Desta vez, a leitura foi do Diálogo Sobre a Felicidade, ou De Beata Vita. Trata-se de uma discussão entre Agostinho e uns amigos dele. A transcrição do diálogo foi mandada a um outro amigo que não estava presente. O tema do diálogo é a aquirição da felicidade, que é aquilo que todo o mundo quer. Pra Agostinho, é preciso ser sábio pra ser feliz. Mas, como ele cristão, ele vai dizer que a sabedoria de verdade é Cristo. Então, você já sabe como o diálogo irá concluir. Na medida do possível, eu tento interpretar os conselhos de Agostinho em um sentido laico, pra evitar acusações de proselitismo e também pra que os conselhos que eu encontre possam servir também aos que não são cristãos.
É mais seguro confiar naquele que ensina do que naquele que manda.
Agostinho diz isso na introdução à obra, na carta que antecede a transcrição do diálogo, enviada ao amigo que estava ausente da discussão. Ele diz isso enquanto reflete sobre seu passado como maniqueu e depois como cético. Esse conselho é muito válido hoje, particularmente no Brasil e nos Estados Unidos, dois países onde a política (quem manda) e a ciência (quem ensina) estão em aberto confronto no tema da covid-19. Quem manda nem sempre sabe do que está falando e pode estar sendo movido por motivações erradas. Mas quem ensina sabe o que está a ensinar e pode provar que é ele quem está certo. É claro que Agostinho não estava pensando nesse problema ao escrever que é mais seguro confiar em quem ensina do que em quem manda, mas, se ele estivesse vivo hoje, provavelmente usaria tal frase também nesse sentido.
Para ser feliz, é preciso ter o que se quer, desde que tal coisa seja boa, e é preciso não temer perder essa coisa.
Como diz Epicuro, felicidade é o estado no qual as necessidades estão satisfeitas. Em poucas palavras, felicidade é não ter do que reclamar. Quando falta alguma coisa, a pessoa não pode dizer que está totalmente feliz. Por outro lado, quem tem o que quer ainda pode temer perder o que adquiriu. Ora, quem teme não é feliz, pois lhe falta segurança nas coisas que tem. Além disso, se você deseja algo ruim e adquire algo ruim, você pode esperar ser prejudicado por aquilo que desejou. Logo, diz Agostinho, a felicidade reside na realização dos desejos bons que não estejam sujeitos à perda. Ele dirá que esse objetivo é a posse de Deus. Mas, para aqueles que não estão afinados com a religião, esse conselho pode ser adaptado pra refletir a realização de qualquer objetivo bom que não possa ser depois desfeita.
Não dá pra ser feliz sendo burro. É preciso ser sábio pra ser feliz.
Identificar quais desejos valem a pena realizar requer sabedoria. Mesmo para os bens transitórios, é preciso sabedoria pra mantê-los. Quem for burro acaba incapaz de manter o bem que conseguiu ou consegue apenas coisas que parecem boas, mas que depois amargam. Por causa disso, não é possível ser feliz sem ser sábio.