupondo o que quer provar (“Deus não existe porque não tem qualidades; ele não tem qualidades porque sou eu que atribuo qualidades a ele; eu faço isso porque eu quero que Deus exista; se eu quero que ele exista é porque ele não existe; ele não existe porque não tem qualidades” e assim vai, mas eu posso afirmar “Deus existe porque tem qualidades; eu tenho qualidades porque ele mas deu; se ele me deu qualidades é porque ele me ama; se ele me ama é porque ele existe; ele existe porque tem qualidades”).

  75. Para Feuerbach, o início da religião é a própria pessoa. Não passa pela cabeça dele a revelação porque ele a descartou antes de começar a escrever.

  76. Existiam deuses do medo e do terror. Mas sentir medo ou causar terror não são qualidades ruins, ou seja, defeitos? Eu só posso atribuir a Deus o que há de mais elevado. Onde no mundo o terror e o medo são maiores que a paz (excluindo a cabeça doente de Hegel)? Logo não faz sentido que em Roma tenham existido templos para o medo e para o terror, mas não para a paz, se o argumento de Feuerbach merece crédito. A única explicação seria que a paz, como um estado natural, não tinha nada de especial. Então não fazia sentido erigir um altar a um deus que se manifesta pelo repouso, ou seja, não se manifesta. Por outro lado, na ocasião de uma guerra, causar medo e terror eram qualidades, mas não sofrer essas coisas. Vou deixar meu contra-argumento aqui de qualquer jeito, mesmo que eu não o veja como forte.

  77. A tendência a atribuir eventos naturais a causas sobrenaturais é o que cria as superstições.

  78. Parece que, para Feuerbach, Deus só existe se eu conhecê-lo. Muito bem, mas Deus, dita a religião, não precisa de nós pra existir. Já pensou se ele existe mesmo que eu não o conheça?

  79. É como se ele dissesse “se eu não posso conhecer, darei por inexistente.” Verdadeiramente estudou com Hegel.

  80. Parece que Feuerbach afirma que emoções ou sentimentos ruins são bons quando justificados. Então, no caso do templo do medo e o templo do terror, eles não seriam coisas ruins se justificados, isto é, se não tiverem o mal como raiz.

  81. Para Feuerbach, o rebaixamento do ser humano diante de Deus é um danoso efeito colateral da religião. Danoso, para ele, porque o ser humano não reconheceria que o deus que ele adora é apenas uma elevação ao infinito de características humanas. Seria como se prostrar a si mesmo e se imaginar menor que si mesmo.

  82. A distância entre Deus e ser humano é sempre maior do que o grau de semelhança entre os dois, conforme diz o Concílio de Latrão.

  83. O preconceito contra os ateus foi que levou a muitas concepções vergonhosas da divindade. Afinal, se eu sou obrigado a crer, crerei em qualquer coisa. É mais ou menos como o preconceito que hoje se tem contra os pedófilos: se o pedófilo deseja crianças, eu então não vou nem tocar nelas. O preconceito leva a atitudes extremas e impensadas, um tipo de formação reativa.

  84. No Ocidente, o pensamento tradicional dita que é a existência de Deus que sustenta a moral. Assim, se Deus não existe, nada é proibido. Só que isso é incorreto. É verdade, eu acredito em Deus, mas eu não acho que seja impossível a um ateu agir moralmente. A diferença é que o ateu usa outros critérios de virtude, como o bem-estar do próximo. O ateu não precisa de religião pra fazer o bem ou identificar o bem.

  85. A Bíblia Sagrada… se contradiz.

  86. Perguntar “como Deus criou um mundo?” já é um prelúdio de ateísmo.

  87. Religião não é teologia.

  88. Embora sejamos todos filhos de Deus, existem graus de proximidade entre Deus e nós. O piedoso é mais próximo de Deus do que o ímpio. Logo, embora sejamos fundamentalmente iguais, nossas ações nos aproximam ou distanciam do Deus eterno. Estranho eu aprender tanto sobre religião com um ateu que tenta colocar a religião abaixo. Feuerbach está acidentalmente aumentando minha compreensão sobre a fé em uma direção que ele próprio talvez não gostaria.

  89. Deus só é Deus pra nós. Com isso Feuerbach conclui que Deus não é Deus se não existissem criaturas que o tratassem como tal. O problema aqui é que o conceito de Deus não exige adoradores. Deus continua sendo Deus mesmo sem nós, porque Deus é criador. Se cria ou pode criar, é Deus. Adorador é acessório.

  90. A trindade: três pessoas, uma essência. Jeová não é o Verbo e nem o Espírito Santo. O Verbo também não é o Espírito Santo. E, no entanto, os três são Deus, é o que diz a doutrina da trindade. É mais ou menos como dizer: Yure não é Guilherme nem Antônio, Guilherme também não é Antônio, no entanto os três são homem. Três pessoas, uma essência: humanidade. Isso equivale a dizer que a trindade prega a adoração a três deuses. Isso é pecado. Pra conciliar isso, a doutrina diz que os três devem ser adorados como uma entidade só, pois são consubstanciais. Pra mim, continua sendo pecado. Deus é um só e esse Deus é Deus Pai.

  91. A trindade é um conceito altamente contraditório.

  92. Feuerbach diz que a Igreja Católica coloca Maria em uma posição que Cristo deveria ocupar. Ela tem mais importância. Isso é uma distorção. Importante lembrar que a Igreja Católica nem sempre foi assim: na Suma Contra os Gentios, Tomás diz que somente Deus deve ser cultuado. Então, se Tomás estivesse vivo hoje pra ver como o catolicismo está, talvez ele virasse protestante. Tenso.

  93. Os sacrifícios de devoção, como o celibato, tornam Deus mais palpável ao crente. Uma fé que é praticada é mais forte. Isso, claro, se você não estiver sendo forçado, como meu sobrinho foi.

  94. Para Feuerbach, “o homem afirma em Deus o que ele nega a si mesmo.” Se o cristão tiver insistido em ler até aqui e estiver passando mal, veja a nota 66.

  95. Para Anselmo, quanto mais desprezível eu for para os outros homens, mais querido sou para Deus. Isso não deve ser entendido de forma literal, mas como um incentivo à humildade (Marcos 10:15).

  96. Se o ser humano fosse desprovido de boas qualidades, isto é, se só Deus tivesse algo de bom, não deveríamos ser capazes, por exemplo, de apreciar um belo quadro, de raciocinar ou de amar. Parece que aqui ocorre um ataque ao ramo protestante, segundo o qual o ser humano, como ser corrupto às últimas consequências, não deveria se importar com seus atos para ser salvo; será salvo de graça. Afinal, um ser tão mal nunca poderia merecer salvação. É assim que existem tantos cristãos malvados, estribando-se nisso como licença pra pecar.

  97. O dogma segundo o qual o Deus perfeito só pode amar a si mesmo, além de estar em flagrante contradição com a revelação (João 3:16), contribui para a imagem de um Deus egoísta.

  98. Para Feuerbach, admitir que Deus pode exibir um comportamento humano é prova de antropomorfismo. Mas, se você pensa que Deus veio antes da humanidade e que dotou o ser humano de características suas (Gênesis 1:26), então não é Deus que exibe um comportamento humano e sim o contrário. Dá no mesmo, isto é, há semelhança entre Deus e homem (Salmos 82:6), sem ser a mesma coisa, isto é, posso afirmar isso sem negar a existência de Deus.

  99. A trindade é uma desculpa pra adorar três deuses em vez de um só e ainda assim afirmar que é um só.

  100. Pense nisso: se a = d, se b = d, se c = d, então a = b = c. Mas a trindade quebra o último momento. Pai é Deus, Filho é Deus e Espírito Santo é Deus e, no entanto, não são a mesma coisa. Não tem lógica.

  101. Se são todos Deus, são três deuses. Mas isso é politeísmo. Então, pra evitar isso, cada um dos três deuses é chamado “pessoa” de um deus maior, que é o trino. É trocar palavras e continuar com o conceito.

  102. Se alguns religiosos afirmam que Deus é indiferente ao nosso comportamento (mas não a nossa fé, por exemplo, conforme Romanos 10:9), por que eles ainda tentam ser bons e agir conforme o caminho ensinado (o mesmo autor que sustenta a fé somente dá recomendações de comportamento em Gálatas 5:19-21 e condiciona a salvação a elas)?

  103. Uma religião que tem a fé como único mandamento acaba sendo uma religião em que os adoradores estão centrados em si, mesmo que digam que amam a Deus (Mateus 15:8).

  104. A razão é indiferente ao sentimento. É por isso que ela nos condena, apontando nossos erros. Ela não se importa com o que sentimos nem como nos sentimos. Ela analisa, recompõe e conclui. Você que se dane. É por isso que sentimos culpa, porque sabemos, pela razão, que erramos. A razão também aponta os erros dos outros, mesmo quando nosso sentimento não deixa que manifestemos isso. É como quando sabemos que a pessoa fede, mas gostamos dela, então não dizemos que fede. Também é o caso do juiz que é forçado a condenar o próprio filho. Se ele decide condenar, está sendo racional. Se absolve, é sentimental, caso o filho seja realmente culpado.

  105. A necessidade espiritual, o “vazio metafísico”, esse desconforto típico de quem deseja Deus sem ter ideia de como encontrá-lo é identificado por Feuerbach com a insatisfação da razão em não ter chegado ao seu grau mais alto. Enquanto o ser humano não aceita um deus, sua razão não se aquieta. A razão, diz Feuerbach, só se conforta quando chega a conceber um ser que é o mais alto. Só então, poderá dizer a si mesma: “nada mais há que ser feito, posso descansar.”

  106. Uma das coisas que leva muitos a crer é a falta de sentido do mundo. Se não há Deus, a vida não faz sentido pra essas pessoas. É preciso algo que governe e que seja racional.

  107. O que é racional é real, diz Feuerbach, com Hegel.

  108. Para Feuerbach, Deus não pode fazer um triângulo de quatro lados.

  109. Para Feuerbach, a medida do meu Deus é a medida da minha razão. É, se eu fosse deísta. Mas como eu creio na revelação, a medida do meu Deus é a medida da minha fé, limitada pela medida da tradução, limitada pela medida das cópias, limitada pela medida da relação entre Deus e os autores sagrados.

  110. O Deus que Feuerbach critica é, em última instância, a opinião de Deus feita pela teologia, que pode ou não corresponder com o Deus bíblico (e normalmente não corresponde).

  111. A razão trabalha pela vontade. Se a pessoa não tem razão madura, se deixa iludir e é facilmente controlada, como o homem cuja esposa o controla pelos sentimentos ou aquele que acredita em cada palavra do Jornal Nacional. Esse tipo de gente desce ao grau de instrumento.

  112. Liberdade é um dom dos que pensam. Os idiotas só pensam que são livres.

  113. Quem tem razão mais madura, esse comanda. É por isso que se diz que quem é esperto comanda sobre os burros.

  114. Algo pode, ao mesmo tempo, ser sujeito e objeto, basta variar os pontos de vista ou atividade exercida.

  115. Se houver outro ser capaz de inteligência, como nós somos, e se sua inteligência for superior, ele provavelmente reterá os mesmos princípios de lógica que nós.

  116. Quanto mais eu leio Feuerbach, mais eu me lembro de como o orgulho prejudica a relação com Deus. Veja que ele só rebaixa Deus pela elevação do gênero humano. Não estou dizendo que o ser humano é desprovido de valor até porque a revelação também não diz isso. Mas que se deve atribuir ao ser humano seu justo valor. E aqui parece que à razão humana é dado um valor excessivamente romântico. Ele não está errado em falar o que ele fala da razão, mas a forma enfática e poética de falar pode levar o leitor a pensar que a razão é mais do que o que ele está tentando expor.

  117. Deus, se é Deus, só pode ser um.

  118. A ideia do livro é tentar demonstrar que Deus não é algo fora de nós, mas em nós: a nossa razão. Afirmação extremamente orgulhosa.

  119. Para Feuerbach, se você deixa de conceber o homem como a religião o concebe, automaticamente deixa de crer na religião.

  120. A religião não contribui com a ciência.

  121. Somente seres com sensibilidade são capazes de misericórdia.

  122. O amor verdadeiro se manifesta pelo prazer em fazer o outro feliz. Se uma pessoa ama você só enquanto você lhe serve como ferramenta para alguma coisa particular, isto é, se ele tem sua felicidade como algo abaixo do objetivo maior pelo qual ele te emprega, não é amor de verdade. Quem realmente ama põe a felicidade do outro em primeiro lugar, no mínimo junto com a própria felicidade, porque a felicidade do outro faz também a sua. Quem ama quer que o amado seja feliz. Então se pode dizer que um pedófilo pode amar uma criança.

  123. Os textos bíblicos que falam do amor são tão importantes, belos e emocionantes que é difícil conceber que alguém tenha ousado adulterá-los.

  124. Se Deus não amasse, não perdoaria pecados.

  125. A teologia, que considera Deus como abstrato e puro, diferente do Deus revelado pela Bíblia Sagrada somente, acaba abstraindo Deus do amor. Passa a impressão de que ele é uma força insensível ao nosso sofrimento.

  126. A prova da existência do amor é o sofrimento. Se não existisse amor, não haveria sofrimento.

  127. Se Deus não amasse, não faria milagres. Afinal, um milagre é uma intervenção direta de Deus sobre a ordem cósmica, ignorando a causalidade, a qual é perfeita. É o fenômeno inexplicável. De fato, Deus não faz isso o tempo todo. Mas se não amasse, não faria de jeito nenhum, porque não iria nunca interferir na sua perfeita criação, ainda mais por um ser tão pequeno como o ser humano.

  128. Partindo do pressuposto de que quem faz Deus é o ser humano, Feuerbach conclui que a pessoa religiosa ama a si mesma pela religião, pois ama a Deus e é amada de volta por ele. A religião seria, então, diz Feuerbach, um amor não-confesso entre a pessoa e o próprio gênero humano.

  129. Quem não ama não tem coração. Quem não acredita no amor não precisa de coração.

  130. Perder o objeto amado é como perder o coração. Se você perder o coração, morre. Se perder o objeto amado, não quer mais viver.

  131. Cristo sofreu por outros. Então deveríamos fazer o mesmo.

  132. A razão e a paixão, Sócrates e Jesus. Sócrates pega o cálice de veneno e bebe convicto. O outro pede pra, se possível, não beber (Mateus 26:39). A filosofia enaltece a razão. Mas nem sempre é bom que a razão nos tire sentimentos propriamente humanos.

  133. Dizer que Deus não tem emoções é estranho. Nós sentimos emoções quando algo acontece com nossos filhos, quanto mais o Pai Celestial quando algo acontece com sua criação.

  134. Diz Feuerbach: o Deus do cristianismo não é o da teologia.

  135. Um ser que não sofre não tem coração.

  136. Repreender o amor-próprio é repreender a existência da pessoa. Se ela deve se odiar, se matará, e ninguém deve dar ao outro um conselho que não seguria na mesma situação.

  137. Todos devemos ter metas ou propósitos. Para muitos, essa meta é Deus.

  138. Para Feuerbach, a trindade é uma tentativa de completar um amálgama de seres que sozinhos não satisfazem o ser humano. Deus é razão. O Verbo é sentimento. E o Espírito Santo? Melhor eu não dizer (Mateus 12:31).

  139. Diz Feuerbach que encarar Maria como mãe de Deus fecha um buraco que havia na trindade: um Pai e um Filho sem nenhum sinal da mãe.

  140. Para Feuerbach, um ateu, a mariolatria (culto à Maria) não é uma prática idólatra. Seria pra Tomás, ironicamente católico. O mundo.

  141. Para Feuerbach, não crer na “mãe” de Deus diminui a crença tanto no Pai quanto no Filho. Eu não sei se não estou conseguindo acompanhar o raciocínio, mas isso parece colheita de cereja: ele mistura sentimento, amor materno e fé, fazendo as ligações que achar necessárias entre três dados que não tem, ou pouco tem, a ver um com outro. Eu não vejo a ligação. O argumento não me convence nada. Mas talvez porque eu acredite em Deus e tenha pouca experiência de antropologia.

  142. Feuerbach diz que o homem que perde um filho se resigna, mas a mãe que perde um filho é inconsolável. Para ele, isso atesta que só a mãe pode “amar de verdade” um filho. Maldito.

  143. Os argumentos para atacar Maria como mãe de Deus, diz Feuerbach, podem ser estendidos a toda a trindade, a ponto de separar totalmente Pai, Filho e Espírito Santo.

  144. O fato de o protestante ser mais liberal em relação ao sexo do que o católico (pois o catolicismo recomenda o celibato, a pobreza e a obediência à igreja como os três votos do religioso) torna mais fácil ao protestantismo excluir a “mãe de Deus” de seu culto, diz Feuerbach.

  145. Para Feuerbach, Deus é mais concreto pra quem sente que necessita dele. Por isso que os ricos ou famosos tendem a esquecer de Deus quando se sentem plenos (Deuteronômio 6:10-12).

  146. Para Feuerbach, a trindade é um conceito morto, sem importância. Mesmo que o Pai, o Filho e o Espírito Santo existam, não faz diferença, de um ponto de vista prático, que um não seja o outro e, no entanto, os três sejam Deus. Isso não influi na prática da fé e, diz Feuerbach, nem no seu lado teórico, isto é, como fundamento para a prática.

  147. Para Feuerbach, quem não ama a mulher não pode amar o homem. Maldito duas vezes.

  148. Para Feuerbach, o interesse na trindade começa pelo interesse por conhecer o Filho. Se bem que, se tivessem interesse em conhecer o Filho pelo Filho, provavelmente abandonariam a trindade, porque abundam argumentos contra ela nos quatro Evangelhos. Por exemplo, se Jesus, isto é, o Verbo é Deus e o Pai também é Deus, eles devem ter a mesma importância, e, no entanto, Jesus frequentemente se põe abaixo de Deus (como em Mateus 7:21). Também se ambos têm a mesma importância, ambos deveriam saber a data exata do fim do mundo e, no entanto, Jesus não sabe (Marcos 13:32). Além disso, se as três pessoas da trindade têm a mesma importância, a blasfêmia contra o Espírito Santo não deveria ser imperdoável, como não é imperdoável a blasfêmia contra Jesus (Lucas 12:10). Então como fica a “prova irrefutável” em João 1:1? Pra mim, consubstancialidade não significa igualdade de importância e não deve ser usada como um meio de divinização, especialmente porque Jesus se colocava abaixo de Deus Pai. Seu exemplo na terra contradiz a doutrina da trindade.

  149. Para Feuerbach, fazer orações aos santos esconde a expectativa secreta de que Deus atende tudo aquilo que o santo pede a ele. Então, entregar o pedido a Deus pelas mãos de um santo é uma tentativa de dobrar a vontade divina por um terceirizado. Na prática, se dá mais importância a quem faz o pedido e consegue do que àquele que realmente concede. Com isso, Feuerbach conclui que isso é idolatria.

  150. Alguns pensadores da Igreja concordam que quem não adora Cristo como Deus não pode ser cristão. Beleza, então eu não sou.

  151. Para Feuerbach, adorar Jesus ao mesmo tempo que se considera Jesus como imagem de Deus é idolatria (Êxodo 20:2-6).

  152. Uma religião de imagens é uma religião idólatra.

  153. A arte sagrada é profana, diz Feuerbach, que se usa da sacralidade como desculpa para exercer fascínio, da mesma forma que a arte profana. Isso não quer dizer que seja ruim, mas que não se deve atribuir a elas um lugar no culto. No final das contas, são só imagens belas. Nada há nelas de sagrado.

  154. É possível que a adoração não seja à imagem, mas ao que ela representa. Mas como fica o caso das relíquias? As pessoas que se ajoelham diante de uma relíquia sagrada adoram que objeto? Claro que isso não exclui a possibilidade de ocorrer erro do crente e não da religião.

  155. A comunicação é tão necessária como o pensamento.

  156. Exagerado…

  157. Falar dos problemas ameniza-os. Parece bobo, mas desabafar realmente ajuda.

  158. O conhecimento da vida humana antecede o da natureza. O universo se torna claro quando o conhecimento sobre nós mesmos também se torna claro. Nosso conhecimento do universo é limitado pelo nosso autoconhecimento.

  159. Cada um é limitado, mas nosso poder cresce quando estamos em conjunto. Um estudioso não está sozinho; ele está com os que estudaram antes dele e produziram o que ele leu. Se cada um começasse do zero, sem levar em consideração o que fora produzido antes, o avanço científico seria quase nulo, com cada indivíduo chegando mais ou menos ao mesmo lugar. Mas continuando de onde o outro parou é que chegamos mais e mais longe.

  160. A maior das dores é o amor não correspondido, diz Feuerbach.

  161. A razão começa com a operação de perguntar e responder. São seus dois primeiros passos.

  162. O analfabeto funcional não entende o que lê a menos que alguém leia para ele. Por isso que faz parte da alfabetização a leitura coletiva em voz alta.

  163. Se Deus é bom, quem criou o mal? Para Feuerbach, é razoável pensar que o mal sempre existiu.

  164. Se o idealismo deixar de se associar à realidade dos fatos, torna-se filosofia vazia.

  165. Diz Feuerbach que, enquanto o conceito de divindade contiver informações contraditórias, é dever da ciência destruir a divindade.

  166. Se a bondade e a conversa não surtem efeito, o jeito é sair no braço, diz Feuerbach.

  167. O conceito de personalidade passa pelo conceito de corpo. É a existência de corpos que nos diferencia uns dos outros em primeiro lugar.

  168. A diferença entre homem e mulher é total, não restrita a certos órgãos e nem tampouco algo meramente superficial.

  169. Para Feuerbach, homem é homem, mulher é mulher, mesmo que não tenham corpo.

  170. Para Feuerbach, há dois tipos de personalidade: masculina e feminina.

  171. Um gênero não trata o outro como seu próprio. É diferente a conversa entre homens da conversa entre homem e mulher, diz Feuerbach.

  172. Diz Feuerbach que é repulsivo que alguém negue seu sexo. Mas, considerando que ele também diz que sexo não depende de corpo, me pergunto do que ele está falando. Se não é corpo, deve ser mente. Se é mente, deve estar falando de identidade de gênero. Claro que isso é esticar a baladeira, já que não se pensava em identidade de gênero na época dele. Mas alguém que entendesse dessa forma não é digno de censura, já que ele diz que sexo pouco tem a ver com corpo.

  173. Ambos os sexos têm um pouco de seu oposto. O homem deve agir de forma feminina se a ocasião assim pedir, diz Feuerbach. Isso não quer dizer agir como mulher, pois o comportamento feminino também implica agir de forma masculina se a situação pede. É confuso, mas eu entendi o que ele quer dizer. O homem, enquanto homem, ainda deve agir de forma feminina na ocasião X e na Y, bem como a mulher, enquanto mulher, deve agir de forma masculina na ocasião A e na B. O homem, por exemplo, que age de forma feminina na ocasião A está cruzando a linha. Embora seja esperado que ele aja de forma feminina na ocasião Y, não é censurável que ele não o faça, embora devesse. Há um problema grave nesse argumento, contudo: ele dá masculinidade e feminilidade como conceitos garantidos, sem os explicar. Devo agir como homem na ocasião A, mas o que significa “agir como homem”?

  174. Para Feuerbach, a diferença entre os sexos é a base da moralidade. Nossa, isso é bem estranho vindo de um ateu, parece papo de protestante.

  175. Dividir a humanidade em dois gêneros, homem e mulher, foi a coisa mais sábia que a natureza já fez, diz Feuerbach.

  176. O primeiro milagre foi a criação.

  177. Mas, diz Feuerbach, milagres não existem. Assim nasceu Górgias.

  178. O milagre é a prova da influência de Deus em nossa vida. Negar a existência do milagre é negar a providência (intervenção divina).

  179. A Bíblia Sagrada contradiz a natureza e vice-versa. Os milagres bíblicos não são possíveis naturalmente. Óbvio, milagres são sobrenaturais. Pra Feuerbach, não é possível acreditar nos dois: na revelação e na natureza. Pra Tomás, é possível, sim.

  180. Deus só faz milagre pra humanos.

  181. Paulo não professava a trindade.

  182. Para Feuerbach, a teologia é antropologia de má qualidade.

  183. Matéria é inseparável do conceito de mundo.

  184. Diz Feuerbach que a ciência começa com o politeísmo, citando inclusive Salomão, que era sábio (1 Reis 4:21-34), mas que abandonou Jeová (1 Reis 10:9). É, mas sua sabedoria, se devemos crédito à revelação, foi dada pelo próprio Deus (1 Reis 1:1-9). Como Feuerbach desconsidera a revelação antes mesmo de começar, ele pode se dirigir a ela descuidadamente. Além disso, pela própria narrativa do Primeiro Livro dos Reis, Salomão abandonou Jeová em idade avançada, ao passo que se tornou sábio ainda jovem.

  185. Quem afirma crer só no necessário, muitas vezes crê só no conveniente.

  186. Para Feuerbach, amar quem Cristo odeia é se revoltar contra Cristo. Só que isso é incorreto: Cristo disse pra amar todo o mundo. Portanto, se revoltar contra Cristo é não amar. Basta lembrar da parábola do bom samaritano (Lucas 10:25-37). Também, no sermão do monte, Jesus diz que não há glória em amar o amigo e odiar o inimigo, que se deve amar até nossos inimigos (Mateus 5:43-48). Ora, mas os inimigos dos cristãos são inimigos de Cristo. Devemos amá-los também. Logo, a afirmação de que o crente, por ser crente, deve odiar o descrente não se sustenta. Jesus desmente isso.

  187. É fácil ser fanático quando há uma ênfase total na fé, como é o caso do protestantismo. Se eu só posso ser salvo pela fé, então eu tenho que crer não importa o quê. Não darei ouvidos a ninguém que discorde de mim, pra não abalar aquilo em que acredito. Daí pra silenciar o outro à força é um passo de distância.

  188. Pra esse tipo de pessoa, tudo é idolatria, exceto a própria fé com a própria doutrina. Cursar faculdade é idolatria. Ter filhos é idolatria. Tudo é idolatria pra o fanático, exceto sua própria crença e o que está de acordo com ela.

  189. A crença no Inferno revela desejo de vingança.

  190. Os cristãos não são os únicos capazes de amar. Aliás, muitos cristãos revelam excepcional aptidão para o ódio. Para Feuerbach, isso acontece porque a fé e o amor se contradizem. Eu não acho que se contradigam, mas essa é a explicação dele. Acho, aliás, que a fé e o amor são inseparáveis. Se eu creio, devo amar, porque Deus me manda, por meio do Verbo, amar. Mas Feuerbach tem razão em dizer que muitos atos de ódio são motivados pela fé cega, isto é, por fanatismo. Então, sim, pode ser que a fé opere contra o amor de muitas pessoas.

  191. Os conflitos religiosos são mais odiosos do que os conflitos nacionais.

  192. Uma das críticas de Feuerbach à religião cristã: muitos cristãos só amam porque Deus manda. Não amam de verdade, mas por medo do Inferno.

  193. Cristo quis que todos se amassem, a despeito de nacionalidade, idade, classe social ou gênero.

  194. Quem não ama não é cristão, pois não faz o que Cristo fez e disse pra fazer. Não está, portanto, em comunhão com ele.

  195. Para Feuerbach, Israel imaginou o Deus que teria imaginado porque era uma nação de egoístas. Muito bem, ele entra pro clube antissemita, junto com Voltaire.

  196. Para Feuerbach, estudar a natureza é idolatria. O intuito dele, com isso, é acirrar, esquentar o conflito entre fé e razão. O cristão que confia na ciência, diante de uma afirmação dessas, seria tolhido talvez a abandonar sua fé em favor da ciência ou talvez a levar uma fé hipócrita, isto é, praticar a ciência sentindo-se culpado por fazê-lo. Mas pra quem lê a Bíblia Sagrada, está claro que idolatria é a divinização de um objeto. Nenhum cientista olha pra nada nesse mundo com a intenção de tratar esse algo como divino. Afinal, se algo é divinizado, não se faz mais ciência sobre ele. Então, é possível conciliar os dois: se faz ciência da natureza, mas não de Deus, à medida que fazer ciência da natureza não implica divinizá-la. Este livro desceu ao nível de propaganda desonesta. É um trabalho de conversão ao ateísmo.

  197. Para Feuerbach, não se pode fazer filosofia da criação, entendida como tirar coisas do nada.

  198. É interessante como Feuerbach chama o Deus de Israel de “Jeová” e a trindade de “Deus”, como se cristãos e judeus tivessem sempre adorado entidades diferentes. Pra mim, Jeová, Verbo e Espírito Santo são entidades de fato, mas só Jeová é Deus, não os três.

  199. O ser humano encontra na interioridade alívio pro seu sofrimento. Ele se recolhe a si mesmo.

  200. Orar, isto é, dizer a Deus suas aflições, implica, obviamente, que aquele que ora acredita nele. E mais: acredita nele como o ser mais chegado, ao qual pode confessar qualquer coisa. Ou seja, aquele que reza dá uma prova patente de que acredita que Deus lhe é mais próximo do que qualquer humano.

  201. Quem não sofre não ora de verdade, diz Feuerbach. Se bem que tem gente que ora de verdade a fim de agradecer.

  202. Quem ora e não tem sua oração atendida pensa: “Deus sabe o que é melhor, então talvez não seja bom que eu seja atendido.” É nesse sentido que entra aquela tão repetida quanto incompreendida citação de Filipenses 4:13 (nem precisei abrir o Xiphos pra pegar essa referência de tanto que escuto evangélico falando nisso): “tudo posso naquele que me fortalece.” Se pensa que isso quer dizer que tudo é possível pra quem tem fé, mas isso é incorreto. “Naquele que me fortalece” quer dizer que meu desejo e o de Deus devem estar em união. Não adianta pedir a Deus algo que contradiz os seus planos. É isso que quer dizer “vã repetição”, insistir em pedir pra Deus o que ele nunca concederá (Mateus 6:7-13), mas comida, perdão, segurança e coisas que tais são coisas que Deus deseja pra nós. Por isso que, no meu entender, rezar o Pai Nosso não é vã repetição, na medida em que se interpreta “vã” como “inútil”.

  203. Para Feuerbach, que parte do pressuposto de que Deus é a exteriorização da afetividade humana, orar é acreditar que o coração humano, nossos sentimentos, são mais poderosos do que a natureza ou a necessidade. O problema é que quem ora não pensa nisso. Quem ora o faz porque crê que Deus é maior que a natureza, não o mero sentimento.

  204. Para Feuerbach, orar é falar sozinho. Lembrando, leia a nota 66.

  205. O amor tem mais poder que o déspota. A pessoa amada não precisa da violência pra ser atendida por quem ama. Parte da razão de eu temer me apaixonar.

  206. Para Feuerbach, o crente pensa que a oração tem poder. Isso também é incorreto. Quem tem poder é Deus somente. A oração tem tanto poder quanto um pedido feito no cotidiano, sozinha ela nada opera. Se a oração é ouvida por Deus e Deus realiza o pedido, quem tem poder é Deus, não a oração, que é só um pedido (ou agradecimento ou conversa, mas Feuerbach diz que é só pedido), uma vocalização.

  207. Para Feuerbach, a verdadeira trindade é fé, amor e esperança.

  208. Quem nega a ressurreição, nega a ressurreição de Cristo. No cristianismo, isso equivale a chamar Deus de mentiroso, prometendo a ressurreição dos justos e nos pregando uma peça na pessoa de Jesus.

  209. Como, no catolicismo, tanto o celibato quanto o casamento são sagrados? Se bem que, para ser justo, o celibato é mais sagrado do que o casamento (Mateus 19:9-12) e, recentemente (no papado de João Paulo II, se não me engano), mesmo que o celibato seja mais sagrado, ele não torna o celibatário melhor do que o casado. A única vantagem do celibato é mais tempo pra se dedicar a Deus, tempo esse que o casado gasta com a esposa. Na contemporaneidade, contudo, há outras vantagens em levar a vida de solteirão.

  210. Diz Feuerbach que o veículo de propagação do pecado original é o esperma. É de lascar.

  211. Para Feuerbach, Deus acha o coito abominável. Mas poxa vida, como é que o humano primitivo iria encher a Terra, então (Gênesis 1:28)? Esperma artificial? Útero mecânico? Outro descaso que Feuerbach comete com a Bíblia Sagrada. Se o ato sexual fosse abominável a Deus, ele não teria criado dois gêneros, nem teria lhes dado ordem pra se reproduzir.

  212. O protestantismo é a afirmação de que fé e vida pública podem ser separadas, pelo princípio de “ somente”. Se a fé é tudo o que é necessário pra salvar (Romanos 10:9), eu posso agir do jeito que eu quiser na vida pública, além de que viver a minha fé na vida pública atrapalha essa vida. É provavelmente o pensamento do Bolsonaro. Importante lembrar que não é isso que Jesus ensina (Mateus 19:16-19).

  213. Se Jesus não tivesse sangrado, seria menos crível.

  214. Feuerbach, com as testemunhas de Jeová, diz que o Espírito Santo é impessoal.

  215. A grande diferença entre cristianismo e paganismo é Cristo. Não fosse Jesus, que seria das outras práticas cristãs, muitas das quais têm práticas análogas em religiões pagãs?

  216. Se Cristo é o Messias, como ele não faria milagre? É claro que o Messias faria milagres. Não se pode dizer que Cristo é o Messias sem lhe atribuir milagre algum.

  217. Todos somos pecadores, mas nossos pecados não são iguais.

  218. Se eu sou um vicioso e tenho amigos virtuosos, posso dizer que ao menos tenho boa índole: se não tivesse, eles não fariam amizade comigo.

  219. Somos diferentes porque isso é necessário. Se não fosse, deveria haver apenas um ser humano no mundo.

  220. Um ser humano é diferente do outro. Mas, mesmo assim, somos todos iguais no cristianismo. Seremos avaliados pelo Salvador pelos mesmos critérios (Lucas 10:25-28).

  221. A cristandade primitiva, como as testemunhas de Jeová, não celebrava aniversários, mas, o que pode parecer estranho, festejava funerais (Eclesiastes 7:1-4). Isso porque já, na época (diferente do que as testemunhas de Jeová hoje pregam), havia a crença na vida eterna logo após a morte, pela transmigração da alma. Então era mais lucro morrer logo. Se o cristão adoecia, não procurava médico, por exemplo, porque a morte era bem-vinda, ocasião de festa com música e guloseimas. Minha professora de filosofia da educação inclusive mencionou que houve uma onda de suicídios dentro do cristianismo durante a Idade Média, fazendo com que o suicídio fosse reconhecido como “pecado mortal”, argumentando que suicídio fere o sexto mandamento, que reza “não matarás” (Êxodo 20:13). Isso, ou acabavam os fiéis.

  222. Se a morte é a condição de possibilidade pra obtenção da vida eterna, então morrer é a única lei que vale a pena seguir, diz Feuerbach. O cristão devoto é casto, faz vigília, jejum, morre todos os dias.

  223. O cristianismo que mata o fiel todos os dias é desnecessário; uma vez só já basta. E nessa vez somos realmente libertos do sono, da fome, da sede, do desejo sexual, dos bens materiais.

  224. Para Feuerbach, a ordem de crescer e multiplicar (Gênesis 1:22) só se refere à terra desabitada, tanto que Jesus nos diz que é recomendável não se casar, o que implica, em um contexto cristão, que a abstinência sexual é recomendável, embora não obrigatória (Mateus 19:9-11), porque a Terra já estava cheia o bastante. Realmente, um colega meu que é homossexual e que recebe pressão do pai pra arrumar uma mulher me pediu auxílio bíblico porque o pai frequentemente usava Gênesis 1:22 pra justificar seu ponto. Eu então falei pra ele de Mateus 19:9-11 e o pai parou de encher o saco.

  225. “Olhar para uma mulher para cobiçá-la” (Mateus 5:28) só é adultério se um dos dois já estiver casado. Nada de errado em pessoas solteiras desejarem uma a outra.

  226. Diz Feuerbach que o cristianismo primitivo condenava o casamento como uma fraqueza. Se você absolutamente não consegue mais se controlar e simplesmente precisa de sexo, pode se casar, mas, para minimizar o dano que se poderia causar pela satisfação do impulso, a pessoa podia ter apenas um parceiro pela vida toda. Pra muitos, ficar solteiro abstinente é melhor do que se casar com uma mulher insuportável, mesmo com todo o sexo do mundo (Eclesiástico 25:16).

  227. Diz Feuerbach que acreditar no Paraíso sem ter uma ideia formada dele já é sinal de irreligiosidade. Tô lascado, então.

  228. Você só embeleza e melhora aquilo que é bom em algum sentido. Algo totalmente ruim não se melhora, mas é jogado fora.

  229. Tem gente que crê por medo da morte. Esse tipo de fé tende a ser errático e fanático. Eu sei porque já fui assim.

  230. Colocar a existência de Deus em dúvida é muitas vezes razão de sentimentos de culpa e vergonha.

  231. Quem crê em Deus normalmente crê também em Satanás. Eu tive um amigo que não acreditava em Deus, mas acreditava em Satã. Eu achei aquilo muito estranho e pedi pra ele explicar. Ele me disse que a existência do mal em tão grande abundância justifica a existência de uma entidade sobrenatural maligna que é mais forte do que uma possível entidade sobrenatural benigna. Se a entidade benigna é fraca, não pode ser um deus. Então, pra esse meu amigo, o deus verdadeiro é Satanás, que quer causar sofrimento por pura diversão. É um raciocínio lucidamente torcido.

  232. Novamente, Feuerbach fazendo contraposições desnecessárias entre ciência e religião, dizendo que sempre se opõem, sem dar uma razão suficiente pra afirmar que a ciência é sempre contra a religião.

  233. Para alguns cristãos da época de Feuerbach, Satanás era uma manifestação de Deus: de sua raiva. Assim, Satã teria sido criado pra castigar em nome de Deus. Isso parece amparado por Jó 1:6-12. Dizem as testemunhas de Jeová que há diferença entre permitir o mal e causá-lo. Eu não vejo essa diferença, mas isso não implica dizer que Deus é mau, apenas que ele é justo. Se ele fosse bonzinho com todo o mundo, não seria justo. Se ele é justo, deve punir e a justiça não pune alisando cabelos (Salmos 18:26-28). Além disso, se Deus precisa punir alguém, ele faz sozinho, sem auxílio de Satã, como fez no caso do dilúvio (Gênesis 6:17). Isso não implica dizer que não possamos alcançar misericórdia (Mateus 6:14-15).

  234. Não acreditar que Deus pode conceder favores materiais após ouvir uma oração já é sinal de falta de fé.

  235. Para Feuerbach, as causas intermediárias prejudicam a religião porque deixam claro que Deus não age diretamente no mundo o tempo todo. Eu acho que se pode acreditar em Deus sem negar as causas intermediárias. Nem tudo precisa ser milagre. Se fosse, ele seria um “Deus do improviso”. É mais digno da divindade o conceito de ordem cósmica, que pode funcionar sem seu auxílio constante, guardando os milagres pra quando for necessário.

  236. Não haverá casamento no Paraíso, do que se pode deduzir que não haverá sexo (Mateus 22:30). É interessante lembrar de como os mórmons discordam disso. Eu não engulo seus argumentos, mas também não acredito que pensar que não haverá sexo no Paraíso seja a única interpretação desse texto. Com efeito, os anjos fazem sexo (Gênesis 6:2-4). Então, não casar e inaptidão pro sexo não andam juntos. Então, é possível interpretar o texto no sentido de que o sexo não será limitado ao casamento, que seria uma instituição abolida. Sexo liberado, imagine só! Mas esse é só um pensamento com o qual eu brinco. Nem eu mesmo o levo a sério, porque eu nunca desejei ter sexo com ninguém e provavelmente morrerei virgem mesmo. Então, se haverá sexo ou não no Paraíso, essa é uma questão indiferente pra mim.

  237. Melhor ser pobre com Cristo do que rico sem ele.

  238. Os cristãos fanáticos, especialmente testemunhas de Jeová fanáticas, chegam a desconsiderar amizades terrenas como falsas. Para esses, somente a amizade com Deus é verdadeira. O amor ao próximo fica difícil assim…

  239. Para Feuerbach, o homem que se sente homem sente que precisará, eventualmente, da mulher, porque desejará se reproduzir. E se eu não quiser me reproduzir? Se eu não quiser me reproduzir, não posso dizer que por isso renego meu sexo biológico, já que faz parte do homem biológico também uma configuração hormonal. Ou vai me dizer que o homem infértil deixa de ser homem?

  240. Um ser que não precisa de semelhantes é necessariamente o único de sua espécie, diz Feuerbach.

  241. Para Feuerbach, todos os seres humanos que amam o que fazem consideram seu ofício como o mais elevado, mas isso é incorreto. Eu não acho que educação, que é o ramo que eu quero seguir, seja o mais elevado ofício na existência. Só acho que é o que eu faria melhor, a área na qual eu seria mais útil com o mínimo de infelicidade. Eu não preciso pensar que programação é o mais importante ofício do mundo porque eu me dedico à programação de todo o coração e me sinto bem ao praticá-la, nem vice-versa.

  242. Se “alma” é princípio de movimento, então pode-se dizer que o nosso objetivo de vida ou ocupação favorita é nossa alma, em certo sentido, pois nos põe em ação.

  243. Para Feuerbach, a imortalidade é nossa garantia de Deus. É como se ele dissesse “não quero nada com Deus se não posso ser imortal por ele.” O desinteresse levaria à descrença, a seu ver.

  244. Deus e imortalidade pessoal são inseparáveis no cristianismo.

  245. Para Feuerbach, Deus é condicionado em minha mente segundo o meu anseio por aquilo que penso conseguir no Paraíso. Então, para cada Paraíso concebido há um deus. que isso é incorreto: não existe “Céu dos Judeus” e, no entanto, eles são religiosos e têm sua divindade, que é Jeová. Então, o conceito de Deus independe do de Paraíso, embora possam coexistir. A menos que ele esteja falando de paraíso em sentido amplo, não no sentido de “céu”.

  246. É possível conhecer a índole de uma religião analisando suas promessas para o pós-vida.

  247. É mais sensato não pensar no Paraíso, mas somente assumir que Deus, sabendo o que é melhor, tem um Paraíso perfeito esperando por nós. Então, não se importe em pensar como deve ser o Céu, se importe em como chegar lá.

  248. Enquanto houver nações diferentes haverá deuses diferentes.

  249. Diz Jerônimo que não querer ser perfeito é pecar.

  250. Embora Feuerbach diga que a ciência deve provar que Deus não existe, ele diz que a ciência não pode fazer isso enquanto se expressar de forma obscura. Ela tem que provar de um jeito que todos entendam e ninguém possa refutar. Senão não serve.

  251. Embora não se falasse muito nisso (porque era tabu), alguns religiosos da época de Feuerbach se perguntavam se porventura Deus não tinha esposa.

  252. Outros religiosos da época dele se perguntavam por que os que nunca conheceram a Deus por vezes vivem melhor do que judeus e cristãos.

  253. É possível compreender a natureza sem recorrer à religião.

  254. A natureza é exuberante. Isso não quer dizer que Deus é redundante, mas que ele quer que nos sintamos bem.

Publicado por Yure

Quando eu me formei, minha turma teve que fazer um juramento coletivo. Como minha religião não me permite jurar nem prometer, eu só mexi os lábios, mas resolvi viver com os objetivos do juramento em mente de qualquer forma.

3 comentários em “Anotações sobre a essência do cristianismo.

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